§ 378.º Meios de prova atípicos
Conceito de prova atípica
Em oportunidade anterior (retro, 1.349), ministrou-se a noção de prova atípica, obtida por exclusão, segundo a proposição do art. 369.
Formalmente disciplinados no CPC, e por esse critério são típicos os seguintes meios de prova: (a) a ata notarial (Seção III); (b) o depoimento pessoal (Seção IV); (b) a confissão (Seção V); (c) a exibição de documento ou coisa (Seção VI); (d) a prova documental (SeçõesVII eVIII); (e) a prova testemunhal (Seção IX); (f) a prova pericial (Seção X); e (g) a inspeção judicial (Seção XI). A rigor, porém, a ata notarial não se tornou integralmente típica e, ademais, os documentos eletrônicos, objeto da Seção VIII, representam subespécie de prova documental.
Seja como for, esses são os instrumentos constitucionalmente legítimos e típicos para o juiz adquirir conhecimento através dos seus sentidos (retro, 1.347).
Por oposição a tais instrumentos, o art. 369 declara todos os meios de prova, posto que“não especificados neste Código”, todavia hábeis“para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa”. Assim, diferentemente de outros ordenamentos, como o italiano, 1 o direito brasileiro admite provas atípicas: a enumeração legal das provas (retro, 1.343) e dos meios de prova é exemplificativa. E, de qualquer maneira, o caráter taxativo ou exemplificativo do repertório legal não tem maior importância nessa questão. 2
Essa oposição entre tipicidade e atipicidade, considerando a noção aqui adotada de fonte de prova (retro, 1.346), jamais se situará nesse âmbito. 3 O juiz adquire conhecimento de três fontes distintas: das pessoas, das coisas e dos fenômenos naturais e artificiais. Este rol é exaustivo, porque inexistem outras possibilidades. 4 Por exemplo, as leis do Estado laico dificilmente admitiriam revelações como fontes de prova (v.g., a audição de testemunha falecida por intermediação de médium).
Em decorrência dessas premissas, estabelece-se contraste entre a tipicidade e a atipicidade naprova no concernenteao meio emprego pelo juiz para adquirir o conhecimento necessário à emissão do juízo de fato. 5 Os problemas não cessam nesse contraste, mas aqui ele é ponto de chegada: provas atípicas são os meios não especificados integralmente na seção “Das Provas”.
Requisitos de admissão da prova atípica
São três os requisitos que devem ser simultaneamente preenchidos para admitirem-se provas atípicas no processo: (a) a legalidade e moralidade da aquisição do conhecimento; (b) a contradição das partes; (c) a produção subsidiária.
Legalidade da prova atípica – O art. 369 reclama que o meio de prova, embora não especificado, seja legal e moralmente legítimo. O requisito extrínseco da legalidade já recebeu análise em item anterior. A prova ilegal é inadmissível no processo civil.
Moralidade da prova atípica – A moralidade reclamada no art. 369 é a do padrão ético usual na sociedade, fundado no respeito à dignidade da pessoa humana, razão por que não se afiguram admissíveis provas que violem a fé da pessoa; por exemplo, o juramento compulsório.
Contradição na prova atípica – A prova atípica submeter-se-á ao prévio contraditório das partes. Não se mostraria legítimo o juiz introduzir prova atípica e, na sua apreciação, surpreender as partes. Tome-se como exemplo a prova casual tomada de empréstimo de outro processo (art. 372). Essa importação somente se justifica quando houver impossibilidade de reproduzi-la (v.g., o falecimento ou o desaparecimento da testemunha) ou o caráter técnico tornar essa reiteração desnecessária. Feita a importação, ex officio, o juiz submeterá a prova importada à crítica das partes, admitindo contraprova. Por exemplo, se o juiz determinou a juntada de perícia realizada em outro processo, mas abarcando os fatos controvertidos no processo, as partes têm o direito de provar que, na hipótese específica, as conclusões do perito não se aplicam ou não se mostram corretas. No caso da prova trasladada de outro processo, há um requisito suplementar: a parte desfavorecida pelo seu resultado deve ter participado da respectiva colheita.
Subsidiariedade da prova atípica – De um modo geral, provas atípicas são subsidiárias, aproveitando-se “na razão inversa da possibilidade de sua reprodução”: 6 tanto mais possível a produção da prova pelos meios legais, menos admissível a prova atípica. O princípio é a “preferência pela forma típica”. 7 Apresentando-se terceiro perante o juiz, porque dispõe de informações relevantes sobre os fatos e as circunstâncias do litígio (art. 380, I), por mais improvável que seja a colaboração espontânea de terceiros, o juiz deverá tomar por termo as declarações (v.g., na ação de A contra o condômino B, alegando o autor que seu automóvel foi abalroado na garagem do edifício pelo veículo de B, o porteiro C procura do juiz, pois sabe que os danos se verificaram em outro lugar e oportunidade), e mandar ouvi-lo como testemunha (art. 370, caput). Se, posteriormente à declaração espontânea, o porteiro mudou-se para lugar desconhecido (v.g., A é o síndico e, tomando conhecimento da iniciativa de C, despediu-o sumariamente), nada obsta que o termo lavrado seja considerado para rejeitar o pedido do autor.
Espécies de provas atípicas
Também os meios não especificados na lei para o juiz adquirir conhecimento não se mostram infinitos. Essa particularidade se infere da enumeração feita em outros ordenamentos. 8 Na rubrica das provas atípicas localizam-se as seguintes espécies: (a) a prova emprestada; (b) depoimento escrito; (c) requisição de documentos em poder de particulares; (d) comportamento processual; (e) juramento; (f) depoimento técnico; (g) as constatações oficiais, (h) a ata notarial. É difícil encontrar outros meios na seara da atipicidade. O direito brasileiro há muito abstraíra o problema do suporte e do mecanismo de reprodução de imagens e de sons, tratando-os juntamente com a prova documental, não se justificando, pois, o destaque da Seção VIII. Quanto à ata notarial, bem lembrada na Seção III, a atipicidade é parcial, exigindo a conjugação de outras disposições.
Tampouco a requisição de informações afigura-se inteiramente atípica. 9 O art. 438 disciplina-a em parte, ecom minúcias, quanto aos documentos existentes em repartições públicas. Noquetangeaosdocumentosecoisas empoderdeparticulares, o art. 401 disciplinou indiretamente arequisição; no caso da exibição da escrituração empresarialporinteiro,submeteuojuiz,explicitamente,àiniciativadaparte (art. 420). Nada obstante, outras disposições afiançam a existência de meio de prova, predominando a iniciativa conjunta das partes e do órgão judiciário, senão a exclusividade deste, em razão da autoridade de que é investido. Por exemplo, o art. 5.º, § 7.º, da Lei 5.478/1968, autoriza o juiz a requisitar de informações sobre o salário (rectius: retribuição pecuniária ou não) ao empregador privado do réu na ação de alimentos. A relativa incerteza indica a oportunidade de examinar…