Página 379 do Diário de Justiça do Estado do Paraná (DJPR) de 12 de Abril de 2017

I - Trata-se de 'habeas corpus', com 'pedido de liminar', impetrado em favor de C. A. S., preso e denunciado nos autos de ação penal sob n.º 000XXXX-25.2016.8.16.0114 pela suposta prática dos crimes capitulados no art. 2.º, § 2º, da Lei 12.85/03 sob a alegação de "constrangimento ilegal", aos argumentos, primeiramente, de que a exordial acusatória é inepta, diante da ausência de indícios que revelem o efetivo envolvimento do paciente com a organização criminosa sob investigação. Diz o impetrante, em apertada síntese, que C. A. S. não é mencionado em nenhuma das interceptações telefônicas, salvo em uma na qual os supostos integrantes da organização criminosa responsáveis pelo cometimento do roubo na Fazenda Safira contataram a sua companheira e a orientaram a falar com a irmã do paciente para que esta não reconhecesse os demais envolvidos, sob pena de o paciente vir a ser prejudicado ao ser indicado como indivíduo que repassou as informações para o cometimento deste roubo. Sustenta que o paciente não é mencionado em nenhuma outra ligação e que, por ocasião do cumprimento do 'mandado de busca e apreensão', nenhum objeto que pudesse ligá-lo ao cometimento dos fatos foi encontrado em sua residência. Afirma, ainda, que a denúncia descreve o seu envolvimento de forma genérica e superficial, sendo, também por esse motivo, inepta. Destaca, por outro lado, que a prisão é nula, porque amparada por elementos colhidos por intermédio de investigação conduzida pela Polícia Militar, que não teria a atribuição de polícia judiciária, reservada à Polícia Civil. Assevera, finalmente, que está configurado "constrangimento ilegal" por "excesso de prazo", pois o paciente se encontra preso há quase 200 dias sem que tenha sido designada data para a realização da audiência de instrução e julgamento. Vieram-me conclusos. II - LIMINAR INDEFERIDA. A pretensão do impetrante não tem como prosperar pela via eleita, não apenas porque o habeas corpus não se presta a ampla e aprofundada incursão na seara probatória (tal como pretende o impetrante ao discutir, em detalhes, os elementos colhidos na fase investigativa que deram supedâneo à formação da opinio delicit), mas porque a presente discussão, sob o enfoque da suposta ausência de indícios de autoria, já foi amplamente examinado por ocasião do julgamento do habeas corpus n.º 1582988-2, cuja ordem foi denegada por decisão unânime desta C. 4.ª Câmara Criminal. Por oportuno, transcrevo, na parte em que interessa, o que constou do voto de minha relatoria nesse ponto em particular: "Consta que, no curso das investigações, chegaram ao conhecimento da autoridade policial novas informações a respeito do cometimento de um crime de roubo no município de Tibagi, em 26.06.16, nas dependências da"Fazenda Safira", situada na região do Distrito de Caetano Mendes. É dos autos que a vítima, Carla Kátia dos Santos, se dirigiu à Delegacia de Polícia e, no dia 27.06.16, noticiou o roubo ao registrar o Boletim de Ocorrência n.º 2016/661011, informando que, tão logo chegou em sua residência, se deparou com diversos de seus pertences espalhados pela casa e com seis indivíduos, armados, que a questionaram em relação ao cofre e em relação à localização da residência de seu sogro, também perguntando se neste segundo local haveria algum cofre. Relatou a ofendida que os agentes levaram dois televisores, um trator, uma caminhonete Nissan/Frontier, um notebook, uma motocicleta, aliança de casamento, peças de vestuário, além de documentos pessoais. Finalmente, consta do Boletim de Ocorrência que a vítima relatou ter permanecido presa no banheiro da residência até que seu genitor foi até o local por estranhar o fato de suas ligações não estarem sendo atendidas. Isto posto, é imperioso ressaltar que há indícios de autoria que apontam para a prática, pelo paciente, irmão da vítima Carla Kátia dos Santos, daquele roubo cometido na" Fazenda Safira ", sendo descabida, ademais, a alegação de que este não teve envolvimento com os fatos. No que interessa ao presente momento processual, que não exige a aferição de"prova irrefutável", colhese da decisão combatida que as interceptações telefônicas estariam a evidenciar a participação do paciente nos fatos, em especial por conta de uma das ligações, na qual Geraldo Barbosa da Silva, vulgo"Japonês", indicado como líder da quadrilha, conversa com a esposa de"Alemão"e afirma que, caso os demais envolvidos fossem reconhecidos pela vítima (que é irmã do paciente), C. A. S. seria"delatado". Aliás, com o intuito mesmo de averiguar o teor dessas interceptações, solicitei informações complementares à autoridade impetrada, no sentido de esclarecer se as ligações interceptadas nos autos sob n.