Capítulo VI

Capítulo VI DO INVENTÁRIO E DA PARTILHA Seção I Disposições gerais Art. 610. Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial. § 1º Se todos forem capazes e concordes, o inventário e a partilha poderão ser feitos por escritura pública, a qual constituirá documento hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de importância depositada em instituições financeiras. § 2º O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes interessadas estiverem assistidas por advogado ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial. Marcus Vinicius Bacchiega ▪ Comentários: O inventário é o procedimento de jurisdição contenciosa em que “se apuram os haveres da pessoa morta, o patrimônio que deixou, constituído de seus bens, direitos e obrigações para efetuar a partilha da herança aos sucessores legítimos e testamentários” 524 . Segundo o artigo 1.784 do CC, que adotou o princípio de saisine, a partir da morte é aberta a sucessão, transmitindo-se imediatamente a herança aos herdeiros legítimos e testamentários. Todavia, até a partilha, que se realiza no procedimento do inventário, a herança compõe um todo unitário (art. 1.791 do CC). Entende-se obrigatório o inventário judicial, isto é, processado mediante o ajuizamento de ação de inventário, nas hipóteses do caput. Entretanto, a 4ª Turma do STJ decidiu que a existência de testamento não inviabiliza o inventário extrajudicial quando os interessados forem maiores, capazes, concordes e devidamente acompanhados por advogados (STJ, REsp XXXXX/RJ , rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T., j. 15.10.2019; DJ 03.12.2019). Testamento é o ato personalíssimo pelo qual a pessoa capaz dispõe de parte ou da totalidade de seus bens para depois de sua morte. A sucessão testamentária está prevista no Título III (arts. 1.857 e ss.) do CC. A incapacidade civil de trata este artigo deve ser analisada a partir das disposições dos artigos 3º a 5º do CC. A competência para o processamento do inventário é definida nos artigos 48 e 49 do CPC. A faculdade do inventário extrajudicial, realizado por escritura pública lavrada em cartório de notas, nas hipóteses do § 1º, é permitida desde a Lei 11.441/07. A lavratura do referido ato notarial é regulada pela Resolução CNJ 35, de 24 de abril de 2007. Destacam-se a inexistência de prazo, a inaplicabilidade das supracitadas regras de competência do CPC, a independência de homologação judicial e a gratuidade para aqueles que declararem que não possuem condições financeiras de arcar com os emolumentos. O § 2º exige a assistência de advogado constituído no próprio ato notarial (apud acta) ou, quando a parte não tiver condições financeiras para tanto, de defensor público, a fim de garantir a adequada orientação jurídica das partes. Embora não tenha previsão legal, admite-se o denominado inventário negativo quando o falecido não deixou herança, com o fim de encerrar, por declaração judicial, os direitos dos herdeiros e as obrigações do espólio. Art. 611. O processo de inventário e de partilha deve ser instaurado dentro de 2 (dois) meses, a contar da abertura da sucessão, ultimando-se nos 12 (doze) meses subsequentes, podendo o juiz prorrogar esses prazos, de ofício ou a requerimento de parte. Marcus Vinicius Bacchiega ▪ Comentários: O prazo para o ajuizamento do inventário é imposto aos legitimados para tanto e atende principalmente ao interesse do Estado-membro no recolhimento do tributo causa mortis e ao interesse geral de resolver a situação patrimonial do espólio. Cuidam-se de prazos impróprios, ou seja, sua inobservância não acarretará sanção processual. No entanto, a demora no início do inventário influirá na ordem de preferência de nomeação do inventariante (art. 617 do CPC) e ensejará a incidência de multa fiscal sobre o imposto causa mortis (ITCMD), cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF (Súmula 542 ). Já o inventariante poderá ser removido caso a dilação desse prazo final decorra de sua omissão (art. 622, II, do CPC). Art. 612. O juiz decidirá