Página 524 da Judicial - 1ª Instância - Capital do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 25 de Agosto de 2016

utilizado para tal, tendo sido providenciado também um compactador estacionário para reduzir os barulhos com a compactação dos resíduos. Também afirmou que os ruídos têm outras fontes, não sendo exclusividade da atuação da coleta de resíduos da ré, razão pela qual requer a improcedência do feito. Juntou procuração e documentos a fls. 73/138.Réplica a fls. 141/158.Em saneador, foi determina prova oral (fls. 184/185). Termo de audiência e oitiva das testemunhas a fls. 221/229.Em audiência foi determinada a realização de prova pericial. Laudo a fls. 296/318 e 326/341. Manifestação do assistente técnico da ré a fls. 343/453.Esclarecimentos do perito a fls. 505/509, manifestações a fls. 514/524. Novos esclarecimentos a fls. 531/545.Alegações finais a fls. 550/562 e 564/574.Eis a síntese do necessário. FUNDAMENTO E DECIDO.No mérito, os pedidos são procedentes. Dispõe o Código Civil que:Art. 1.277. O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha.Parágrafo único. Proíbem-se as interferências considerando-se a natureza da utilização, a localização do prédio, atendidas as normas que distribuem as edificações em zonas, e os limites ordinários de tolerância dos moradores da vizinhança.Nos direitos de vizinhança, a norma jurídica limita a extensão das faculdades de usar e gozar por parte dos proprietários e possuidores de prédios vizinhos, impondo-lhes um sacrifício que precisa ser suportado em prol da convivência social e do respeito recíproco das propriedades. Tem seu cerne vinculado ao mau uso da propriedade, pela mensuração de condutas de proprietários e possuidores que excedem o razoável e prejudicam a segurança, sossego e saúde de vizinhos.A matéria consubstancia normas de Direito Público e Privado, bem como institutos de direito real e obrigacional, já que, quando o exercício desse direito potestativo excede o razoável, mesmo nos limites de uma propriedade, poderá causar incômodos à vizinhança e poderá sofrer limitações, cujos contornos são encontrados no sistema de direito privado e em normas urbanísticas e edilícias.No caso dos autos, trata-se de suposta emissão de ruídos, acima dos limites aceitáveis, pela atividade diária de retirada de lixo hospitalar, em grande quantidade, com veículos pesados, realizada durante a madrugada, perturbando o sossego e a tranquilidade da vizinhança.O uso normal da propriedade é aquele que busca preservar a segurança, o sossego e a saúde dos moradores da região onde se situa o imóvel. É seu direito um estado de relativa tranquilidade, na qual a emissão de ruídos, acima do suportável pelo homem comum, acarreta enorme desgaste psicológico e até físico.O sossego, apesar de intrinsecamente ligado ao direito à privacidade, não pode ser conceituado como a completa ausência de ruídos, mas a possibilidade de afastar ruídos excessivos que comprometam a incolumidade da pessoa.Em âmbito municipal, foi promulgada a Lei nº 13.885/04, estabelecendo uma série de regramentos de ordem pública, dentre os quais o da poluição sonora. Sem contar o conjunto de normas técnicas da ABNT (NBR 10151 Avaliação de Ruído em Áreas Habitadas, Visando o Conforto da Comunidade), já existentes nesse sentido.Visou-se ao estabelecimento de parâmetros aceitáveis ao homem comum de forma objetiva, levando em consideração questões de ordem biológica, técnica e social. Tomando como base essas premissas, concluiu a perícia pela existência de ruídos acima dos limites aceitáveis, em julho/2015. Importante notar que, apesar do desconto de 14 dB relativo ao ruído de fundo gerado pelo ambiente (principalmente pelo sistema de ar condicionado do shopping vizinho), ainda sim se constataram resultados de poluição sonora, que variaram entre 62dB a 76dB, valores incompatíveis com o horário em que eram realizadas as atividades de retirado do lixo de forma incontroversa das 01h:00 às 04h:00 (fls. 302). Segundo a Lei Municipal nº 13.885/04: Art. 177. A definição dos parâmetros de incomodidade para usos nR referidos no inciso I do artigo 174 e para usos R, tem como objetivo assegurar que:I. quanto à emissão de ruído:(...) b) na ZM, os níveis de ruído emitidos, durante o período diurno, não perturbem as atividades domésticas normais e, durante o período noturno, não provoquem o despertar ou dificultem o adormecer, de acordo com os parâmetros estabelecidos nos Quadros 02/d e 02/g anexos, para cada tipo de via;Tais quadros, por sua vez, dispõem que o limite de dB diurno é 65 e o noturno 45, seguindo o entendimento