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Processo Constitucional

Processo Constitucional

9. Desafios ao Constitucionalismo Brasileiro nos 30 Anos da Constituição Cidadã: A Crise e as Possibilidades em Face da Jurisdição Constitucional

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Diogo Bacha e Silva

Doutorando em Direito pela UFRJ. Mestre em Direito pela FDSM.

Professor de Direito da Faculdade de São Lourenço.

Alexandre Gustavo Melo Franco de Moraes Bahia

Doutor em Direito pela UFMG. Professor adjunto na UFOP e IBMEC–BH.

Coordenador do programa de mestrado Novos Direitos, Novos Sujeitos da FOP. Bolsista de Produtividade do CNPq.

Introdução

As teorias críticas da sociedade e do direito levantam a questão da dominação ideológica pelas vias do direito. 1 Enquanto projeto colonizador, a modernidade não teria sido possível sem uma simbiose com o campo jurídico. Estado, Direito, colonialidade e eurocentrismo são facetas da mesma moeda e que levam à dominação material e ideológica de uma cultura sobre outra. Quando as críticas se voltam para o direito, a reflexão que se deve fazer é sobre o monismo jurídico e sua adoção pela figura do Estado. O Direito tem sido utilizado como instrumento (inclusive de legitimação) para o projeto colonizador da modernidade – colonização aqui entendida não só de territórios, mas também de culturas, religiões, línguas, mercados, etc.

Muito embora se tenha comemorado como uma conquista civilizatória e necessária para avanço da humanidade, a Constituição e mesmo seu instrumento de salvaguarda, a jurisdição constitucional, não estão a salvo das mesmas críticas, isto é, de que se tratam de ideais eurocêntricos e sua incorporação em culturas distintas não passa de um veículo de dominação ideológica travestida de conquista civilizatória necessária para toda a humanidade.

Assim, também a Constituição e a jurisdição constitucional sofrem atitudes de suspeita epistêmicas desde o Sul (Santos; Meneses, 2009). É que não existe produção de conhecimento que seja neutro. A própria institucionalização da jurisdição constitucional, por assim dizer, acaba por reproduzir uma dominação epistemológica do Norte sobre o Sul. Mesmo que a argumentação para a legitimação da jurisdição constitucional seja, em regra, de que se trata de um veículo contramajoritário de inclusão de minorias políticas e, ainda, que a própria Constituição determine o pluralismo, é necessário repensar o lugar da jurisdição constitucional enquanto instituição de produção do direito. Para tanto, a necessidade é de pensar se a jurisdição constitucional pode ser uma instituição decolonizadora. As discussões sobre a jurisdição constitucional, normalmente, se referem aos seus limites democráticos; ao ativismo judicial, ao papel contramajoritário de defesa de minorias, etc. A discussão que pretendemos no presente tem outro suposto: algo anterior à própria jurisdição constitucional e mesmo à Constituição, é dizer, qual a real capacidade transformadora de uma Constituição (que deve fazer “tábula rasa” do direito/regime anterior) aprovada em um país (pretensamente) pós-colonial quanto a criar um novo Direito que, justamente, rompa com os padrões epistemológicos e estruturais do colonizador? Daí, se uma Constituição tem tal pretensão, qual o papel da jurisdição constitucional em tal realidade?

A colonialidade do saber e do poder se vale da aplicação de um direito monopolizado pelo Estado e cujo campo é dominado por agentes que veiculam um saber jurídico visto como “universal” e que, na verdade, é de origem eurocêntrica (LANDER, 2005). Todas as categorias e conceitos trabalhados pelo campo jurídico são de origem do saber europeu. Assim, por exemplo, temas como nulidade das leis inconstitucionais, controle de constitucionalidade concentrado ou difuso, interpretação conforme a Constituição, precedentes, decisões per curiam ou seriatim, são todos temas do saber do Norte .

No momento em que o grande projeto da Constituição de 1988 completa 30 anos – e, justamente, no momento em que tal projeto se encontra em uma das situações de maior ataque desde sua origem – é preciso (re) pensar o papel de defesa da Constituição como projeto de inclusão constante de novos direitos e de novos sujeitos. Uma jurisdição constitucional inclusivista não pode se ater às prisões do conhecimento. Dois movimentos teóricos atuais, quando relacionados, permitem repensar o lugar da jurisdição constitucional.

Em primeiro lugar, estamos nos referindo ao Novo Constitucionalismo Latino-Americano como movimento de construção de um projeto teórico e prático próprio da região latino-americana que, com suas especificidades históricas, sociais, políticas e econômicas, exige um saber constitucional e instituições constitucionais também específicas para os problemas da região – não que as instituições constitucionais europeu-ocidentais precisem ser descartadas e se tenha de começar tudo do zero, o que não é, sequer, possível, justamente pelo fato de que tais saberes e instituições existem e dão, inclusive, os marcos para se (re) pensar novas formas. Assim é que, mesmo quando se fala em um “novo constitucionalismo”, está-se valendo, para começar, da ideia de um “constitucionalismo”, conceito criado e desenvolvido no eixo EUA-Europa. O que o movimento pretende é pensar tais instituições na realidade de pluralismo nacional/cultural e, logo, não homogêneo, com novas exigências epistemológicas e o reconhecimento de “novos” sujeitos e de “novos” direitos (“novos” para o direito formal, pois que sempre estiveram à margem) 2 .

Depois, estamos também nos referindo a um movimento pouco debatido nas reflexões jurídicas que é a discussão da decolonialidade. Herdeiro do pensamento pós-colonial como movimento crítico-reflexivo de expor e pensar as figuras do colonial e do colonizado, colocando este como figura emergente no pensamento ocidental, a decolonialidade também se fia nestes estudos …

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27 de Maio de 2024
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/doutrina/secao/9-desafios-ao-constitucionalismo-brasileiro-nos-30-anos-da-constituicao-cidada-a-crise-e-as-possibilidades-em-face-da-jurisdicao-constitucional-processo-constitucional/1339715995