Página 1345 do Diário de Justiça do Estado de Pernambuco (DJPE) de 2 de Setembro de 2014

passo a reflexão meritória.O núcleo do pedido é a reintegração do impetrante ao cargo de Agente de Endemias.O primeiro óbice intransponível e que retira do impetrante o pressuposto de utilidade processual é que, ao tempo da rescisão contratual, sequer existia o cargo criado por lei para o qual pretende a reintegração.É dizer, segundo as diretrizes de Direito Administrativo vigentes, não há como se reintegrar uma pessoa em cargo inexistente, ou seja, o princípio da legalidade exige do administrador a prévia lei criadora do cargo sob pena de responsabilidade do administrador público.O Poder Judiciário não pode agir como legislador positivo, criando direito ou regulamentando seus parâmetros de incidência.Ressalte-se, ademais, que a pretensão do impetrante de aplicar a Lei n. 11.350/2006, a todo custo ao caso dos autos, como fundamento de seu pedido e norma auto-executável, não tem respaldo na melhor exegese da própria lei, pois o art. 14 da Lei n. 11.350/2006 é claro ao aduzir, verbis:"Art. 14. O gestor local do SUS responsável pela contratação dos profissionais de que trata esta Lei disporá sobre a criação de cargos ou empregos públicos e demais aspectos inerentes à atividade, observadas as especificidades locais" (original sem negrito e destaque).É dizer, há um comando dirigente para o Chefe do Poder Executivo Municipal apresentar proposta de lei privativa regulamentando o que diz respeito à competência legislativa municipal, notadamente a criação dos cargos e a disciplina das despesas e demais peculiaridades da função. Assim, não havendo prova nos autos da existência dos cargos de agentes comunitários de saúde após 05.10.2006 e até a rescisão contratual do impetrante, prazo de vigência do contrato, fica evidenciada a ausência de direito subjetivo a amparar o pleito autoral e os contratos temporários firmados após a vigência da Lei n. 11.350, de 05 de outubro de 2006 devem, ao revés, ser reputados nulos ex vi do art. 16 do referido Diploma Legal.Em outras palavras, o ato ilegal (contrato temporário) não pode convalidar a ilegalidade da contratação, restando apenas o direito do contratado a perceber remuneração durante o período em que trabalhou efetivamente para a Administração Pública Municipal. Ressalte-se que a Administração Pública se rege pelo princípio da legalidade e tem o dever de fazer somente aquilo que está na lei e este princípio afeta também a tutela jurisdicional na medida em que o Poder Judiciário não poderá conceder mais direitos do que os previstos em lei, pois que cria o direito é norma legal vigente ao tempo do fato.No caso concreto, não se pode olvidar que toda matéria de criação de cargos e aumento de despesa pública, direta ou indiretamente, deve observar a lei municipal, o que inclusive consta expressamente na Lei n. 11.350/2006 em harmonia com a Constituição Federal, verbis: "Art. 30. Compete aos Municípios:I - legislar sobre assuntos de interesse local;II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;"Neste ponto, o eminente doutrinador e advogado José Nilo de Castro é incisivo a asseverar, verbis:"A matéria de vantagens pecuniárias ao pessoal do Município, como quaisquer vantagens financeiras ou aumento da despesa pública, por mais legítima que tenha sido, é de ordenação da lei. Com efeito, na edição da lei, impõe-se o concurso inafastável do Poder Executivo no processo legislativo, pela iniciativa, sanção, veto e promulgação. [...] Ainda mais, preceito salutar insculpido na Carta Federal (§ 1º, art. 169) está a exigir que concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração só se poderá fazer"se houver prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesas de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes", além de autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias (art. 169, § 1º, I e II, CF). Doutra parte, o art. 30, I, da Constituição da República - disposição similar possuem as Constituições Estaduais, em sua maioria, ao cuidarem dos seus Municípios -preceitua que compete ao Município legislar sobre assuntos de interesse local.Indiscutivelmente, insere-se no âmbito de assuntos de interesse local a criação de vantagens pecuniárias e gratificações de diferentes espécies a servidores municipais.Ora, a disposição constitucional (art. 30, I, CF) está a indicar, irremissivelmente, que tal matéria é da alçada da lei e, em sendo de lei, o Legislativo Municipal só poderia editá-la com imprescindível participação do Executivo no processo legislativo, quer pela iniciativa, reservada a alguns casos, como no caso do aumento de vantagens pecuniárias ou sua criação aos servidores da Prefeitura, quer pela sanção, veto e promulgação".Logo após, arremata o eminente doutrinador, verbis:"Porquanto, em conseqüência, admitir a iniciativa de outro Poder implica violação manifesta do Estatuto Supremo. A atribuição de iniciativa exclusiva de lei é, em Direito Constitucional, incondicional e absoluta, não cabendo à autoridade, a que é atribuída, consentir na sua usurpação ou no seu exercício por outro Poder, conforme magistralmente nos ensina Francisco Campos (RDA 73/380)". (In Direito Municipal Positivo, CASTRO, José Nilo de, 6ª edição revista e atualizada, p.53, Editora DelRey, Belo Horizonte - 2006). Merece destaque, também, a lição de Hely Lopes Meirelles, em sua obra Direito Municipal Brasileiro, verbis: "Só o Município poderá estabelecer o regime de trabalho e de pagamento de seus servidores, tendo em vista as peculiaridades locais