Página 1635 da Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte I do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 22 de Agosto de 2014

XVII, da Lei Orgânica do Município de Cotia.” Ora, a mera posição topográfica do auxílio-transporte na Lei Orgânica não influencia na regulamentação legal, especialmente porque a ementa das leis apenas “explicitará, de modo conciso e sob a forma de título, o objeto da lei”, nos precisos termos do art. da Lei Complementar 95/98, não tendo, portanto, qualquer valor para fins de determinação da vigência ou validade do instrumento normativo. Estas circunstâncias continuam regulamentadas pelo art. 2º da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro que, em seu § 2º estatui: “A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a anterior.” Do teor da dicção legal é possível constatar que não houve revogação tácita da Lei 417/91 pela novel redação da Lei Orgânica do Município de Cotia pelo simples fato de que não há incompatibilidade desta com aquela, haja vista a continuidade da previsão do benefício em questão em outro dispositivo. No caso em testilha mister proceder à interpretação sistemática e teleológica do ordenamento jurídico municipal, não se podendo considerar apenas a norma contida na ementa da Lei 417/91, mas todas as disposições referentes ao regime dos servidores públicos locais, atualmente previsto em outro artigo, bem como à finalidade do texto legal, que é conferir aos agentes públicos um direito social. E, consoante aduz MARIA HELENA DINIZ, isto é assim porque “o sistema jurídico não se compõe de um só sistema de normas, mas de vários, que constituem um conjunto harmônico e interdependente, embora cada qual esteja fixado em seu lugar próprio.” Ademais, continua a mesma autora, é impositivo “adaptar o sentido ou finalidade da norma às novas exigências sociais, adaptação prevista pelo art. da Lei de Introdução ao Código Civil, que assim reza: ‘na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.’ Os fins sociais são do direito, logo, é preciso encontrar no preceito normativo o seu telos (fim). O bem comum postula uma exigência, que se faz à própria sociabilidade; portanto, não é um fim do direito, mas da vida social. O sentido normativo requer a captação dos fins para os quais se elaborou a norma. A interpretação, como nos diz Ferrara, não é pura arte dialética, não se desenvolve como método geométrico num círculo de abstrações, mas perscruta as necessidades práticas da vida e a realidade social. O aplicador, nas palavras de Henri de Page, não deverá quedar-se surdo às exigências da vida, porque o fim da norma não deve ser a imobilização ou a cristalização da vida, e sim manter contato íntimo com ela, segui-la em sua evolução e adaptar-se a ela. Daí resulta, continua ele, que a norma se destina a um fim social, de que o juiz deve participar ao interpretar o preceito normativo.” Em suma: as disposições acima referenciadas afiguram-se plenamente aplicáveis, dada sua vigência irrefutável e constitucionalidade cristalina, até porque não se cogitou da invalidade delas quanto aos demais servidores municipais. Nessa quadra, observa-se que a legislação municipal prevê a vantagem em questão em relação a todos os servidores municipais, com exceção dos agentes políticos, cujo regime jurídico é diverso, inexistindo qualquer especificidade quanto à função. A única condicionante existente se refere à fruição pelo servidor de transporte fornecido pela própria municipalidade, motivo pelo qual é desnecessária a comprovação pelo servidor do efetivo uso do transporte público para que faça jus à verba. Neste ponto, possível abrir-se um parêntese. É que se afigura, como dito, completamente desnecessária a comprovação da efetiva utilização pelos servidores do transporte público por duas razões de simples compreensão. Primeiro, porque se cuida de verba de caráter indenizatório meramente parcial, já que fixada em montante determinado, pois que não se estatui na lei de regência que haverá integral cobertura de tais custos, consoante a própria denominação da verba como auxílio. Diante disto, ainda que as despesas com o transporte sejam maiores, não fará jus o servidor a nenhum tipo de complementação. Segundo, porque não se exige, em sede administrativa, nenhum tipo de comprovação do uso dos serviços de transporte público, conforme se observa do teor dos decretos juntados, razão pela qual é de se entender que a lei estabelece verdadeira presunção de que os servidores se valem de transporte público para se deslocar ao trabalho, presunção