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3 de Maio de 2024

Esquerda e direita: a supérflua dicotomia.

Publicado por Giovana Storm Ross
há 4 anos

Na esfera política, assim como em qualquer outro aspecto da sociedade, tem-se uma necessidade constante de se classificar os pensamentos dela derivados, a fim de descrevê-los e organizá-los categoricamente.

Essa busca classificatória incessante se tornou prática frequente, antiga e universal. Constantemente, duas classificações específicas acabam se convertendo em generalizações, fenômeno conhecido como “dicotomia”. A política, aqui compreendida como a arte ou a ciência do governo, bem como a relação entre este e os cidadãos, não foge do esquema.

Considera-se dicotomia a classificação dividida em dois ramos ou elementos, sendo seus conceitos normalmente contraditórios. Como exemplo, cita-se o claro e o escuro, o bem e o mal, o alto e o baixo.

No ramo político, essa dicotomia ficou estabelecida entre a “direita” e a “esquerda”. Ambos os termos surgiram durante a Revolução Francesa, e se referiam aos assentos dos parlamentares durante as sessões legislativas. À direita da cadeira do presidente do parlamento sentavam-se aqueles que se consideravam favoráveis ao Antigo Regime, enquanto à esquerda aqueles que eram contra.

Nessa perspectiva, a esquerda passou a ser vista como a grande defensora dos direitos dos trabalhadores e da população mais pobre. Já a direita ficou restrita a uma visão predominantemente conservadora e tradicional, ligada à defesa do bem estar individual acima de qualquer coisa.

Com o passar do tempo, outras nações aderiram aos termos. Destarte, na medida em que os regimes mundiais se modificavam e o comunismo perdia sua força, diversos idiomas passaram a refletir uma carga predominantemente positiva à direita e negativa à esquerda.

Tais efeitos são perceptíveis até os dias atuais. No inglês, por exemplo, a direita se traduz em “right” (certa), dando a entender que a “left” (esquerda), seria considerada “wrong” (errada). Em francês, da mesma forma, a esquerda é chamada de “gauche” (desastrada), enquanto a direita é referida como “droite” (íntegra). Em italiano, igualmente, a esquerda é “sinistra”, ao passo que a direita é “destra”.

Essa rivalidade se reflete cotidianamente nas mais diversas esferas da sociedade, mormente em países como o Brasil, que ultrapassam momentos políticos difíceis. Dessarte, para a maioria das pessoas, os dois lados são considerados grandes inimigos. Prefere-se, notadamente, que ambos se odeiem do que se instaure um diálogo mútuo, a fim de que seja encontrado o melhor rumo à nação.

A verdade, contudo, é que os termos “esquerda” e “direita” nem deveriam existir, pois resultam unicamente na polarização e divisão do país. Ademais, a dicotomia política prevalece apenas no discurso, mas não na realidade, tornando-se apenas uma ferramenta retórica que cria conflitos, marca posições extremistas e demoniza pensamentos diversos.

Estamos sempre pensando as coisas e as pessoas como direitista ou esquerdista, radical ou conservador, democrático ou não. Não à toa, somos todos classificadores e categorizadores naturais muito hábeis, pois carregamos isso em nossos genes. Todavia, deve-se compreender que diferenciar maçãs de laranjas ou elefantes de rinocerontes é muito mais simples do que classificar indivíduos por seus entendimentos políticos.

É simples dizer se uma pessoa é alta ou baixa, loira ou morena, mas classificar seus pensamentos e suas ideologias não o é. Nesse sentido, ideais políticos não deveriam se resumir em apenas dois lados, obrigatoriamente.

Em sociedades complexas, como aquela em que vivemos, os ideais acabam se diferenciando consideravelmente. É nesse cenário que surge a Democracia, com sua singela arte da negociação, a qual garante à política a função de colocar todas as diferentes percepções da sociedade para conversar, na busca de soluções intermediárias que não devem ser restritas a dois termos vagos e imprecisos.

Pôr fim à esta polaridade entre direita e esquerda, demasiadamente estéril e enganadora, não significa apenas abandonar uma classificação já obsoleta, mas também garantir um significativo avanço no debate político. Afinal, uma dicotomia totalitarista e extrema jamais será capaz de definir os infinitos anseios da comunidade, sendo o diálogo o único remédio capaz de curar os males das generalizações desnecessárias.

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