Processo n. 1001391-67.2014.8.26.0006 da comarca de São Paulo

Fóruns Regionais e Distritais

VI - Penha

1ª Vara da Família e Sucessões

RELAÇÃO Nº 0403/2014

Processo 100XXXX-67.2014.8.26.0006 - Divórcio Litigioso - Dissolução - J.M.E.F.S.M.S. - J.A.M.S. - Vistos. J.M.E.F.S.M.S. move ação de divórcio litigioso cumulada com alimentos provisionais e partilha de bens em face de J.A.M.S., alegando : as partes se casaram em 18.9.99, sob o regime da comunhão parcial de bens, não tendo filhos, mas antes o casal viveu em união estável desde meados de 1993; cessada a vida íntima em novembro de 2013; após ver a liberdade do réu com outra mulher em site de relacionamento, ajuizou separação de corpos (processo nº 1000016.31.2014); houve abandono material por parte do réu, já que detentor da parte financeira do casal, sempre pagou as contas lhe depositando mil reais por mês e, de repente, deixou de fazê-lo, o que, inclusive, a obrigou a interromper um tratamento bucal com reabilitação orofacial para restabelecer equilíbrio dos músculos face intervenções anteriores, pondo em risco a sua vida; o padrão social do casal era bom, já que o réu exerce cargo na área fiscal do Estado e atua como advogado autônomo; a autora é professora de espanhol e contribuía com despesas do lar; o casal, na constância do casamento, adquiriu bens : apartamento no 4º andar na rua Atuai nº 53, Penha, nesta Capital, lote nº 175-B, no Município de Igaratá, casa situada na Estrada Municipal do Espigão nº 600, Município de Cotia, um veículo Nissan Sentra 2.0 2012/2013, placa FAR 3903, veículo Jac J6 2011/2011, placa EZJ 2426, bens da residência e aplicações financeiras (a apurar); pretende receber alimentos no importe de um terço do rendimento líquido do réu, já que desempregada e dependendo financeiramente do réu e em face do princípio da solidariedade entre as partes; tem gastos com água, luz, convênio médico, dentista, condomínio, IPTU, IPVA, alimentação, vestuário e diversos, a justificar os postulados alimentos provisionais; deseja a fixação de indenização por dano moral, já que o réu lhe profere xingamentos, ofendendo-a, foi o responsável pelo fim de seu tratamento bucal e pela traição (o réu vai a festas, dorme fora de casa e a deixa insegura), bem como o réu deixou um cassetete visível para intimidar a autora; ditos fatos lhe causaram abalo emocional e psicológico, a gerar indenização por dano moral, o qual estima em cinquenta mil reais; voltará a usar o nome de solteira, J.M.E.F.S. Pede a procedência para ser decretado o divórcio, com fixação de alimentos (um terço da renda líquida do réu) e do arbitramento de dano moral em cinquenta mil reais. Junta os documentos de f. 15/84. A autora peticiona dizendo que o réu confessou o adultério, o que motiva o divórcio com base no artigo 1573, do Código Civil e junta o documento de f. 86. O Ministério Público entende não ser causa de sua intervenção (f. 90/91). Fixados alimentos provisórios em 20% da renda líquida do réu (f. 93 e 107) e oficiado à empregadora (f. 94). O réu ingressou nos autos juntando procuração (f. 113/115). Audiência infrutífera no setor de conciliação (f. 118). O réu agravou da decisão de f. 93 (f. 120/136). Ofertada contestação (f. 141/169), na qual argumentou : invoca preliminar de inépcia quanto ao pedido de dano moral e preliminar de incompetência para que o pedido de dano moral seja formulado em Vara Cível; no mérito, sustenta que após o casamento, a relação entre as partes se deteriorou, optando a autora pelo divórcio; a autora deixou de trabalhar por opção própria; arquitetou uma inverdade gerando o boletim de ocorrência e moveu separação de corpos; as partes viviam sob o mesmo teto, mas já separados de fato, tendo alugado um apartamento em 20.2.14 e, mesmo assim, provia as despesas do lar e fazia depósitos regulares na conta da autora para despesas pessoais, tanto que custeou o tratamento bucal dela, encerrado em outubro de 2013; viveu com o casal o filho da autora de outro relacionamento, Rodrigo, o qual foi sustentado pelo réu; exerce o cargo de fiscalização financeira chefe junto ao Tribunal de Contas do Estado de São