esta que não se infirma ainda que comprovada a utilização de meios próprios para o transporte. É dizer, o funcionário municipal detém direito ao recebimento do auxílio pelo só fato de manter vínculo laboral com a Administração Pública Municipal. Portanto, exigir-se a comprovação em sede judicial afigura-se atentatório ao espírito da legislação local, pois que as únicas exceções, como salientado alhures, para o pagamento da verba concernem aos agentes políticos, enquanto no exercício das elevadas funções, bem como ao fornecimento de transporte pela municipalidade, o que apenas poderia ser comprovado por meio documental, ante os princípios da legalidade e da publicidade (art. 37, caput da Constituição Federal), já que todas estas hipóteses devem estar devidamente documentadas e formalizadas no âmbito da Administração, pena de prática de improbidade administrativa por parte dos responsáveis. A respeito do assunto já decidiu o Superior Tribunal de Justiça: “DIREITO ADMINISTRATIVO. PAGAMENTO DE AUXÍLIOTRANSPORTE A SERVIDOR PÚBLICO QUE UTILIZA VEÍCULO PRÓPRIO. É devido o pagamento de auxílio-transporte ao servidor público que utiliza veículo próprio no deslocamento para o trabalho. Esse é o entendimento do STJ sobre o disposto no art. 1º da MP n. 2.165-36/2001. Precedentes citados: AgRg nos EDcl no Ag 1.261.686-RS, DJe 3/10/2011, e EDcl nos EDcl no AgRg no REsp 576.442-PR, DJe 4/10/2010. AgRg no AREsp 238.740-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 18/12/2012.” Retomando o raciocínio, tem-se que é mais que conhecido o vetusto aforismo segundo o qual onde a lei não distingue não cabe ao intérprete distinguir (ubi lex non distinguit nec nos distinguere debemus), motivo pelo qual não se concebe possa o Município, por intermédio do Poder Executivo, proceder à discriminação entre os servidores integrantes de seus quadros no que tange à concessão do benefício legal. Em abono do que se afirma, pontifica CARLOS MAXIMILIANO: “Quando o texto dispõe de modo amplo, sem limitações evidentes, é dever do intérprete aplica-lo a todos os casos particulares que se possam enquadrar na hipótese geral prevista explicitamente; não tente distinguir entre as circunstâncias da questão e as outras; cumpra a norma tal qual é, sem acrescentar condições novas, nem dispensar nenhuma das expressas.” Com efeito, dispõe o art. 144, § 8º da Constituição Federal que: “Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei.” Embora contida em dispositivo integrante do rol das forças de segurança pública, é bem sabido que as guardas municipais não se destinam a este fim, caracterizando-se como verdadeiros servidores públicos municipais. É que são caracterizados como servidores públicos todos os agentes ocupantes de cargos previstos em lei para fins de concretização das atribuições do Estado, quer na prestação de serviços públicos, quer no desempenho da Administração da coisa pública, sujeitos a regime jurídico específico ou à legislação celetista, caso em que ocupam os chamados empregos públicos. Sobre o assunto, esclarece CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELO: “Servidor público, como se pode depreender da Lei Maior, é a designação genérica ali utilizada para englobar, de modo abrangente, todos aqueles que mantêm vínculos de trabalho profissional com entidades governamentais, integrados em cargos ou empregos da União, Estados, Distrito Federal, Municípios, respectivas autarquias e fundações de Direito Público. Em suma: são os que entretêm com o Estado e com as pessoas de Direito Público da Administração indireta relação de trabalho de natureza profissional e caráter não eventual sob vínculo de dependência.” No mesmo sentido, o escólio de HELY LOPES MEIRELLES, referindo-se especificamente ao regime jurídico municipal: “Servidores públicos municipais, ou, simplesmente, servidores municipais, em sentido amplo, são todos os agentes públicos que se vinculam à Administração Pública Municipal, direta e indireta, sob regime jurídico: a) estatutário regular, geral ou peculiar; b) administrativo especial; ou c) celetista, regido pela Consolidação das Lei do Trabalho (CLT), de natureza profissional e empregatícia.” É mais que evidente, repita-se, que os integrantes da guarda municipal detém todos os caracteres que lhes atribuem a condição de servidores públicos municipais, razão pela qual em relação a eles deve ser observado o mesmo regime jurídico, inclusive no que tange aos benefícios remuneratórios, desde que não destinados a categorias

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