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Confisco Alargado de Bens

Confisco Alargado de Bens

4. Uma Perspectiva da Análise Econômica do Direito Através da Densidade Jurídica do Adágio “O Crime Não Compensa” E o Prejuízo ao Desenvolvimento Econômico

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É aceitável afirmar que o progresso no estudo das teorias econômicas da criminalidade proporcionou uma renovada análise sobre políticas criminais, as quais passam a ter um elemento norteador: benefícios econômicos como incentivo para delinquir e uma “delincuencia caracterizada por sus elevadas cotas de racionalidad instrumental, como son los casos de la criminalidad económica e organizada1 .

Nesse sentido, os aparatos organizados de poder ilegal têm buscado, a cada etapa da transformação econômica e tecnológica, novas adaptações e modelos de práticas ilícitas no intuito de superar o aparato Estatal de repressão. Como os mecanismos tecnológicos estão em constante evolução, é crucial uma mudança de padrões sobre o tema. Há que se combater a prática de crimes econômicos através da transformação do senso comum: “O crime não deve compensar”.

Neste contexto, o “calcanhar de Aquiles” destes grupos criminosos situa-se no aspecto fazendário da organização, vale dizer: a sua sustentabilidade está ligada diretamente à possibilidade efetiva de lucrar, bem como no aporte financeiro às novas formas de delinquir – esta é a regra vital das organizações criminosas.

A finalidade precípua da associação de indivíduos, reunidos para praticar crimes, é a obtenção de vantagens de caráter econômico mediante condutas contrárias ao mercado e às regras do Direito. A consumação da conduta típica eleita – aqui poderíamos citar, dentre outras, o tráfico de pessoas, de estupefacientes e drogas afins, a lavagem de dinheiro e a organização criminosa – não é, em efeito, o objetivo final desta associação, senão simples móvel à almejada obtenção de lucro e de fácil enriquecimento.

Em assim sendo, a questão não deve ser combatida simplesmente através de mecanismos voltados, tão somente, a obstar a consumação da ação típica praticada. É necessário ir além. Na explanação de MORO, 2 “o que é essencial é privar o criminoso dos ganhos decorrentes de sua atividade, ou seja, confiscar o produto do crime. É a consagração do velho adágio de que ‘o crime não deve compensar’”.

Para este propósito, o arcabouço legal dispõe do artigo 91 do Código Penal, a título de efeito extrapenal da sentença condenatória, entretanto, revela-se insuficiente e pouco pragmático.

A experiência tem mostrado que esses efeitos penais não têm a dimensão e o alcance que se busca na prevenção e na repressão a esse tipo de criminalidade.

Afora o desaparelhamento brasileiro no que toca às medidas sancionatórias de caráter patrimonial, há de se incluir nesta análise a incontroversa falência da pena corporal como medida de desestímulo à prática dos mais diversos crimes. 3

Neste sentido, se tal assertiva é verdadeira quando se está a falar de crimes ditos tradicionais ou clássicos, muito mais verdade transmite, pois, quando relacionada à criminalidade econômica.

É inquestionável que o homem, como ser livre, dotado de personalidade e de livre arbítrio, encara o crime como um fenômeno social, uma auto-gratificação indesejada pela sociedade. Ao passo que a sociedade procura coibir a prática criminal com instrumentos que privam a liberdade de seus infratores, seja mediante aparelhos preventivos ou repressivos, no intuito de manter a paz social do próprio Estado, denota-se que o crime, por ser uma forma de auto-gratificação para o autor, é consequentemente uma forma de compensação, isto é, ninguém pratica um delito econômico, sem antes, elaborar intelectualmente as possibilidades de ganhos em contraposição com as possibilidades efetivas de perda - privação de liberdade. Não há delito patrimonial e/ou econômico sem motivação 4 .

Este raciocínio criminal, inicialmente demonstrado pelo nobel de economia de 1992, GARY BECKER 5 , tem revelado experiências que fogem a sua regra – possibilidade de ganho com possibilidade de prisão –, especialmente por três elementos: O primeiro e mais corriqueiro está no elevado índice de impunidade, ou seja, o grau ou a possibilidade de ser preso é muito menor que os ganhos/compensação com o crime. O segundo elemento guarda relação direta com a psicologia, ou seja, é uma ligação psicológica entre o autor do delito e sua satisfação pessoal, sendo que esta atinge um grau muitíssimo elevado em relação a eventual cominação penal, sendo totalmente incapaz de desmotivá-lo. Por derradeiro, há casos em que o agente infrator elabora uma análise diferente do Estado no que se refere a “regra” compensação versus possibilidade de prisão 6 .

Nesta visão a pena passa a funcionar como um custo para o próprio Estado.