Paulo, cargo em comissão, o que o impede de pleno exercício da advocacia; nega a prática de adultério; com final do relacionamento, ajuizamento de cautelar, aluguel de novo apartamento, passou a ter nova vida social; concorda com o divórcio; noticia duas contas correntes, no Bradesco (saldo R$ 71,80) e no Santander (saldo R$ 55,43); a autora é pessoa saudável e com idade produtiva e, caso necessite, que busque auxílio da Previdência Social e não pensão alimentícia do réu, para não se enriquecer ilicitamente, para seu sustento e de seu filho; não praticou ato ilícito, logo, não pode ser-lhe imposta indenização por dano moral; concorda que a autora volte a usar o nome de solteira. Traz a documentação de f. 116 e 170/279. Apresentada réplica (f. 283/291). O réu junta novos documentos (f. 294/298 e 303/307). Audiência de tentativa de conciliação também infrutífera, porém, as partes estão de acordo quanto à divisão igualitária dos bens (f. 308). Dado provimento parcial ao agravo de instrumento do réu (f. 428/436 e 449/452). Em apenso : separação de corpos proposta pela autora, bem como impugnação ao valor da causa e impugnação à concessão da gratuidade, incidentes suscitados pelo réu, os quais, são objeto de decisões próprias e autônomas. É o relatório. Fundamento. Decido. As provas já produzidas autorizam o julgamento antecipado da lide, nos termos do artigo 330, I, do Código de Processo Civil, sendo desnecessária a produção de novas. A petição inicial bem descreve os fatos e especifica os pedidos, com base nos fatos trazidos à tona, inexistindo motivo de inépcia, discriminados no artigo 296, do Código de Processo Civil. O pedido de dano moral se confunde com o próprio mérito. Tanto não é inepta que possibilitou ao réu oferecer longa e fundamentada defesa. Ademais, este juízo pode, em parte apreciar o pedido de dano moral consistente no adultério. Por essas razões, afasto as preliminares. Acrescento que não suscitado incidente de incompetência nem se tratando de alegação de incompetência absoluta. Afasto, pois, as preliminares. No mérito, a ação é procedente em parte. Com a entrada em vigor em 14 de julho de 2010, da nova redação do artigo 226, § 6º, da Constituição Federal através da Emenda Constitucional nº 66, não mais se exige o atendimento a requisitos de tempo ou motivação para o reconhecimento do divórcio. Trata-se de potestade por parte de quem o postula. Na lição de Arnoldo Camanho de Assis, “basta ao casal que externe sua vontade de não mais permanecer casado e pronto”, não se reclamando requisitos temporais ou prévia separação (no artigo “EC nº 66/10 : A Emenda Constitucional do Casamento” no “site” do IBDFAN). O ilustre Desembargador Caetano Lagrasta comentou sobre o aludido dispositivo constitucional : “a referida norma é de aplicabilidade imediata e não impõe condições ao reconhecimento do pedido de divórcio, sejam de natureza subjetiva - relegadas para eventual fase posterior a discussão sobre culpa - ou objetivas - transcurso do tempo” (TJSP, 8ª Câmara de Direito Privado, AI nº 990.10.357301-3-Bauru, j. 10.11.10). Segundo ensinamento de Maria Berenice Dias, “com o fim do instituto da separação judicial (EC 66/10) também desapareceu a identificação da culpa, pois o divórcio não admite perquirir causas” (“Manual de Direito das Famílias”, RT, 9ª ed., 3ª tiragem, 2013, nº 8.1, p. 124). Assim, são irrelevantes os motivos arguídos pela autora e pelo réu, para o reconhecimento do divórcio e, mesmo que assim não fosse, o que se diz a título de argumentação, ambos concordam com o o divórcio. Estando as partes casadas desde 18.9.99 (f. 16), viável o divórcio, sobretudo, porque neste aspecto, estão de acordo. A autora postula alimentos no importe de um terços dos rendimentos líquidos do réu, no que lhe assiste razão em parte. Durante o casamento o casal teve um padrão de vida razoável, proporcionado pela renda do réu. Sua renda era aplicada em prol da família. Assim, de forma repentina, com o fim do relacionamento, plausível que o réu arque com alimentos para que a autora se adapte à nova realidade e respeitando-se os critérios do artigo 1694, § 1º, do Código Civil. A obrigação alimentar na espécie se assenta nos princípios da solidariedade e da dignidade da pessoa. É ela professora de espanhol (o que consta à f. 16, 37, 43, 72, 73, 78, 157 e 212), logo não está incapacitada, temporária ou definitivamente para o trabalho. Necessário, em contrapartida, um tempo para se recolocar profissionalmente ou se reorganizar para a nova vida de divorciada, sendo razoável, o prazo de três