A moderna forma de escravidão
HÁ 100 ANOS, O JORNAL DO COMMERCIO DO RIO DE JANEIRO, QUE CIRCULA DESDE 1827, PUBLICAVA A NOTÍCIA ABAIXO, RELACIONADA COM O TRÁFICO INTERNACIONAL DE PESSOAS. COMO OBSERVA O ARTICULISTA, EM 2006, ESSA MODALIDADE DE CRIME PERSISTE, COM NOVOS CONTORNOS.
"Um total de 17 países se fez representar, ontem, na abertura oficial do congresso internacional que discutirá as melhores alternativas de repressão ao tráfico de mulheres brancas. Este importante evento internacional está sendo realizado na cidade de Paris e demonstra o cuidado e a preocupação de muitos países civilizados, principalmente europeus, com esta questão tão grave no mundo moderno."
Jornal do Commercio (RJ) - 23/10/1906
(Fonte: www.jornaldocommercio.com.br - Memória)
No último dia 18 na operação Caraxué (explorador da prostituição) a Polícia Federal prendeu em SP, MG e SC, dez acusados de envolvimento em uma quadrilha de exploração sexual que, só neste ano, enviou 40 travestis para prostituição na Europa.
A organização recrutava travestis em todo o Brasil por indicações e pela Internet aliciando travestis para a prostituição na Itália (Milão, Roma e Florença) e na Espanha (Zaragoza, Pamplona e Madri), cobrando cerca de R$ 30 mil pela passagem e uso de pontos de prostituição, além da hospedagem e alimentação.
Para que não voltassem ao Brasil sem pagar a dívida, os homossexuais tinham os passaportes retidos.
Cinco dos presos são travestis. Elvis Osório de Araújo, conhecido como Lorraine, é o líder do grupo. Tem casa em Milão, usada para abrigar aliciados. Foi preso em uma chácara com quatro piscinas em Uberlândia-MG.
Já Vilmar Rodrigues Cardoso, conhecido como Pâmela, foi preso em uma casa de praia em Palhoça-SC. Cardoso estava na Itália, levando aliciados.
Responderão pelos crimes de rufianismo (proveito da prostituição alheia), tráfico de mulheres e formação de quadrilha. As penas vão de um ano a oito anos de prisão.
Para introduzir os travestis na Europa visto que há um grande fluxo de travestis para Milão, e a imigração italiana costuma deportá-los a máfia do tráfico de pessoas usava rotas com menos chances de deportação: de avião até Suíça, Holanda ou França e de carro ou ônibus até Milão e Madri.
Recente relatório do Departamento de Estado norte-americano afirma que o Brasil exporta prostitutas brasileiras para 12 países: Estados Unidos, Argentina, Alemanha, Itália, Japão, Holanda, Paraguai, Portugal, Rússia, Espanha, Suíça e Reino Unido,
Além do tráfico interno de pessoas e também de prostitutas, o Brasil é mencionado no relatório, inclusive, pela exportação de travestis, estes especialmente para a Europa e Ásia, tecendo críticas a falta de assistência do governo brasileiro às vítimas de exploração sexual na maioria, mulheres e crianças.
Em todo o mundo, estima-se que sejam entre 700 mil e 4 milhões de vítimas anuais.
A máfia do tráfico usa intimidações e ameaças para levar as pessoas a uma situação próxima à da escravidão. Também há seqüestros de crianças e a venda de mulheres e meninas como empregadas domésticas.
Recentemente, um dos líderes da máfia de traficantes de pessoas o turco Ramazan Zorlu, de 43 anos foi condenado pela Justiça britânica, a oito anos e meio de prisão por liderar uma complexa rede que encaminhava centenas de prostitutas e travestis para a Grã-Bretanha.
Na mesma ocasião, foi preso Ali Riza Gun, de 47 anos, também envolvido no tráfico de pessoas, esquema que movimentava milhões de euros.
Ouso recomendar ao futuro presidente e novos governadores, a necessidade de combate a esse tipo de crime, investigando e perseguindo ativamente, com eficácia opondo-se ao tráfico de pessoas para fins sexuais ou de exploração do trabalho melhorando a prevenção, com proteção às vítimas e persecução aos facínoras.
Aliás, relatório da UNFPA (Situação da População Mundial do Fundo de População das Nações Unidas) mostra que o tráfico de pessoas é a terceira atividade ilícita mais lucrativa do planeta, perdendo, apenas, para os comércios de drogas e de armas. O número de vítimas, entre homens e mulheres, chega a 2,45 milhões.
*Luiz Fernando Boller é juiz Diretor do Foro da comarca de Tubarão (SC)
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