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Administração Pública e Servidores Públicos - Vol. 2 - Ed. 2022

Administração Pública e Servidores Públicos - Vol. 2 - Ed. 2022

Capítulo 6. Fundações

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Sumário:

Fabrício Motta

1. Origem

As fundações são as entidades da Administração Indireta que despertam as maiores controvérsias jurídicas em razão de sua origem, sua crescente presença no direito privado e sua adaptação às peculiaridades do direito público. Em obra na qual são apontadas diversas perplexidades envolvendo a utilização de fundações estatais no contexto de descentralização das atividades da Administração, inclusive com análise do perfil das diversas figuras existentes à época, Homero Senna e Clovis Monteiro informam que a fundação mais antiga do Brasil foi a Fundação Romão de Matos Duarte, antiga Casa dos Expostos, fundada em 1738, e anotam:

“Não é de hoje, porém, que a palavra fundação se reveste de uma espécie de sortilégio, acreditando muitos que ela tem poderes mágicos, sobretudo quando se quer empreender obra de assistência ou filantropia. Já Eça de Queirós, ao traçar o perfil do inolvidável Pacheco, aquêle que se tornou ‘superior e ilustre ùnicamente porque tinha um imenso talento’, não deixou de salientar que êle não deu ao seu país nem uma ideia, nem um livro, nem uma obra, nem uma fundação (...)”. 1

Uma aproximação inicial ao tema específico das fundações estatais pode ser feito a partir do conhecimento de suas feições mais genéricas. Cretella Júnior esclarece que categorias jurídicas “são as formulações genéricas, in abstracto , com as respectivas conotações especiais, ainda não comprometidas com nenhum dos ramos em que se bifurca a ciência jurídica. São as ‘formas puras’ de que fala Stammler, aproveitadas, depois, pelos cultores dos institutos do direito público e do direito privado, para plasmar as espécies consideradas”. 2

A fundação , como categoria jurídica , não pertence exclusivamente ao direito privado nem ao direito público. 3 A categoria contém as ideias nucleares que dão identidade à fundação; revela os aspectos gerais de sua essência que permitem singularizá-la diante de outras categorias igualmente jurídicas. O reconhecimento da categoria geral pelo ordenamento jurídico permite enxergá-la como instituto . Ainda segundo Cretella Júnior, “Instituição jurídica é o conjunto de normas relativas a uma relação jurídica abstratamente considerada, o conjunto de normas coordenadas em direção a um fim comum e as relações que eles visam regular constituem o instituto jurídico. Instituto jurídico é o conjunto de regras de direito que reciprocamente se penetram, a ponto de constituírem um todo orgânico, no qual se compreende uma série indefinida de relações de fato, logo transformadas em relações de direito; tôdas estas relações derivam de um só fato fundamental que não constitui, apenas, a origem e a base do instituto, senão, ainda, o elemento que lhe ordena a organização e o desenvolvimento”. 4

Antes de conhecer e adentrar nas contendas relativas ao instituto jurídico da fundação no ordenamento brasileiro, entretanto, é necessário conhecê-la como categoria jurídica . Conhecer a categoria será essencial para tratar da fundação como instituto do direito administrativo, ou seja, como conjunto de normas relativas que a caracterizam e regem suas relações jurídicas envolvendo atividades da Administração Pública.

É conhecida e antiga a distinção das pessoas jurídicas tendo como base o elemento essencial de sua estrutura: a união de indivíduos é o elemento essencial das corporações (universitas personarum), enquanto o patrimônio vinculado a uma finalidade caracteriza as instituições (universitas bonorum). Francisco Ferrara, em obra clássica, anota que as pessoas corporativas precedem as institucionais e sua origem é tão remota que durante muito tempo a teoria da personalidade jurídica se reduziu à teorização sobre as corporações. O conceito de instituto surge com o direito canônico, o qual delineou um novo tipo de pessoa jurídica: um estabelecimento criado e ordenado de fora, por uma vontade superior, para conseguir um fim. 5

