Página 11 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de 7 de Janeiro de 2020

Conselho Nacional de Justiça
há 4 anos

do conhecimento e capacitação, da cortesia, da transparência, do segredo profissional, da prudência, da diligência, da integridade profissional e pessoal, da dignidade, da honra e do decoro."Para cada uma dessas virtudes profissionais, tratadas como princípios, o Código de Ética da Magistratura do CNJ cuidou de especificar as condutas a serem observadas pelos magistrados, dentre as quais trago algumas pertinentes aos deveres de independência, transparência, integridade pessoal, prudência, dignidade, honra e decoro:"Art. 7º A independência judicial implica que ao magistrado é vedado participar de atividade político-partidária. (...) Art. 12. Cumpre ao magistrado, na sua relação com os meios de comunicação social, comportar-se de forma prudente e equitativa, e cuidar especialmente: I - para que não sejam prejudicados direitos e interesses legítimos de partes e seus procuradores; II - de abster-se de emitir opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos, sentenças ou acórdãos, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos, doutrinária ou no exercício do magistério. Art. 13.O magistrado deve evitar comportamentos que impliquem a busca injustificada e desmesurada por reconhecimento social, mormente a autopromoção em publicação de qualquer natureza. (...) Art. 15. A integridade de conduta do magistrado fora do âmbito estrito da atividade jurisdicional contribui para uma fundada confiança dos cidadãos na judicatura. Art. 16. O magistrado deve comportar-se na vida privada de modo a dignificar a função, cônscio de que o exercício da atividade jurisdicional impõe restrições e exigências pessoais distintas das acometidas aos cidadãos em geral. (...) Art. 24. O magistrado prudente é o que busca adotar comportamentos e decisões que sejam o resultado de juízo justificado racionalmente, após haver meditado e valorado os argumentos e contra-argumentos disponíveis, à luz do Direito aplicável. (...) Art. 37. Ao magistrado é vedado procedimento incompatível com a dignidade, a honra e o decoro de suas funções. (...) Art. 39. É atentatório à dignidade do cargo qualquer ato ou comportamento do magistrado, no exercício profissional, que implique discriminação injusta ou arbitrária de qualquer pessoa ou instituição."Como se vê pelos exemplos citados, o Código de Ética da Magistratura, que é composto de 42 artigos, explicita suficientemente as condutas que devem ser observadas pelos magistrados, seja na vida pública, na vida privada, no mundo real e no mundo virtual, para assegurar o cumprimento dos deveres legais impostos pela LOMAN e pela própria Constituição Federal. Importante pontuar que o Código de Ética da Magistratura foi inspirado no Código Íbero-Americano de Ética Judicial, sendo, assim, normativo de condutas voltado para a preservação da independência judicial, da respeitabilidade e da confiança na função judicante. Mas é preciso notar que quando se está a tratar de regulamentação de conduta judicial, o que se definem são virtudes ou valores profissionais, e, a partir deles, regras gerais a serem observadas pelos magistrados, de modo a resguardar a instituição quanto a sua legitimidade perante a comunidade. Isso porque prudência, sobriedade, cortesia, diligência, comportamento social adequado, dignidade, honra e decoro guardam significados intangíveis e de elevado grau de relatividade, de maneira que uma eventual transgressão somente é possível de ser aferida quando se está diante de um caso concreto, depois de consideradas todas as circunstâncias que o envolvem. A proposta de Resolução apresentada, no afã de especificar condutas, dota cada enunciado, sobretudo aqueles trazidos pelo artigo 3º, de uma elevada dose de generalidade, que expõe o magistrado ao subjetivismo do aplicador da norma. A magistratura brasileira dispõe de marcos normativos suficientes, que delimitam procedimentos e condutas, públicas e privadas, dos magistrados, permitindo satisfatoriamente a atuação dos órgãos de controle disciplinar, à luz de cada caso concreto que se apresente. Todas as situações hipotéticas descritas no normativo proposto, desde que, efetivamente, revelem descumprimento de deveres legais, podem ser coibidas ou evitadas pelo conjunto de normas vigentes. Assim, por entender despicienda a edição de ato resolutivo regulamentador da conduta de juízes nas redes sociais, voto, também por esse fundamento, pela não aprovação do normativo proposto. III - DA OFENSA AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE E À LIBERDADE DE MANIFESTAÇÃO DE PENSAMENTO E DE EXPRESSÃO Além da inadequação técnica e da inoportunidade da regulamentação proposta, penso que o seu conteúdo material também não se coaduna com os ditames constitucionais e legais. Vale repisar que a proposta apresentada tem por objetivo regulamentar o uso das redes sociais pelos membros do Poder Judiciário, e, com essa perspectiva, fixa balizas de comportamentos, estabelece critérios para utilização das diversas ferramentas de comunicação virtual, além de impor limites para expressão do pensamento pelos magistrados brasileiros. Muito embora, à primeira vista, possa parecer uma mera carta de recomendação e um conjunto de vedações já previstas em lei, trata-se, na verdade, de uma regulamentação imperativa que, a meu juízo, padece