e as possibilidades de seu orçamento. (STF, RDA 56/260; TASP, RT 286/703, 291/784 e 304/647)" (In Direito Municipal Brasileiro, 15ª edição, p. 594, Malheiros Editores - 09/2006). Sobre o princípio da legalidade administrativa (CF,art. 37, caput) trago à colação, também, a doutrina sempre consultada de Uadi Lammêgo Bulos, verbis:"O princípio da legalidade administrativa apresenta força vinculante. Por isso, a Administração Pública somente pode impor aquilo que a lei autorizar. Trata-se de uma projeção das liberdades públicas, que dirige o regime administrativo dos órgãos governamentais, evitando o arbítrio e o abuso de poder" (In Curso de Direito Constitucional, BULOS, Uadi Lammêgo, p.794, Editora Saraiva:2007). Como se vê, além de incidir o princípio da legalidade, também incide o princípio do orçamento e, no caso da legalidade, a incidência é ainda mais rígida quando se trata de Administração Pública cuja despesa com a criação de cargos deverá ter prévia previsão legal.Vejamos a incisiva lição de Kiyoshi Harada, verbis: "O princípio da legalidade é de observância impositiva no âmbito da Administração Pública. O agente público é sempre um escravo fiel da lei: só age nos termos da lei, quando, onde e como a lei determinar. No campo da execução orçamentária, porém, o princípio da estrita legalidade atua com particular rigor. Para assegurar o controle orçamentário, a Carta Magna adota os mecanismos de rigorosa fiscalização que, inclusive, extravasam do campo de atuação do princípio da legalidade para adentrar nas esferas da legitimidade, da economicidade etc."(In Direito Financeiro e Tributário, HARADA, Kiyoshi, Atualizado de acordo com a Lei de Responsabilidade Fiscal, 8ª edição, p. 95, Editora Atlas) (negritei).Neste ponto, não há discrepância quanto ao entendimento de Alexandre de Moraes, verbis:"O tradicional princípio da legalidade, previsto no art. , II, da Constituição Federal, aplica-se normalmente na Administração Pública, porém de forma mais rigorosa e especial, pois o administrador público somente poderá fazer o que estiver expressamente autorizado em lei e nas demais espécies normativas, inexistindo incidência de sua vontade subjetiva, pois na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza, diferentemente da esfera particular, onde será permitida a realização de tudo que a lei não proíbe. Esse princípio coaduna-se com a própria função administrativa, de executor do direito, que atua sem finalidade própria, mas em respeito à finalidade imposta pela lei e com a necessidade de preservar-se a ordem jurídica". (In Direito Constitucional Administrativo, MORAES, Alexandre de, p.99, Editora Atlas).Não vejo como o Poder Judiciário ou o gestor da Administração Pública Municipal poderia reintegrar o autor ao cargo se sequer existia o cargo, à época da contratação.Suposta lei criadora do cargo após os fatos que ensejaram a presente lide não tem o condão de instaurar direitos subjetivos para o autor, pois a lei criadora dos cargos não retroagirá para atingir fatos irregulares e ilegais do passado. Ressalte-se, por fim, que não remanesce dúvida quanto a natureza precária e temporária do contrato firmado entre a Administração Pública Municipal e o impetrante, quer pela disposição constitucional do art. 37, IX, da CF, quer pelo contido no contrato temporário, sucessivamente renovado.Por outro lado, nos termos do art. 16 da Lei n. 11.350/2006, que veda a contratação temporária dos agentes comunitários de saúde a partir da vigência da referida lei de regência, tenho que a contratação do impetrante era nula de pleno direito, o que também não autorizaria a reintegração, porquanto o contrato nulo não surtiu seus efeitos legais na seara do Direito Administrativo.Ve-se, portanto, que o pedido não ostenta uma das condições da ação estratificada no interesse de agir, inclusive sob sua faceta de utilidade, pois o bem jurídico objeto da demanda era a reintegração do impetrante ao cargo temporário em momento que o contrato não mais exteriorizava efeitos legais em razão de seu término. E se assim não se entendesse, em sede própria o contrato seria declarado nulo para todos os fins de direito ante a incidência do art. 16 da Lei n. 11.350/2006, não surtindo efeitos legais, o que obstaria qualquer pretensão de reintegração. Acerca da matéria, merece destaque, ainda, a lição do jovem processualista Fredie Didier Jr., verbis:"3.5.2. O interesse-utilidade. Há utilidade da jurisdição toda vez que o processo puder propiciar ao demandante o resultado favorável pretendido. A providência jurisdicional reputa-se útil na medida em que," por sua natureza ", verdadeiramente se revele - sempre em tese - apta a tutelar, de maneira tão completa quanto possível, a situação jurídica do requerente". Explica Cândido Dinamarco: "Sem antever no provimento pretendido a capacidade de oferecer essa espécie de vantagem a quem postula, nega-se a ordem jurídica a emiti-lo e, mais que isso, nega-se a desenvolver aquelas atividades ordinariamente predispostas à sua emissão (processo, procedimento, atividade jurisdicional).É por isso que se afirma, com razão, que há falta de interesse processual quando não mais for possível a obtenção daquele resultado almejado - fala-se em"perda do objeto"da causa." (In Curso de Direito Processual Civil, Teoria geral do processo e processo de conhecimento, Jr., Fredie Didier, Volume 1, p.176, Edições Podivm: 2007) Por fim, pinço trecho da doutrina incisiva de Humberto Theodoro Júnior, verbis: "Mesmo que a parte esteja na

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