De acordo com o mesmo autor, o direito romano conheceu somente as corporações, mas não as fundações , como pessoas jurídicas, com o sentido que hoje lhes é atribuído. No tempo do Império, existiam as chamadas fundações entre vivos ou mortis causa , mas sempre sob a forma de fundações fiduciárias . Eram disposições em favor de uma cidade ou de um colégio com o encargo de realizar a vontade do fundador; o patrimônio passava para a propriedade do aceitante, que não somente contraía a obrigação pessoal do cumprimento do encargo como garantia muitas vezes sua execução por meio de multas ou cláusulas resolutórias. O sistema assegurava a permanência da vontade do fundador, mas a efetiva execução do encargo permanecia incerta, mesmo com a vigilância do Estado por meio do curator republicae . 6

Na época cristã surgem as primeiras fundações de beneficência e culto, ainda dependentes e confundidas com a personalidade das igrejas. Após o reconhecimento do cristianismo por Constantino, as comunidades eclesiásticas adquirem capacidade privada e lhes é reconhecida a possibilidade de ser titulares de patrimônio e receber doações, legados etc. Em sua origem, os institutos ou patrimônios destinados a fins piedosos eram como um anexo da igreja, não desfrutando de autonomia própria, mas pouco a pouco foram se afirmando com entes em si , ainda que permanecendo sob a vigilância eclesiástica. Posteriormente, a todas as piae causae – especialmente às destinadas a fins religiosos, de educação e beneficência – foram estendidos os privilégios concedidos às igrejas e então se puderam fazer liberalidades para as tais causas, por meio de atos interventivos e atos de última vontade. A partir de então, passou a se admitir a capacidade de aquisição dessas causas pias. Segundo Ferrara, é verossímil acreditar que após o Império Romano essas fundações pias automaticamente adquiriram personalidade jurídica, tornando-se instituições públicas eclesiásticas . 7

Pode-se dizer que até o princípio do século passado o tipo institucional ainda não existia na sistemática do direito. À época, sustentava-se que as fundações estavam contidas na personalidade do Estado em razão de suas finalidades assistenciais, não lhes sendo reconhecida personalidade jurídica própria: eram consideradas instituições administrativas, derivações públicas da administração estatal. Segundo Ferrara, em 1808 Heise chamou a atenção dos estudiosos para a limitação dessa classificação que contemplava somente as corporações e propôs que o substrato da pessoa jurídica poderia ser formado por homens ou por coisas . Nessa classificação inicial, dentre as pessoas cujo substrato residia nas coisas estavam compreendidos: a) fundos (em servidões prediais em todo o patrimônio de uma pessoa; Fisco e herança jacente); ou b) uma massa de bens destinada a um fim: fundações. Os juristas posteriores começaram a elaborar a classificação para que gradualmente se chegasse à divisão atual, entre corporações e fundações, que desde então se tornou fundamental. 8

A perspectiva histórica é interessante para tornar ainda mais controvertida a categoria jurídica da fundação: surgiu como entidade ligada ao Estado – em razão dos laços deste com as instituições da Igreja – mas se consolidou e desenvolveu nos domínios do direito privado. Cotrim Neto chega a afirmar que a fundação emergiu para o sistema jurídico como entidade de direito público. 9

A possibilidade de criação de fundações pelo Estado – chamadas, doravante, de fundações estatais – é reconhecida de longa data pela doutrina brasileira, tendo sido comum sua constituição para instrução pública superior e secundária. Talvez a primeira fundação instituída pelo Estado tenha sido a Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, criada pela União e transferida ao Estado de São Paulo ainda durante o Império. 10 Sérgio de Andreia Ferreira, em obra monográfica, anota que a partir da década de 1940 começaram a surgir diversas fundações estatais de direito privado. 11

2. …

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23 de Maio de 2024
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/doutrina/secao/1-origem-capitulo-6-fundacoes-administracao-publica-e-servidores-publicos-vol-2-ed-2022/1712827731