Topoi
Em coautoria com Emilly Fidelix
O termo é de Aristóteles, que chamava de topoi as verdades aceitas que formam a base de nosso pensamento, argumentos e orientam as escolhas que fazemos no dia a dia. O Houaiss registra tópico: “diz-se dos lugares-comuns ou o estudo ou os tratados a respeito dos mesmos”; o Aurélio, tópicos: “lugares-comuns”. Os dicionários trazem vários significados para lugar-comum. Interessa-me o que remete para a ideia de fórmula trivial, de amplo consentimento em determinada cultura.
Esmiuçando: os topoi são as verdades, digamos, populares, que se repetem, se espraiam e acabam por consolidarem-se, adquirindo status de sabedoria. Confundem-se um pouco com os provérbios e, como eles, transformam-se em sentenças. Não necessitam ter conteúdo moral como têm os anexins, mas acabam, igualmente, adquirindo ar de certeza. Também não são dogmas, dado que estes são pontos fundamentais e indiscutíveis, base estruturante, sobretudo, das religiões.
Os topoi, pois, permitem discussão, mas como estruturam (junto com anexins, provérbios e dogmas) as compreensões primárias do tão buscado “sentido do mundo”, não é nada fácil desconstruí-los. Desconstruir topoi seria como desconstruir as peças de uma máquina e manter a máquina íntegra. Ora, como os topois são argumentos importantes para justificar percepções de mundo, desfazê-los seria equivalente a solapar o arcabouço mental explicativo da vida que as pessoas levam.
Bem, encontro postado no mural do Facebook de Emilly Fidelix: Na prática a teoria é outra. Provoco: “Emilly, a afirmação de que na prática a teoria é outra é uma teoria, ou seja, uma afirmação teórica. Então, em sendo uma teoria, na prática ela pode ser outra coisa, logo, podemos admitir que, na prática, a teoria pode ser a mesma coisa.” Emilly contesta: “Neste caso, não acredito que seja uma teoria, mas sim uma ideia formada, como você mesmo disse, uma afirmação.”
Achei a resposta interessantíssima. Não seria filosoficamente verdadeira, contudo, é uma “verdade” circulante. Em geral, as “ideias formadas” acabam não sendo entendidas como uma teoria e viram uma coisa à parte, tornam-se base de compreensões da realidade, alcançando grau de autorreferentes. Essas ideias formadas estabelecem-se sem verificação prévia, portanto, estão baseadas em coisa nenhuma. Em palavras científicas, não são uma conclusão induzida ou deduzida.
Emilly e eu chegamos a uma questão: um teorema seria só uma teoria ou uma prática demonstrada? Rematamos: teorema é uma proposição possível de ser demonstrada por processo lógico. Teorema, pois, é teoria. A proposição demonstrada, todavia, pode ter aplicação prática, contudo, importante: em sendo um teorema uma teoria, se a teoria fosse necessariamente diferente da prática, cada aplicação prática de um teorema seria diferente de outra, e não é.
Em verdade, uma teoria, quando posta em prática, pode restar igual, ou não. Variáveis podem incidir entre a teoria e a prática dessa teoria. Variáveis humanas não são sempre controláveis, pois no caminho da realização prática é comum haver desvirtuamento da teoria. Mas, aí, novamente a teoria está correta, porque ela avisa que o humano (felizmente) não se comporta com muita uniformidade e coerência. Uniformes e coerentes são os insetos. Grandes macacos não são coerentes.
Estou pensando em provocar a Emilly: você já ouviu falar que toda regra tem exceção? Pois bem, se toda regra tem exceção, então a regra que diz que toda regra tem exceção igualmente haverá de ter exceção, logo, nem toda regra tem exceção. E se ela me responder que tudo é relativo? Ah!, direi eu: mas a afirmação tudo é relativo é um absoluto, e ninguém deveria, com um absoluto, dizer que tudo é relativo. Vai ser uma boa conversa, ela me disse que está interessada nesses assuntos.
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