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30 de Abril de 2024

Para a Segunda Turma do STF, o tráfico ilícito de drogas é compatível com a conversão em pena restritiva de direitos (Info. 569)

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Informativo STF, nº 569.

Brasília, 23 a 27 de novembro de 2009.

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.

SEGUNDA TURMA

Tráfico Ilícito de Entorpecentes: Cumprimento em Regime Aberto e Conversão em Pena Restritiva de Direitos

A Turma, superando a restrição fundada no Enunciado 691 da Súmula do STF, concedeu habeas corpus a condenado pelo crime de tráfico ilícito de entorpecentes (Lei 11.343/2006, art. 33) para determinar que tribunal de justiça substitua a pena privativa de liberdade por outra restritiva de direitos ou, havendo reversão, que o início do cumprimento da pena privativa de liberdade se dê no regime aberto. Assentou-se que a quantidade de pena imposta 3 anos , não constando circunstâncias desfavoráveis ao paciente, que não registra antecedentes, permitiria não só que a pena tivesse início no regime aberto (CP, art. 33, , c), mas, também, a substituição por pena restritiva de direitos (CP, art. 44, , segunda parte). HC 101291/SP , rel. Min. Eros Grau, 24.11.2009. (HC-101291)

NOTAS DA REDAÇAO

A pena é espécie do gênero sanção penal (do qual também é espécie a medida de segurança), que reproduz resposta estatal consistente na privação ou restrição de um bem jurídico (por exemplo, a liberdade) ao autor de fato punível. Como se sabe, adota-se legalmente no Brasil o critério trifásico, previsto no artigo 68, de acordo com o qual, o cálculo da pena é feito em três momentos: a) fixação da pena base; b) consideração das atenuantes e agravantes e c) averiguação de causa de diminuição e de aumento.

Cálculo da pena

Art. 68 - A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento.

Na primeira fase o juiz deverá encontrar a pena base, tomando em consideração os ditames do artigo 59 do Código Penal, in verbis :

Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime:

I - as penas aplicáveis dentre as cominadas;

II - a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos;

III - o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade;

IV - a substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie de pena, se cabível.

Neste momento o juiz analisará a vida pregressa do autor do crime, dados que devem ter sido colhidos, principalmente, no interrogatório e que munirão o juiz de informações tais como a existência de condenação definitiva que tenha perdido força para gerar reincidência. Mas o encontro da pena não se esgota com a análise do artigo 59, do Código Penal.

A segunda etapa indica que o juiz ainda deverá atentar para a existência de circunstâncias agravantes ou atenuantes, cujas hipóteses estão previstas, respectivamente, nos artigos 61 e 65, do Código Penal.

Por último, pelo critério trifásico, o juiz terá de avaliar a existência de causas de aumento e diminuição de pena. As causas de aumento e diminuição podem estar na parte geral ou na parte especial do CP ou, ainda, na legislação extravagante, em quantidade fixa ou variável; leva em consideração a fase intermediária, não estando adstrito aos limites legais como nas duas fases anteriores do critério trifásico.

Superado o critério trifásico de cálculo da pena, o juiz deve passar à fixação do regime de cumprimento de pena, sendo certo que para tanto atenderá a outros critérios, sendo possível afirmar que a observância do artigo 33 do Código Penal, neste momento, é de suma importância:

Art. 33 - A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semi-aberto ou aberto. A de detenção, em regime semi-aberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado.

1º - Considera-se:

a) regime fechado a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média;

b) regime semi-aberto a execução da pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar;

c) regime aberto a execução da pena em casa de albergado ou estabelecimento adequado.

2º - As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso:

a) o condenado a pena superior a 8 (oito) anos deverá começar a cumpri-la em regime fechado;

b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semi-aberto;

c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto.

3º - A determinação do regime inicial de cumprimento da pena far-se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código.

4o O condenado por crime contra a administração pública terá a progressão de regime do cumprimento da pena condicionada à reparação do dano que causou, ou à devolução do produto do ilícito praticado, com os acréscimos legais. (grifos nossos).

E, por fim, passa-se à análise de possível substituição por penas alternativas, que são as restritivas de direito e a multa; trata-se de sanção imposta em substituição à pena privativa de liberdade, consistente na supressão ou diminuição de um ou mais direitos do condenado e estão previstas no artigo 43 do Código Penal, mas têm sua aplicação prevista no artigo 44, in verbis :

Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando:

I aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo;

II o réu não for reincidente em crime doloso;

III a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente.

1o (VETADO)

2o Na condenação igual ou inferior a um ano, a substituição pode ser feita por multa ou por uma pena restritiva de direitos; se superior a um ano, a pena privativa de liberdade pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos e multa ou por duas restritivas de direitos.

3o Se o condenado for reincidente, o juiz poderá aplicar a substituição, desde que, em face de condenação anterior, a medida seja socialmente recomendável e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime.

4o A pena restritiva de direitos converte-se em privativa de liberdade quando ocorrer o descumprimento injustificado da restrição imposta. No cálculo da pena privativa de liberdade a executar será deduzido o tempo cumprido da pena restritiva de direitos, respeitado o saldo mínimo de trinta dias de detenção ou reclusão.

5o Sobrevindo condenação a pena privativa de liberdade, por outro crime, o juiz da execução penal decidirá sobre a conversão, podendo deixar de aplicá-la se for possível ao condenado cumprir a pena substitutiva anterior. (grifos nossos).

A decisão, objeto desta análise, proferida nos autos do HC 101291/SP , concedeu a ordem ao paciente que, condenado pela prática de tráfico ilícito de drogas, pugnava pela substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito. Na oportunidade, asseverou-se que tendo em vista a quantidade da pena imposta, aliado ao fato de que não haviam circunstâncias desfavoráveis ao paciente, ele teria direito a iniciar o cumprimento da pena em regime aberto ou ter sua pena privativa de liberdade substituída por uma restritiva de direitos.

O presente decisum contraria o disposto na Lei de Drogas e faz persistir a discussão sobre a constitucionalidade da norma que segue transcrita, de acordo com a qual, não se pode beneficiar o traficante de drogas pela substituição por penas restritivas de direitos.

Arts. 33, e 44, da Lei 11.343/06 :

4o Nos delitos definidos no caput e no 1o deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa.

Art. 44. Os crimes previstos nos arts. 33, 1o, e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos.

A este respeito já se manifestou o Tribunal da Cidadania. Por meio de uma ponderação de princípios constitucionais, a maioria dos ministros da referida Corte entendeu que a defesa social deveria prevalecer, em detrimento de assegurar possíveis benefícios ao traficante de drogas. Majoritariamente, entendeu- se no HC 120353/SP que o repúdio à prática do tráfico é também tarefa imposta pela Lei Maior, o que se consigna pelas previsões existentes no artigo 5º, incisos abaixo subscritos: XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura , o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins , o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem; LI - nenhum brasileiro será extraditado, salvo o naturalizado, em caso de crime comum, praticado antes da naturalização, ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins , na forma da lei; (sem grifos no original).

De acordo com o Min. Ari Pargendler há estreita relação entre a inafiançabilidade do tráfico ilícito de drogas e a inconversibilidade da pena de privação da liberdade pela pena restritiva de direito, pelo que, seria possível justificar as previsões legais no próprio texto constitucional.

Pelo que se nota, a discussão permanece, pois embora a questão tenha sido analisada pela Corte Especial do STJ, obedecendo-se a cláusula full bench , a questão ainda não foi objeto de apreciação em caráter definitivo pela Suprema Corte nacional.

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