Página 141 da Judicial I - Interior SP e MS do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) de 31 de Outubro de 2014

passaportes e vistos, bem como as agências de turismo que emitiam bilhetes (falsos ou não), para viabilizar a viagem ilegal para o exterior.Finalmente, para reduzir as chances de insucesso na emigração da pessoa, observouse um terceiro grupo de pessoas que atuavam na organização criminosa, a saber, funcionários de companhias aéreas e policiais federais, que eram cooptados para a participação no esquema de emigração ilegal desenvolvido a partir da saída do Brasil com documentos falsos de viagem.Os primeiros (funcionários de companhias aéreas) recepcionavam os passageiros com documentação irregular, com a consciência de que a situação toda era no mínimo suspeita, e mesmo assim davam andamento ao embarque, permitindo-o, por vezes, sem a necessária conferência da documentação, com a emissão do respectivo cartão ou então simplesmente acompanhando o passageiro até a área restrita do Aeroporto, para entrada na aeronave. O fato de haver um funcionário de

companhia aérea ao lado de um passageiro poderia ser intuitivo no sentido de que tal embarque estava sendo acompanhado individualizadamente e, por isso, se houvesse alguma irregularidade, certamente que seria detectada, procedimento que, em outras palavras, servia para afastar suspeitas ou despistar a atenção de outros fatores de fiscalização.,Já aos policiais cabia a autorização do ingresso do passageiro na área restrita de embarque na aeronave; ou seja, a saída do território brasileiro. A função dos servidores da Polícia Federal, no caso, era efetuar o controle migratório, para os fins previstos no Estatuto do Estrangeiro, razão pela qual era imprescindível a conferência dos documentos de cada viajante, sob o aspecto da identificação e validade documental, bem assim, quanto aos estrangeiros, do prazo de permanência no País, através, entre outros, das tarjetas de imigração, formulários que deveriam apresentar carimbos de entrada e saída do território nacional.Por isso, ao liberar conscientemente (com dolo direto ou eventual) o ingresso do passageiro com documentação irregular na área de embarque, o policial federal contribuía decisivamente para a consumação do uso de documento falso, pois, sabendo dessa condição ou no mínimo da efetiva suspeita, anuía ao dolo do passageiro e dos demais que providenciaram tal aparato, todo ele destinado a sacramentar uma imigração ilegal na América do Norte ou Europa, sendo certo que o primeiro passo (saída do Brasil) estaria garantido. O mesmo pode ser dito do carimbo aplicado à tarjeta de imigração de uma pessoa que não saiu ou não entrou no país, em determinada data, fazendo com que os controles fossem burlados.Finalmente, em caso de eventual inadmissão ou deportação do passageiro, pelo país de destino, observou-se no curso da investigação a prática de atos tendentes ao resgate de tais passageiros, para o que concorriam tanto policiais quanto funcionários de companhias aéreas, além da participação e coordenação efetuada pelos despachantes. Tudo, pois, de modo a tornar os serviços da organização mais seguros e, conseqüentemente, atrativos aos passageiros, pois caso houvesse inadmissão, nada aconteceria, pois haveria o resgate do cliente. Em síntese, tais detalhes revelam a verdadeira sofisticação das atividades objeto da investigação em tela.Graficamente, podemos visualizar a organização da seguinte forma: Do que adveio aos autos, constatou-se que os agenciadores, falsificadores e despachantes tinham contato entre si, por um lado; mas os grupos de funcionários das companhias aéreas e os policiais costumavam manter contato apenas com o grupo dos despachantes, os quais intermediavam os embarques ilegais, acertando os detalhes de todos os outros grupos.Desta forma, cada grupo da organização criminosa tinha suas funções específicas e seus contatos, revelando verdadeira estrutura empresarial, compartimentada, concatenada, permanente, destinada a vários embarques irregulares, com o que restou atendido plenamente o requisito do tipo penal do verbo associarse.Analisando todos os elementos de prova colhidos ao longo da investigação, bem como aqueles produzidos durante a instrução processual deste feito, percebe-se que há prova da materialidade quanto ao delito de quadrilha, previsto no artigo 288, caput, do CP, eis que ao longo da investigação foram identificadas diversas práticas delitivas todas relacionadas ao embarque e desembarque de pessoas com documentação irregular, iludindo o controle migratório.A prova da materialidade da quadrilha encontra-se consolidada, sobretudo, no relatório final das investigações, trazido inicialmente nos autos do procedimento sigiloso nº 2003.61.19.002508-8 e colacionado em todas as ações penais dele derivadas. A par da consolidação feita no relatório das investigações, é importante pontuar que a prova da materialidade da quadrilha reside não apenas os diálogos interceptados ao longo da investigação, mas também nas missões cumpridas (vigilâncias, acompanhamentos, diligências), no resultado das buscas e apreensões realizadas, nos interrogatórios prestados à época da deflagração da operação, bem como em um ou outro caso em que foi possível identificar e até mesmo deter pessoas que fizeram uso dos serviços da quadrilha; como exemplo, pode-se citar o embarque do indivíduo identificado como Jorge Peate Marcos, denunciado nos autos de nº 2005.61.19.005990-3 e que era o típico cliente da quadrilha, como acima designado.Além disso, todo o material probatório coletado na investigação, que, sendo constantemente submetido ao contraditório pleno desde setembro de 2005, foi acrescido das provas produzidas em juízo, a saber, as testemunhas ouvidas, os interrogatórios judiciais dos acusados, entre outros elementos, todos a demonstrar de maneira inequívoca que mais de 3 pessoas se associaram para cometer crimes tendo como palco de atuação o Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos, com vistas à migração ilegal de pessoas (de diversas nacionalidades) que pretendiam residir em caráter definitivo no exterior e não o conseguiriam pelas vias normais, ou seja, com a obtenção de passaportes e vistos consulares autênticos, razão pela qual a articulação do grupo era realmente imprescindível para que referida migração se concretizasse.Comprovada a materialidade, resta examinar quem fazia parte da citada quadrilha ou bando nos presentes autos.3) DA AUTORIA E DOLO NO DELITO DE QUADRILHAConsiderações introdutóriasComo é cediço, foi estratégia da acusação apresentar

Figura representando 3 páginas da internet, com a principal contendo o logo do Jusbrasil

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