Página 232 da Judicial - 1ª Instância - Capital do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 3 de Novembro de 2019

como os supostos prejuízos decorrentes da reintegração, insistindo-se na má-fé da requerida consubstanciada em manifestação contraditória que, mesmo informando o não funcionamento das máquinas, se negava a restituí-las. Noticiado o julgamento de mérito do Agravo de Instrumento interposto pela requerida tivemos o resultado de provimento da insurgência recursal determinou este Juízo o cumprimento dos comandos de segundo grau, ratificando-se a ordem de restituição das máquinas aos cuidados da requerida. Nos termos expressos na decisão de páginas 315/316 dos autos sinalizou o Juízo no sentido do descabimento de maior dilação probatória impulsionando apenas, aquela altura, o cumprimento dos comandos de segundo grau em matéria de restituição das máquinas controversas em favor da requerida. Mais adiante, comprovado pela autora o cumprimento do comando de segundo grau (páginas 335/337), as partes foram instadas a ofertar manifestação acerca do eventual interesse na produção de prova oral (páginas 361/362), seguindo-se manifestação positiva por parte da autora (páginas 364/367), insurgindo-se a requerida, por seu turno, contra tal dilação probatória (páginas 368/370). Com a rejeição da insurgência veiculada pela requerida (páginas 372/373) efetivamente deferida a produção de prova oral anote-se que em sede de Audiência de Instrução e Julgamento foram colhidos os depoimentos do representante legal da autora e de uma testemunha ouvida como informante (Termo de Audiência de páginas 389/390). Encerrada a fase de instrução, vieram, em seguida, memoriais finais, de parte a parte, cada qual reiterando as teses e os argumentos defendidos em matéria de esbulho possessório. A autora em seus memoriais mencionava ser inadmissível que não se tivesse adquirido e tampouco restituído às máquinas objeto do negócio frustrado por culpa da requerida reiterando a procedência do pedido, sem prejuízo de condenação ao décuplo das custas eis que não recolhidas custas em tempo oportuno (páginas 391/397). Já a requerida em seus memoriais finais reafirmava que em sede de relação de consumo as máquinas teriam sido vendidas com defeitos, não se cumprindo com a garantia do produto, por isso mesmo justa a não restituição dos bens, reclamando-se, mais, de propalados danos materiais que somados atingiam o montante de R$ 3.654.042,85, sendo tal pretensão alvo de demanda autônoma, renovados os protestos pela improcedência do pedido possessório (páginas 398/404). É o relatório do quanto essencial. Decido. Processo em ordem. Inexistem arguições preliminares. Inexistem questões prejudiciais pendentes. No mérito, com cognição plena, sem que se cogite em qualquer medida, desobediência ou inobservância das conclusões sedimentadas no julgamento do Agravo de Instrumento se anuncia o resultado de procedência do pedido possessório formulado pela autora. Em primeiro plano consigne-se que diante de um típico contrato interempresarial firmado entre duas pessoas jurídicas e com claro escopo de incrementar as atividades lucrativas da requerida, não se pode considerar como correta a incidência do Código de Defesa do Consumidor no caso concreto. Neste sentido, veja-se o conceito de contrato de insumo, vínculo intermediário, tão somente parte da cadeia produtiva e lucrativa, sendo esta a situação em foco, por isso mesmo não sujeita a requerida à proteção conferida pela tutela legal consumerista, tal qual apresentado na melhor doutrina por jurista do porte de Fábio Ulhôa Coelho, conceito este adotado por Paula Castello Miguel (Contratos entre Empresas, RT, 2006, p. 77): [...] “o conceito jurídico de insumo não equivale ao conceito econômico. Este autor propõe que ‘se distingam os bens adquiridos pelos empresários para emprego em sua empresa de acordo com a sua estrita indispensabilidade para o correspondente processo produtivo’. Desse modo, seriam insumo, sob o ponto de vista jurídico, as aquisições de bens ou serviços estritamente indispensáveis ao desenvolvimento da atividade econômica explorada pelos empresários, e consumo, as demais”. Dito isto, uma vez afastada a incidência do CDC, prevalecendo, como deve ser, a disciplina legal do artigo 509 do Código Civil, cumpre assinalar o conjunto probatório presente aos autos nos indicava ter sido manifesto o esbulho possessório perpetrado pela requerida em desfavor da autora, constatando-se que não houve mesmo aperfeiçoamento do negócio de compra e venda realizada na modalidade a contento. Afinal, não se pode considerar que o