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Processo Penal

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Capítulo 14. Nulidade dos Atos Processuais

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14.1.Noções gerais

O legislador processual adotou o princípio da legalidade dos atos processuais. Como explica Carnelutti, “o legislador constrói um modelo ao qual o juiz, os assistentes e as partes devem ajustar-se, agindo do modo como lhes é indicado”. 1 Os códigos de processo são códigos de modelos típicos. 2 Há regulamentação quanto à forma da maioria dos atos processuais: denúncia ou queixa (CPP, art. 41), citação (CPP, art. 352 c.c. o art. 357), sentença (CPP, art. 381) etc. Trata-se, pois, de um sistema de tipicidade de formas. A lei prevê um “tipo legal” de ato processual, e, se o sujeito processual o pratica obedecendo aos requisitos e formas previstos em lei, o ato será típico, produzindo, em consequência, os efeitos jurídicos previstos em lei.

A tipicidade das formas é uma garantia para as partes e para a correta prestação jurisdicional. As partes ficariam profundamente inseguras se, ao praticarem um ato processual, não soubessem se este seria eficaz ou ineficaz, ficando a produção ou não dos efeitos ao mero capricho do juiz. Por outro lado, havendo um modelo a ser seguido, as partes saberão que, se o seguirem, inevitavelmente, o ato será eficaz, produzindo seus efeitos normais. O que se deve impedir é o “fetichismo formalista” que prejudique a própria substância dos atos. 3

O tipo legal do ato processual, contudo, não se confunde, necessariamente, com um artigo do CPP. Muitas vezes, “o complexo dos elementos necessários e suficientes para a determinação de certo efeito jurídico, ou seja, os elementos que compõem o tipo, geralmente não se encontram determinados em um único artigo de lei, sim em várias proposições. 4 Ou seja, o tipo é mais do que a hipótese de fato prevista na norma. Assim, o art. 352 estabelece os requisitos do mandado de citação. Todavia, outro dispositivo legal, o art. 357, prevê a forma de cumprimento de tal mandado. A citação somente será válida se cumprir o tipo legal, que engloba ambos os artigos.

Ao se praticar um ato processual, este pode estar conforme as exigências legais, ou não ter cumprido a forma estabelecida em lei. Em outras palavras, o ato poderá ser típico ou atípico.

A tipicidade é um conceito absoluto. O ato típico é aquele que em sua prática obedece a todos os requisitos do modelo previsto em lei. Já a atipicidade pode variar em sua intensidade. Há graus de atipicidade que poderão ser menores (pequena desconformidade como o modelo legal) ou maiores (grande diferença para o tipo legal). De acordo com o grau maior ou menor de desconformidade entre o ato praticado e o modelo previsto na lei, poderão variar as consequências da inobservância da forma legal.

A atipicidade do ato processual pode ser irrelevante, caracterizando-se como mera irregularidade que não impede que o ato produza seus efeitos processuais (por exemplo, denúncia oferecida fora do prazo legal). O ato irregular é ato atípico, porém eficaz, isto é, ato defeituoso, mas que não sofreu a sanção de ineficácia. Por outro lado, a atipicidade pode ser tão intensa que o ato seja considerado juridicamente inexistente (por exemplo, sentença proferida por juiz aposentado). Entre a inexistência e a mera irregularidade, existem as nulidades que, conforme a natureza do dispositivo violado, podem ser absolutas ou relativas.

