Página 1261 da Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte III do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 13 de Julho de 2021

constitucional, há a proibição de discriminação salarial aos portadores de deficiência (art. 7º, XXXI); a reserva de percentual de vagas em cargos e empregos públicos às pessoas com deficiência (art. 37, VIII); a preferência na ordem cronológica de pagamento de precatórios de débitos alimentares (art. 100, § 2º), dentre outros. Na legislação ordinária, há leis voltadas especificamente ou em especial à defesa de portadores de deficiência, como a Lei nº 10.048/2000 (referente ao atendimento prioritário), a Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência) e a Lei 7.853/1989, cujo Decreto regulamentador nº 3.298/1999 instituiu a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência. Relevante, ainda, a adesão a tratados internacionais concernentes aos deficientes físicos, a exemplo da “Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo”, assinada em Nova York e promulgada pelo Decreto 6.949/2009, da qual o Brasil é signatário, e que impõe ao Estado o compromisso de “Levar em conta, em todos os programas e políticas, a proteção e a promoção dos direitos humanos das pessoas com deficiência” em seu art. , 1, c. No mesmo diploma, o artigo 20, a, impõe ao Estado a necessidade de tomar medida efetiva em prol dos deficientes, “facilitando a mobilidade pessoal das pessoas com deficiência, na forma e no momento em que elas quiserem, e a custo acessível”. No contexto do ordenamento pátrio, notase o esforço legislativo em conferir especial proteção aos deficientes físicos intenção esta alinhada e escudada pelo princípio fundamental da isonomia (art 5º, caput, CF). Nesse panorama, a concessão de isenção no pagamento de tributos para a aquisição de automóvel por pessoas com deficiência (PCD) tem por escopo fazer valerem os princípios da igualdade e da promoção da justiça social, facilitando o acesso a transporte aos que dele mais necessitam por sua condição específica (e que nem sempre podem contar com transporte público adaptado às suas necessidades), contrabalançando os custos extras em que incorrem diversas pessoas com deficiência que são compelidas a adquirir automóveis com adaptações ou modificações que possibilitem sua condução diante de algum fator próprio limitante. A isenção do IPVA está prevista na Lei nº 13.296/2008, em seu artigo 13, que trazia a seguinte redação: “Artigo 13 -É isenta do IPVA a propriedade: (...) III -de um único veículo, de propriedade de pessoa com deficiência física, visual, mental severa ou profunda, ou autista;” O artigo em comento foi modificado pela Lei nº 17.293/2020, publicada em 15/10/2020: “Artigo 13 -É isenta do IPVA a propriedade: (...) III -de um único veículo, de propriedade de pessoa com deficiência física severa ou profunda que permita a condução de veículo automotor especificamente adaptado e customizado para sua situação individual.” No mesmo sentido é o art. , I, do Decreto nº 59.953/2013, alterado em 07/12/2020 pelo Decreto nº 65.337/2020, que passou a ter a seguinte redação: “Artigo 4º- A isenção do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores - IPVA poderá ser concedida, em cada caso, por despacho da autoridade administrativa em requerimento com o qual o interessado comprove o preenchimento das condições e o cumprimento dos requisitos, nas seguintes hipóteses: I - um único veículo, de propriedade de pessoa com: a) deficiência física severa ou profunda que permita a condução de veículo automotor especificamente adaptado e customizado para sua situação individual. Não obstante, agiu o Poder Público em sentido oposto à normatização protetiva ao condicionar o deferimento da benesse tributária à presença de modificações específicas no veículo da pessoa com deficiência, excetuadas aquelas comercializadas como opcionais de fábrica, criando hipótese de discriminação entre o próprio público portador de deficiência, em flagrante ofensa à isonomia tributária insculpida no artigo 150, II, da Carta Magna. Assim se afirma porque trata de forma diversa contribuintes na mesma situação, ou seja, pessoas portadoras de deficiência que necessitam despender mais recursos com a aquisição obrigatória de modificações do padrão básico do veículo para possibilitar sua condução. Tal discriminação colide com os preceitos da Lei nº 13.146/2015, cuja definição de pessoa com deficiência, no artigo , é ampla e inclui toda pessoa que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.”