anos. Para não haver o alegado abandono material são fixados os alimentos, logo, descabendo indenização a respeito. Não se pode, outrossim, eternizar a obrigação alimentar, seja para não ficar uma obrigação indefinida, seja para que o réu não tenha sua liberdade pessoal tolhida, seja porque o vínculo jurídico do casamento e correlatos deveres são extintos com o divórcio. Um encargo alimentar “sine die” importará, no futuro, em enriquecimento indevido pela alimentanda. Sendo a renda do réu alta, não se justifica e não se amolda ao binômio necessidade da autora e possibilidade do réu, que se mantenha o valor dos alimentos provisórios. Ajusta-se à espécie o desconto de 10% sobre os rendimentos líquidos do réu pelo prazo de três anos. No mais, a matéria já foi apreciada pelo v. acórdão de f. 428/436 e 450/452. Não há, outrossim, verbas em atraso, seja porque o desconto é feito junto à empregadora, seja pelo que consta no item 1 de f. 308. Rege a espécie o regime da comunhão parcial de bens (f. 16) e o acervo patrimonial foi adquirido após a realização do casamento, presumindo-se esforço do casal para tal finalidade e em prol da família. A divisão se dá de forma igualitária. É, também, a vontade das partes manifestada nos autos, sobretudo no termo de audiência, item 2 de f. 308 : “é incontroverso que as partes concordam que a partilha de bens, sejam eles quais forem é na proporção de 50%, para cada qual”. É consequência que eventual passivo sobre os bens, também siga a mesma regra. A autora, ainda, postula indenização por dano moral, lastreada em adultério, o qual lhe causou vexame e humilhação. No entanto, após a Emenda Constitucional nº 66/10, perdeu sentido a chamada “culpa”, mormente se baseada na relação extraconjugal para a decretação do divórcio e, em consequência, não há que se falar em dano moral. Tem-se, entendido que a consequência da existência do referido fato é a ruptura da vida em comum e a caracterização do divórcio. Já se decidiu : “Dano moral. Adultério. Circunstância que, em si mesma, salvo excepcionalidade inocorrente na hipótese, não acarreta dano moral indenizável. O relacionamento extraconjugal é apenas a consequência de uma união cujos sentimentos iniciais não perduraram no tempo, dando ensejo a que outros se sobrepusessem e levassem alguns dos cônjuges ou companheiros à relação afetiva com outras pessoas” (TJSP, Apelação Cível nº 361324-4/7, rel. Des. Maia da Cunha, j. 27.3.08). “Casamento. Adultério. Dano moral. Não configuração. Para que o adultério se traduza em dano moral é necessário repercussão extraordinária do fato e não, apenas, as consequências que lhe são ínsitas. Sendo a prova dos autos insuficiente, cabe a improcedência da pretensão. Recurso improvido” (TJSP, 6ª Câmara A Direito Privado, Apelação Cível nº 228.985.4/1, Itápolis, rel. Marcelo Benacchio, j. 19.7.06). “Ainda que não fosse, cumpre considerar que o adultério, por si só, não gera o dever de indenizar. É certo que à época dos fatos, o adultério era considerado crime pelo Código Penal. Tal fato, porém, por si só, não implica na ocorrência de dano moral. Não se discute que o rompimento de uma relação amorosa, em especial em razão de uma traição, gera sofrimento a qualquer indivíduo. Porém, em se tratando de relações pessoais, amorosas especificamente, a avaliação dessa dor e a causa para o rompimento têm características especiais, devendo ser analisadas com cautela. Esta Corte já decidiu que ‘o importante, para efeito de verificação do dano moral indenizável, não é o adultério em si mesmo, porque fato previsível e até comum na atualidade, cuja ocorrência, é bom destacar, não se dá apenas por deslealdade, mas também pelas circunstâncias que aproximam as pessoas com afinidades comuns muito mais do que antes. O importante é saber se dele resultou para o outro uma situação vexatória ou excepcionalmente grande o suficiente para ultrapassar os limites do desgosto pessoal pela conduta do outro cônjuge ou companheiro’ “ (TJSP, extraído do corpo da Apelação Cível nº 424.070.4/5, 4ª Câmara de Direito Privado, São Paulo, rel. Des. Maia da Cunha). A quebra, pois, do dever de fidelidade pela alegada traição, não gera dano moral, sobretudo após a autorização do divórcio sem a perquirição da “culpa”. Neste, aspecto, pois, a ação é improcedente. No entanto, as alegadas ofensas irrogadas pelo réu à autora, bem como o término do tratamento bucal e o uso de arma branca para intimidá-la, independente de comprovação nestes autos, já que baseados em fatos geradores de responsabilidade civil se constituem (em