das normas técnicas da ABNT e pelos parâmetros adotados pelo perito (fls. 302).Apesar de a ré ter adequado a coleta e reciclagem do lixo para antes das 21h, substituindo caminhões por veículos menores (não sendo possível avaliar o barulho por esses emitido), e implantado galpão para abafar os sons, em julho/2015, o perito atesta que as medições ficaram acima do permitido pela legislação municipal. Aliás, em medições anteriores, feitas em outros casos envolvendo poluição sonora de caminhões, o valor variou de 90 dB a 110dB (fls. 316), o que atestaria o nível do barulho que a parte autora e os moradores da região estariam ouvindo desde 2009, todas as madrugadas, desde a substituição dos veículos. Além da perícia, a existência de forte barulho perturbador do sossego é confirmado pelo depoimento das testemunhas (fls. 222/227). Também, em que pese a tentativa de mitigação da responsabilidade da autora, a perícia não constatou nenhuma outra fonte de ruído relevante na região (fls. 317), o que somente reafirma os argumentos da autora e das testemunhas sobre a falta de sossego na região ser decorrente exclusivamente dos ruídos provocados pela retirada do lixo hospitalar.Ademais, não se sustenta a alegação de que os caminhões não poderiam circular durante o dia por conta de restrições das ZRCMs. Segundo o Decreto nº 37.085/97, que regulamenta a Lei nº 12.490/97, que autoriza o Executivo a implantar Programa de Restrição ao Trânsito de Veículos Automotores no Município de São Paulo:Art. 5º Excetuam-se da proibição de circulação de que trata este Decreto os seguintes veículos:VI outros, empregados em serviços essenciais e de emergência, assim considerados, para os fins deste Decreto:(...) c) serviço funerário, água, luz, telefone, gás, trânsito, coleta de lixo e correio, devidamente identificados como tais;(...) Ou seja, o lixo não era recolhido de madrugada por restrição legal, mas por conveniência, estabelecida entre o réu e as empresas responsáveis pela retirada do lixo, não podendo ser utilizado como argumento para justificar a opção do horário que, somente após a interposição desta demanda, foi mudado.É no mínimo curioso, que, num primeiro momento, tenha o réu afirmado a impossibilidade da mudança de horário de coleta em virtude das ZRCMs; depois mudou o argumento dizendo que tal fato fugia ao seu controle, por ser o horário de retirada dos resíduos infectantes de controle apenas da empresa LOGA e da Prefeitura, mas, antes da perícia, tenha o horário sido mudado.Nem mesmo após o abaixo assinado ao Departamento de Limpeza Urbana, que contou com a adesão de quase 100 pessoas (fls. 21/26), e da recomendação do Diretor do LIMPURB, em 01.09.2011, para mitigação dos ruídos produzidos (fls. 27/28), pouco fez o Hospital réu, limitando-se a justificar a impossibilidade da construção de galpão por conta de obras que ocorreriam de ampliação das instalações.Ora, por mais que a construção do galpão não fosse viável à época, não havia justificativa para o não revestimento das paredes que circundam o pátio de manobras com material antirruído, providência sugerida em 2011 e, cinco anos depois, ainda não implementada.Em sede de direito de vizinhança, mesmo o uso normal será equiparado ao mau uso, se acarretar interferência em imóveis vizinhos. Assim, em termos práticos, é igualmente ofensiva a conduta de quem produz ruídos excessivos e de alguém que emite ruídos moderados, mas por falha na construção (isolamento acústico) culmina por infringir danos excessivos ao vizinho.Veja-se que, no caso concreto, a relevância social da atividade não comporta sua paralisação, mas, por outro lado, não significa que os vizinhos devam ser por ela prejudicados, cabendo ao magistrado impor medidas para a redução dos danos (art. 1279).Não se ignora o esforço da parte ré na tentativa de adequar a atividade de retirada do lixo às práticas que reduzam a emissão de ruídos. Contudo, a perícia demonstrou que não foram suficientes (a caçamba compactadora, por exemplo, ainda produz ruídos fls. 330), sendo, aliás, tais ruídos superiores ao permitido pela Lei do Psiu, mesmo se considerado o limite no horário diurno.Assim, não se mostra suficiente apenas a alteração do horário da coleta do lixo, ou a construção do galpão, mas também se mostra necessário o cumprimento das recomendações do Diretor do LIMPURB, de forma integral, ou seja, o revestimento das paredes, que circundam o pátio de manobras, com material antirruído.Verifica-se também a existência de dano moral. Esses se constituem numa classe de lesões

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