. Tanto os itens opcionais de fábrica como as demais modificações do veículo são implementos que, por sua finalidade específica no tocante ao condutor PCD, classificam-se como tecnologia assistiva, nos termos do artigo 3º da legislação em comento: Art. 3º Para fins de aplicação desta Lei, consideramse: (...) III - tecnologia assistiva ou ajuda técnica: produtos, equipamentos, dispositivos, recursos, metodologias, estratégias, práticas e serviços que objetivem promover a funcionalidade, relacionada à atividade e à participação da pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida, visando à sua autonomia, independência, qualidade de vida e inclusão social; Igualmente relevantes os artigos 74 e 75, IV, ambos também da Lei de Inclusão da Pessoa com Deficiência: Art. 74. É garantido à pessoa com deficiência acesso a produtos, recursos, estratégias, práticas, processos, métodos e serviços de tecnologia assistiva que maximizem sua autonomia, mobilidade pessoal e qualidade de vida. Art. 75. O poder público desenvolverá plano específico de medidas, a ser renovado em cada período de 4 (quatro) anos, com a finalidade de: (...) IV - eliminar ou reduzir a tributação da cadeia produtiva e de importação de tecnologia assistiva; Nota-se que o ordenamento legal compele o Poder Público à execução de atividades e medidas positivas, inclusive no campo tributário, para promover a inclusão da pessoa com deficiência, removendo barreiras à sua mobilidade e autonomia, sendo esta a finalidade das tecnologias assistivas e cuja classificação independe de sua origem seja direto da fábrica ou adquirida posteriormente/separadamente à compra. Em ambos os casos, trata-se de itens tecnológicos que possibilitam ao condutor (PCD) superar condição limitante à condução, enquadrados na descrição do art. 3º, III, da lei e que possibilitam o uso de veículo próprio pelo condutor portador de deficiência como forma de garantir sua mobilidade plena. Sobre a impossibilidade da discriminação de contribuintes em razão do grau/espécie de sua deficiência, já se posicionou o e. TJ-SP em situação similar: “AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO FISCAL Isenção de IPVA pretendida por portadora de necessidades especiais Veículo a ser conduzido por terceiro Sentença de parcial procedência que merece subsistir Interpretação das normas de isenção que, na espécie, deve ser feita à luz dos princípios da dignidade humana, isonomia e solidariedade Não há como estabelecer discriminação em razão do grau de deficiência física, de modo a excluir o direito à isenção daqueles que dele mais necessitam, por estarem desprovidos da mínima condição de guiar Superveniência da Lei Estadual nº 16.498, de 18 de julho de 2017 Alteração legislativa que se refere exclusivamente ao valor atribuído ao automotor, para aplicação no exercício seguinte, respeitado, destarte, o princípio da anterioridade tributária Reexame necessário não provido.” (TJSP; Remessa Necessária Cível 102XXXX-66.2017.8.26.0562; Relator (a):Paulo Dimas Mascaretti; Órgão Julgador: 8ª Câmara de Direito Público; Foro de Santos -3ª Vara da Fazenda Pública; Data do Julgamento: 25/07/2018; Data de Registro: 25/07/2018). Incorreu, ainda, a inovação legislativa em mácula de natureza formal pela inobservância ao princípio da anterioridade tributária, pois resultou em majoração tributária, ainda que indireta, em virtude da revogação de benefício fiscal anteriormente concedido. Qualquer pretensão de majoração de tributo deve obrigatoriamente observar os princípios constitucionais da anterioridade geral e nonagesimal insculpidos no artigo 150, III, b e c, da Carta Política. Não obstante, a modificação em análise, apesar de constituir clara hipótese de aumento indireto de tributo, infringiu o princípio da anterioridade nonagesimal (art. 150, III, c da CF), eis que a publicação da Lei nº 17.293/2020 ocorreu em 16/10/2020, inocorrendo o decurso de 90 dias entre sua publicação e a ocorrência do fato gerador do IPVA de 2021, verificado no 1º dia de janeiro de cada ano para veículos usados, à luz do artigo , I, da Lei nº 13.296/2008. Sobre o tema, o Pretório Excelso já consolidou entendimento no sentido de que a revogação de benefício fiscal anteriormente concedido equivale à majoração indireta de tributo, tornando necessária a observância ao princípio da anterioridade, tanto geral, quanto nonagesimal: “EMENTA: AGRAVO INTERNO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. JURISPRUDÊNCIA PACIFICADA NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. HIPÓTESE DE NÃO CABIMENTO. RISTF, ART. 332.

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