pagamento de parte (ínfima) do preço alcançasse significado de negócio aperfeiçoado, na medida em que a postura contratual adotada pela requerida claramente sinalizava no sentido da protelação e do não interesse na compra do maquinário cuja posse precária lhe fora cedida pela autora. Frise-se que na venda e compra denominada de venda a contento se manifesta uma intenção de adquirir, antes, porém, experimentando a coisa. Há que considerar uma intenção séria de adquirir, com manifestação de vontade expressa em prazo razoável, o que não se viu confirmado na espécie, neste sentido os enfáticos depoimentos prestados pelo representante legal da autora e também pelo depoente ouvido como informante. Com efeito, com a caracterização da venda a contento temos um pacto caracterizado por condição suspensiva, qual seja, aquela condição na qual o pretenso comprador aprecia as qualidades da coisa que lhe foi entregue, ressaltando-se não ser este último, ainda, proprietário, mas, sim, mero titular de um direito eventual que pode ou não ser exercido. E é justamente por conta desta condição de titular de um direito eventual que não se pode compactuar com o comportamento contraditório adotado pela requerida na espécie. Afirma-se ter sido contraditório e reprovável o comportamento da requerida na medida em que, em termos práticos, o que se viu foi uma flagrante postura de inadimplemento que em paralelo a retenção das máquinas trouxe clara negativa de realizar os pagamentos devidos à autora. Tal comportamento atrelado à inércia probatória verificada em matéria de prova oral indica (sim) que houve postura contratual de recusa tácita de confirmação do negócio, tangenciando a má-fé contratual a retenção dos bens sem concomitante adimplemento daquilo que fora pactuado com a autora, sobretudo, quando declarada a natureza de “remessa para demonstração” nas notas ficais relativas às mercadorias (páginas 31/35). E com o devido respeito não se argumente aqui a esta altura que a postura de pagar parte do preço e supostamente investir em reparos indicaria intenção de formalizar o negócio retirando da credora o direito de reintegração na posse direta dos bens que ainda lhe pertencem (páginas 201/250). Isso porque é evidente que, havendo interesse no negócio, deveria ter sido realizado a confirmação do propalado interesse, para a elaboração do contrato de compra e venda, com ao menos início de pagamento do saldo devedor e emissão da nota fiscal de compra e venda, o que não foi feito, inerte a requerida mesmo depois de notificação judicial enviada pela autora (páginas 14/22). Demais disso, não há de se falar em pagamento de “parcela relevante” do preço quando quitado o montante de R$ 30.000,00 em máquinas que valiam originariamente quase dez vezes tal valor. Temos, em verdade, hipótese de venda a contento não aperfeiçoada, eis que não manifestado de maneira inequívoca o agrado pelo pretenso comprador. Mesmo ausente cláusula formal de reserva de domínio não se pode compactuar com situação de flagrante abuso e desrespeito à palavra dada, como que deixando a credora sem a proteção legal da retomada dos bens, não se afigurando razoável que a mesma seja remetida para vias ordinárias para cobrar por uma dívida (que adota como premissa a formalização de um negócio que não caminhou) quando em verdade se lhe mostra mais útil e eficaz retomar o maquinário cedido de maneira provisória em favor da requerida. Por ser assim, bem caracterizado o esbulho possessório (artigo 561, II, do Código de Processo Civil) se entende ser medida de rigor a reintegração da autora na posse direta dos bens em litígio, o que agora se determina como eficácia direta da sentença de mérito, expedindo-se Mandado de Reintegração ou Carta Precatória para o cumprimento da ordem, conforme a localização dos bens, surtindo efeitos tal deliberação decisória, bom ressaltar, somente depois do trânsito em julgado com o que se respeita à necessária segurança jurídica que o caso requer. Opta-se por condicionar os efeitos da ordem de reintegração ao trânsito em julgado de modo a se evitar maior tumulto processual, respeitando-se, ainda, a possível submissão da questão controversa a um novo crivo colegiado em caso de eventual recurso de Apelação que venha a ser interposto pela requerida. Garante-se à autora, ainda, para além da reintegração e como consequência lógica desta ordem o direito obter o reembolso devidamente atualizado (Tabela Prática do TJSP) dos valores gastos com o transporte das mercadorias por conta de todas as idas e vindas dos bens, gastos estes gerados

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