todas as questões de direito desde que os fatos relevantes estejam provados por documento, só remetendo para as vias ordinárias as questões que dependerem de outras provas. Marcus Vinicius Bacchiega ▪ Comentários: Trata-se do limite de cognição probatória no processo do inventário, haja vista a singularidade do seu procedimento. Suprimiu-se a questão de alta indagação que previa o artigo 984 do CPC/73, a qual causava diferentes interpretações da doutrina e da jurisprudência. Portanto, no âmbito do inventário judicial somente não serão resolvidas as questões que, a critério do juiz, exigirem prova documental ainda não produzida, ou prova oral ou pericial, sem distinção quanto a sua complexidade material (STJ, AgRg no Ag XXXXX/RS , rel. Min. Humberto Gomes de Barros, 3ª T., j. 21.06.2007, DJ 01.08.2007). Distinguem-se a prova documental e prova documentada: A prova documental é aquela que permite ao juiz, por meio do suporte, o conhecimento direto e imediato do fato, independentemente da intermediação de alguém. Já a prova documentada representa a ideia de qualquer meio de prova, que venha aos autos “documentada”, ou seja, traduzida por um documento. Assim, por exemplo, um laudo pericial é prova documentada, mas obviamente não é prova documental, já que o conhecimento do fato pelo juiz é intermediado pelo perito. Com essas considerações, pode-se afirmar que somente quando os fatos alegados – e objeto da controvérsia – estiverem provados por prova direta, documental. 525 O CPC traz outras hipóteses de resolução de questões do inventário nas vias ordinárias quando não provadas documentalmente: art. 627, § 3º; art. 628, § 2º; art. 641, § 2º; art. 643. A decisão interlocutória que remete questão às vias ordinárias é recorrível por agravo de instrumento (art. 1.015, parágrafo único, do CPC). Art. 613. Até que o inventariante preste o compromisso, continuará o espólio na posse do administrador provisório. Marcus Vinicius Bacchiega ▪ Comentários: Competirá ao administrador provisório – aquele que, na ordem de preferência prevista no artigo 1.797 do CC, estiver de fato na posse direta e na administração dos bens do espólio – a função de geri-los desde a morte até o início do exercício do cargo de inventariante. O administrador provisório independe de nomeação judicial e, na prática, provavelmente virá a ser o inventariante, haja vista a correspondência das preferências do artigo 1.797 do CC e do artigo 617 do CPC. Na herança jacente a administração provisória do espólio será feita por curador designado (art. 739 do CPC). Art. 614. O administrador provisório representa ativa e passivamente o espólio, é obrigado a trazer ao acervo os frutos que desde a abertura da sucessão percebeu, tem direito ao reembolso das despesas necessárias e úteis que fez e responde pelo dano a que, por dolo ou culpa, der causa. Marcus Vinicius Bacchiega ▪ Comentários: Ao término de sua gestão o administrador provisório, por gerir bem alheio assim como o inventariante (art. 618, VII, do CPC), deverá prestar contas, se exigidas (STJ, AgInt no AREsp XXXXX/RS , rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª T., j. 25.10.2016, DJe 14.11.2016). O administrador provisório, naquilo que couber, tem as mesmas incumbências do inventariante (art. 618 do CPC) e está sujeito a idênticos limites, inclusive quanto à necessidade de autorização para praticar determinados atos (art. 619 do CPC). Em que pese a representação ativa do espólio pelo administrador provisório, admite-se o ajuizamento de ação por todos herdeiros para demandarem direito do falecido (STJ, RO em MS XXXXX/RN , rel. Min. Luiz Fux, 1ª T., j. 02.12.2003, DJ 16.02.2004). OLIVEIRA, Euclides de; AMORIM, Sebastião. Inventário e partilha. Teoria e prática. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 319. MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo curso de processo civil. São Paulo: Ed. RT, 2015. v. 3, p. 192.

Comentários ao Código de Processo Civil: Perspectivas da Magistratura

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