Segundo a doutrina, o que distingue a nulidade absoluta da nulidade relativa é a finalidade para a qual foi instituída a forma violada. A violação de uma forma que atenda a um interesse público gera uma nulidade absoluta, enquanto o desrespeito a uma forma instituída no interesse das partes causa uma nulidade relativa. 5

Os atos processuais, por emanarem de agentes estatais, são dotados de presunção de legalidade. O ato processual, a princípio, produzirá efeitos, ainda que sejam nulos. Até mesmo no caso de nulidade absoluta, o ato processual produzirá efeitos, como se válido fosse, até que uma decisão judicial retire a eficácia do ato. Os atos processuais nulos poderão ser ineficazes. Trata-se de uma ineficácia potencial. Por exemplo, uma sentença condenatória absolutamente nula porque proferida por um juiz absolutamente incompetente produzirá efeitos (por exemplo, o acusado ficará preso) até que um Tribunal reconheça tal nulidade (por exemplo, concedendo habeas corpus). Assim, o sistema das nulidades dos atos processuais (emanados de agentes públicos) não se confunde com o sistema das nulidades dos atos de direito privado. No caso de nulidades dos atos materiais afirma-se que o ato nulo não produz efeitos. Isto, contudo, não vale para os atos processuais, no qual inexiste nulidade antes de haver o pronunciamento constitutivo pelo magistrado. 6

14.2.Atos inexistentes

A comparação entre atos nulos, de um lado, e de atos inexistentes, de outro, exige, inicialmente, que se enfrente a questão da admissão ou não da própria categoria dos atos inexistentes.

Não se nega que, do ponto de vista terminológico, falar em ato inexistente envolve alguma contradição. Ato é aquilo que é, uma potência que se transformou em ato. Um ato inexistente é um não ato. Se não existe, ato não poderia ser. 7 Há respeitável corrente doutrinária que critica a categoria dos atos inexistentes. 8

Todavia, a despeito de a lei não prever os atos inexistentes, 9 não se pode negar a relevância em distinguir as categorias da nulidade e da inexistência, 10 ainda que haja dissidência ou divergência sobre sua denominação. Há atos que são praticados em desconformidade com o modelo legal, causando um vício que possibilita a sua perda de eficácia jurídica até um dado momento. Outros atos serão juridicamente ineficazes, mas, se diante de suas pseudojudicialidades, produzirem efeitos práticos, estes poderão ser afastados a qualquer momento. Em termos mais práticos e ligados à dinâmica processual, os atos nulos não escapam da coisa julgada. Uma vez transitada em julgado uma sentença nula, ainda que absolutamente nula, nos casos em que não seja possível ação rescisória ou revisão criminal, não se poderá rescindi-la e reconhecer o vício do ato. Por outro lado, os atos inexistentes, mesmo que praticados em um processo com aparência de regularidade e validade, que sugira a formação de coisa julgada, ainda assim poderão, a qualquer momento, ser declarados inexistentes e ineficazes. 11 Em relação aos atos inexistentes, não há, tecnicamente, necessidade de rescisão da coisa julgada (que, assim como o ato e o processo, também inexiste), uma vez que jamais transitam em julgado. 12

Como distinguir os “atos inexistentes” dos “atos nulos”? Não há na lei um critério seguro. 13

Doutrinariamente é comum encontrar a afirmação de que os atos inexistentes são aqueles em que falta algum requisito considerado essencial. 14 Tal posição, contudo, não é isenta de críticas. Partindo da distinção entre os planos de existência, validade e eficácia, 15 Barbosa Moreira observa que a questão deveria ser analisada inicialmente sob o aspecto positivo, sendo necessário, primeiro, definir o que é preciso para que um ato exista. 16 O problema é que a lei não costuma prever quais são esses elementos essenciais. Em outras palavras, não há regime legal seguro para, de acordo com o direito posto, distinguir os elementos essenciais, cuja inobservância gera a inexistência jurídica do ato, de um lado, dos demais elementos do ato, em relação aos quais a inobservância gera apenas a nulidade. Assim sendo, ficou relegado para a doutrina definir o que se considera essencial para a existência do ato processual. 17

No campo processual, a teoria da inexistência dos atos processuais se desenvolveu a partir da concepção geral de pressupostos processuais, e, portanto, seriam vícios que fariam com que o processo, como um todo, juridicamente não existisse. No que concerne especificamente aos atos processuais, a partir de uma distinção entre elementos essenciais e não essenciais, em regra, o que …

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30 de Abril de 2024
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