não apenas dos vícios formais já apontados, mas também trafega na contramão dos direitos fundamentais previstos na Carta Constitucional. A Constituição de 1988, erigida sob o paradigma do Estado Democrático de Direito, representa a transição de um modelo institucional permeado pelo arbítrio, para um novo tempo de liberdade e de respeito aos valores humanos. Não por acaso, a Carta de 1988 foi alcunhada por Ulisses Guimarães como o documento da liberdade, pois consagrou o princípio democrático em sua dimensão material, vinculando-o à realização de determinados valores, dentre os quais o da garantia dos direitos fundamentais. Na lição de J. J. Gomes Canotilho," os direitos fundamentais são um elemento básico para a realização do princípio democrático "[1], o que implica, dentre outros significados, em assegurar o pleno exercício das liberdades públicas, nelas inseridas as liberdades de associação, de formação de partidos e de manifestação de pensamento e de expressão. A liberdade de manifestação de pensamento e de expressão, constitucionalmente tutelada nos incisos IV, V e IX do art. da Constituição da República, possibilita a toda pessoa revelar publicamente a sua opinião, as suas convicções ou seu entendimento sobre qualquer fato da vida social ou política. Como bem pontuou a eminente Ministra Carmem Lúcia, em seu voto paradigmático na ADI 4815:" quem, por direito, não é senhor do seu dizer, não se pode dizer senhor de qualquer direito ". E foi nessa trilha de garantia dos direitos fundamentais, que a Convenção Americana de Direitos Humanos dispôs sobre a liberdade de expressão em seu art. 13, verbis:"Art. 13. (...) 1. Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito compreende a liberdade de buscar, receber e difundir informações e ideias de toda natureza, sem consideração de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro processo de sua escolha". Em abril de 2000, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, da OEA, aprovou uma Declaração de Princípios sobre Liberdade Expressão, estabelecendo, já em seu primeiro enunciado, que a"liberdade de expressão, em todas as suas formas e manifestações, é um direito fundamental e inalienável, inerente a todas as pessoas. É, ademais, um requisito indispensável para a própria existência de uma sociedade democrática". Evidentemente que a liberdade de expressão não se trata de direito absoluto, a ser exercitado sem qualquer limite. Como bem pontua Bernardo Gonçalves Fernandes, e que, nesse particular, espelha a corrente majoritária," a liberdade de expressão é limitada por outros direitos e garantias fundamentais como a vida, a igualdade, a integridade física, a liberdade de locomoção ", assim como" não pode ser usada para manifestações que venham a desenvolver atividades ou práticas ilícitas (antissemitismo, apologia ao crime e etc.) "[2]. Portanto, a relativização do direito à liberdade de pensamento e de expressão somente pode ocorrer nas situações excepcionais, nas quais estão em jogo outros direitos fundamentais. E, contrariamente ao que preconiza o preâmbulo da proposta de Resolução, não será o exercício do direito inalienável do magistrado de expressar publicamente uma opinião que tornará o Poder Judiciário menos independente, menos imparcial e menos íntegro. A Constituição Federal, ao dispor sobre a liberdade de pensamento e de expressão, afastou a possibilidade de censura de qualquer natureza, que, ainda na lição de Bernardo Gonçalves Fernandes, tem o conceito jurídico"de ação governamental de caráter prévio e vinculante sobre o conteúdo de uma determinada mensagem"[3]. Importa dizer: a edição de ato normativo que limita a livre manifestação do pensamento, definindo, a priori, as condutas que representam a suposta extrapolação desse direito, configura censura prévia, que não tem guarida constitucional, a teor dos incisos IV e IX do art. e § 2º do art. 220, ambos da Constituição Federal. A propósito, o artigo 13 da Convenção Interamericana de Direitos Humanos vedou também qualquer forma de censura prévia que seja capaz de inviabilizar a livre manifestação do pensamento, sem prejuízo de obrigações ulteriores que possam ser geradas. Vejamos:"Art. 13. (...) 1. Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito compreende a liberdade de buscar, receber e difundir informações e ideias de toda natureza, sem consideração de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro processo de sua escolha. 2. O exercício do direito previsto no inciso precedente não pode estar sujeito a censura prévia, mas a responsabilidades ulteriores, que devem ser expressamente fixadas pela lei e ser necessárias para assegurar: a) o respeito aos direitos ou à reputação das demais pessoas; ou b) a proteção da segurança nacional, da ordem pública, ou da saúde ou da moral públicas."Em idêntico sentido está a Declaração de Princípios sobre Liberdade Expressão, da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, que dispôs:"5. A censura prévia, a interferência ou pressão direta ou indireta sobre qualquer expressão, opinião ou informação através de qualquer meio de comunicação oral, escrita, artística, visual ou eletrônica, deve ser proibida por lei. As restrições à livre circulação de idéias e opiniões, assim como a imposição arbitrária de informação e a criação de obstáculos ao livre fluxo de informação,

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