A especificidade deste elemento em relação aos outros está exatamente no poder que o Estado tem em suas mãos, isto é, o Estado tem a disponibilidade de eliminar este benefício sem depender de elementos outros ligados ao infrator.

É aqui que o conteúdo do tema passa a demonstrar interesse, justamente porque a perda das vantagens, eventualmente trazidas pelo crime, deve estar ligada ao adágio “o crime não compensa” o qual passa a ter um conteúdo eminentemente normativo e valorativo: “o crime não deve compensar” 7 .

MORO 8 , em reflexão sobre o tema, entendeu que privar o delinquente do proveito da atividade criminosa tem mais resultados significativos, em termos de política criminal, do que, simplesmente, privá-lo da liberdade.

Logicamente que não se está pretendendo mudar o foco da proteção de bens jurídicos incessantemente buscados pela norma penal, tampouco macular as garantias individuais proporcionadas pelo direito penal e processual penal em substituição a perda de bens, mas sim colocar em evidência a, perfeitamente possível, coexistência entre estas duas categorias: a perda de bens e as garantias constitucionais em prol do reforço às novas categorias jurídicas e espécies de perda de bens.

Busca-se, dissuadir 9 o infrator com a seguinte premissa: a probabilidade de auferir lucros com a atividade ilegal é menor, menos vantajosa, quando comparada à perda patrimonial consequente, isto é, o conceito que deve nortear o criminoso econômico não deve ser somente a pena privativa de liberdade, mas aliada a esta, a efetividade da perda patrimonial, o confisco.

Portanto, não se propõe, neste novo cenário de combate à criminalidade econômica, reditícia 10 e transnacional, o desligamento da pena privativa de liberdade.

Na verdade, ela precisa estar ao lado da medida patrimonial, notadamente para estancar os benefícios trazidos pelo crime e impedindo novos investimentos a outras modalidades criminosas.

A nova política criminal que pretende fazer frente à criminalidade reditícia, deve se pautar, necessariamente, pelo confisco dos instrumentos, produtos e vantagens do crime, além, essencialmente, de buscar a perda daqueles bens que, apesar de estarem na posse do sujeito, não têm sua origem lícita por ele comprovada, vale dizer: um confisco, também, de bens presumíveis oriundos de atividades ilícitas.

Logicamente que este novo padrão necessita de uma construção jurídica adequada, já que a convivência com as liberdades constitucionais não pode ser deixada em segundo plano, pelo contrário, ela deve ser o norte de todo o desenvolvimento do pesquisador.

Nesse sentido, não é aceitável que o sistema penal puna determinadas condutas como fatos típicos e ilícitos e ao mesmo tempo faça “vista grossa” para a arrecadação, conservação e gozo das vantagens deste crime – as duas questões agora (penal e perda patrimonial), faz parte do mesmo problema 11 .

Portanto, a comprovação para a sociedade de que o crime econômico não compensa está ligada diretamente a efetividade que esta mesma sociedade dá a perda dos bens provenientes do crime.

Assim, a medida de perda de bens que se propõe nesta pesquisa, de um modo geral, deve-se pautar necessariamente por dois objetivos, um de natureza preventiva e outro de correção, isto é: anular os benefícios econômicos do crime e colocar o condenado na situação patrimonial anterior à sua prática, reforçando a noção predominante da sua natureza jurídica, qual seja: preventiva – demonstrando ao autor que a prática de crimes não é a modalidade de acumular patrimônio, bem como de reafirmar o valor da norma penal perante toda a comunidade.

É importante que se consigne que a proposta deste estudo não está atrelada ao confisco de bens através das lentes da retribuição ou de pena acessória.

Entendemos que não se trata apenas de impor uma pena em decorrência da prática de uma conduta típica, mas sim o corrigir através da perda de um patrimônio ilegítimo ao investigado, isto é, não se está em discussão aquilo que o arguido possui legitimamente, licitamente, mas sim os bens, valores, produtos e proveitos da atividade criminosa, bem como aqueles que ele detém sem comprovação de origem lícita, os quais ele (enquanto investigado) não pode ter pelo simples fato de que nunca lhe pertenceu.

Trata-se, objetivamente, de retornar ao status quo anterior à prática ilícita que lhe propiciou a construção daquele patrimônio ilegítimo 12 .

Neste momento, surge para esta pesquisa uma necessidade de abertura para outras concepções, não somente aquelas vinculadas à dogmática penal ou processual penal. Mais que isso: é importante a tentativa de demonstrar que a proposta que se pretende expor atingirá, de maneira eficaz, seus objetivos.

Para isso, a …

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17 de Junho de 2024
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/doutrina/secao/4-uma-perspectiva-da-analise-economica-do-direito-atraves-da-densidade-juridica-do-adagio-o-crime-nao-compensa-e-o-prejuizo-ao-desenvolvimento-economico/1279986289