º 000XXXX-51.2016.8.16.0114 foram degravadas, ou se do conteúdo delas foram elaborados relatórios por escrito pela autoridade policial (com a consequente remessa das cópias respectivas, via 'Mensageiro'). Em resposta, foram encaminhadas pela escrivania do d. Juízo da Comarca de Marilândia do Sul, via correspondência, as mídias contendo os áudios das interceptações. Dentre todas as ligações, a que deu supedâneo à decretação da custódia do paciente, sob o enfoque do fumus comissi delict, é, como enfatizado, uma realizada 21h20min34seg do dia 29.06.16, em que o investigado Geraldo Barbosa da Silva, suposto líder da quadrilha investigada, conversa com a esposa de" Alemão "e a orienta a ligar para a esposa de C. A. S. com o propósito dizer à vítima que não reconheça os demais assaltantes, sob pena de convencer os demais a delatarem o ora paciente. Os impetrantes questionam o teor dessa ligação, afirmando que dela se poderia extrair, no máximo, que Geraldo Barbosa da Silva estaria coagindo a vítima, para que esta não reconhecesse os demais. Entretanto, a ligação interceptada, ao contrário do que querem fazer crer os nobres causídicos, especialmente por serem corroboradas pelo teor das declarações da própria vítima, apontam, sim, para o possível envolvimento de C. A. S. com os fatos. Nesse sentido, transcrevo a ligação em seu inteiro teor:"De 0:00:45 até 0:01:46 relevante. Geraldo - Japonês: chegou um pessoal ali pra, parece que foi a, Cristiano, a irmã dele, não sei quem que foi... Esposa do Alemão: Aham. Geraldo - Japonês: chegou pra reconhecer, só isso aí, se reconhecer molhô, se não reconhecer vai embora entendeu? Esposa do Alemão: não tem nada ainda, não reconheceu? Geraldo - Japonês: não. liga pro Cristiano agora e fala pra ele que se reconhecer os cara vai dar ele lá no papel lá, que foi ele que arrastou os caras, entendeu? Esposa do Alemão: aham, eu vou ver o que eu faço aqui tá, pode deixar. Geraldo - Japonês: fala, fala, fala oh os meninos lá e tal, pá, já joga um papo reto pra ele, fala é o seguinte meu, nem fala que foi eu, entendeu? fala oh, se qualquer coisa lá os caras vai ponhar você também. Esposa do Alemão: tá. Geraldo - Japonês: então liga agora lá pra sua irmã lá e já fala pra ela que não pá, daí nós resolve os negócio aqui, entendeu? nós devolve os negócio lá, fala que daí, fala que os meninos falou que ia devolver os negócio, entendeu? mas liga agora entendeu? Esposa do Alemão: tá, tudo bem, então beleza, então depois nós conversamos tá? Geraldo - Japonês: tchau. Esposa do Alemão: tchau. (fazenda ortigueira)"Vê-se, com efeito, que Geraldo Barbosa da Silva foi muito claro ao orientar a esposa de"Alemão"a entrar em contato com a esposa de C. A. S., a fim de convencer a vítima, de alguma maneira, a não efetivar o reconhecimento dos assaltantes. Nesse ponto, Geraldo é muito claro ao dizer que C. A. S." arrastou "os demais envolvidos, fazendo clara alusão à participação deste nos fatos na condição de mentor intelectual. Há, ainda, uma segunda ligação, realizada em 29.06.16, às 23h08min09seg, na qual Geraldo Barbosa da Silva e a esposa de" Alemão "conversam e enfatizam que, a despeito das tentativas de contato C. A. S. não atendeu as ligações. Mas o conteúdo dessas ligações não é elemento isolado no contexto das informações até o momento apuradas. Ao contrário, vê-se que a vítima, ao ser ouvida, na fase investigativa, pela autoridade policial, declarou expressamente que, tão logo chegou em sua residência, viu que a casa estava ocupada por diversos indivíduos, os quais não apenas demonstram que tinham conhecimento de informações pessoais a seu respeito (tanto que a questionaram a respeito da localização da residência de seu sogro), mas, para sua surpresa, pareciam saber que, naquele dia em particular, ela não estaria em casa. A propósito dessa discussão, é das investigações que um dos assaltantes questionou a vítima, indagando do motivo pelo qual ela já estava no local, informação digna de nota justamente porque a vítima estava em uma festa e resolveu retornar para casa mais cedo. Portanto, as investigações, ao menos até o momento, dão a saber que os indivíduos que assaltaram a casa de Carla Kátia dos Santos teriam sido instruídos a invadir a residência naquela data porque a vítima, ao menos em princípio, não estaria lá. Destarte, malgrado o teor da argumentação