tese) em ilícito civil, devendo ser a indenização por dano moral postulada no juízo cível, competente para tanto e não na Vara da Família e Sucessões. Dita pretensão deve ser deduzida com base nos artigos 186 e 927, do Código Civil e noutra seara (reiterase : por ser suposto ilícito civil em tese e não ilícito conjugal em específico). Por fim, a separação de corpos resta prejudicada já que o réu saiu da casa, de modo espontâneo, o que consta na contestação e não impugnado na réplica. Ademais, como medida preparatória, não mantém sua finalidade, dado que a solução é apresentada na ação de divórcio. Ante o exposto : a) julgo parcialmente procedente o pedido contido na inicial da ação movida por J.M.E.F.S.M.S. em face de J.A.M.S. para : (i) decretar o divórcio do casal, pondo fim ao vínculo matrimonial e expedindo-se mandado de averbação, após o trânsito em julgado; (ii) partilhar os bens identificados nos autos, dividindo-os de forma igualitária, ou seja, 50% para cada parte, tanto os bens imóveis quanto os móveis e as aplicações financeiras (estas na data da separação de fato) e, em contrapartida, dividir, por igual, as eventuais dívidas incidentes sobre dito patrimônio; (iii) a autora voltar a usar o nome de solteira, J.M.E.F.S. e (iv) o réu pagará a autora alimentos ora fixados em 10% (dez por cento) de sua renda líquida (feitos os descontos obrigatórios e incidindo sobre 13º salário, férias e eventuais verbas rescisórias) pelo prazo de três anos a contar desta data e, em consequência, altero, neste aspecto, a decisão de f. 93 e 107; os alimentos definitivos devem observar o artigo 13, § 2º, da Lei 5.478/68; b) julgo improcedente o pedido de dano moral em razão do alegado relacionamento extraconjugal. Os demais fundamentos do apontado dano moral deverão ser pleiteados em ação própria na esfera cível; e c) julgo extinta a medida cautelar de separação de corpos (processo digital nº 1000016.31.2014) com base no artigo 267, VI, do Código de Processo Civil. Em face da procedência parcial, o vencido pagara à vencedora verba honorária de 10% (dez por cento) do valor da causa e reembolso das custas judiciais, atualizado com juros de mora e correção monetária pelos índices do TJSP, observando-se em eventual execução, os ditames da Lei 1060/50 e o decidido na impugnação ao valor da causa. Expeça-se ofício ao empregador, na forma do item (iv), alínea a, acima. P.R.I.C. Decidir já prontos feito por Daniela impugnação à gratuidade e ao valor da causa. - ADV: ADJAR ALAN SINOTTI (OAB 114013/ SP), ROGERIO CAMPOS DO NASCIMENTO (OAB 257137/SP)

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