deduzida na peça inaugural, é inegável que os agentes dispunham de informações muito específicas que, por certo, não poderiam ser de conhecimento de uma pessoa que não tivesse relação próxima com a vítima, a ponto de saber que esta, em determinado dia e horárioo, estaria em uma festa. E, ao lado dessa informação, a ligação interceptada relaciona diretamente o paciente, irmão da vítima, com o roubo praticado, não havendo que se falar, portanto, na ausência de demonstração de suficientes indícios de autoria." (TJPR - IV CCr - HC Crime 1582988-2 - Rel.: Sônia Regina de Castro - Julg.: 03/11/2016 - Unânime - Pub.: 21/11/2016 - DJ 1925) O impetrante, a bem da verdade, nada trouxe de novo a respeito dos fatos, reiterando alegações que já foram objeto de consideração quando do julgamento do writ anteriormente impetrado em favor do ora paciente. Nesse sentido, forçoso reconhecer não apenas que a denúncia descreve os fatos imputados ao paciente com clareza e objetividade, respeitando, portanto, as disposições do art. 41 do Código de Processo Penal, mas que a alegação de ausência de indícios de autoria caracteriza não mais do que mera reiteração de pedido, não merecendo, portanto, acolhimento. De lado esse ponto, é descabida a alegação de que a prisão é nula porque derivada de investigações conduzidas pela Polícia Militar ("Operação Caminhão de Areia"). Nesse sentido, entende o STJ não apenas que a "constitucional definição da atribuição de polícia judiciária às polícias civil e federal não torna nula a colheita de indícios probatórios por outras fontes de investigação criminal" (HC 343.737/ SC, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 18/08/2016, DJe 29/08/2016), mas que a "Constituição da República diferencia as funções de polícia judiciária e de polícia investigativa, sendo que apenas a primeira foi conferida com exclusividade à polícia federal e à polícia civil, evidenciando a legalidade de investigações realizadas pela polícia militar" (HC 287.706/SC, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 09/12/2014, DJe 19/12/2014). Ainda nesse sentido: "Diversamente do que se tem procurado sustentar, como resulta da letra do seu artigo 144, a Constituição da República não fez da investigação criminal uma função exclusiva da Polícia, restringindo-se, como se restringiu, tão-somente a fazer exclusivo, sim, da Polícia Federal o exercício da função de polícia judiciária da União (parágrafo 1º, inciso IV). Essa função de polícia judiciária - qual seja, a de auxiliar do Poder Judiciário -, não se identifica com a função investigatória, isto é, a de apurar infrações penais, bem distinguidas no verbo constitucional, como exsurge, entre outras disposições, do preceituado no parágrafo 4º do artigo 144 da Constituição Federal, verbis:"§ 4º às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares."Tal norma constitucional, por fim, define, é certo, as funções das polícias civis, mas sem estabelecer qualquer cláusula de exclusividade."(AgRg no REsp 887.240/MG, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, SEXTA TURMA, julgado em 26/04/2007, DJ 25/06/2007, p. 326) De resto, não há que se falar em"constrangimento ilegal"por"excesso de prazo". O lapso temporal, estipulado pela jurisprudência como adequado para o término da instrução, não é absoluto e, tampouco, deve ser considerado sob a mera perspectiva da soma aritmética dos prazos destinados para a prática de cada ato processual, impendendo relevar, nesse cômputo, em respeito ao princípio da razoabilidade, os percalços enfrentados pelo Juiz na condução do processo. No caso dos autos, verifica-se não apenas que o d. Juízo, na condução do feito, não agiu de maneira desidiosa, tendo dado cumprimento a todos atos necessários para o correto processamento da ação penal, mas que as peculiaridades do feito mais do que justificam a demora, considerando-se não apenas a quantidade de réus denunciados (o que ensejou inclusive a expedição de cartas precatórias para citação e apresentação de reposta à acusação), mas a complexidade dos fatos sob apuração, que demandaram prévia e extensa investigação (inclusive mediante interceptações telefônicas judicialmente autorizadas). Pelo exposto, indefiro a liminar. Intime-se. III - Considerando a alegação de "excesso de prazo", OFICIE-SE, requisitando do d. Juízo informações em relação ao processamento da ação penal, sobretudo no que respeita à designação de data para a realização da audiência de instrução. Aguarde-se resposta pelo prazo de 48

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