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17 de Junho de 2024
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    Aborto como direito humano

    Publicado por Justificando
    há 6 anos

    O Brasil é um país conservador que vem de uma tradição religiosa que não separava Estado da Igreja, e ainda não separa, não somente o Brasil, mas todos os países da América Latina e Caribe. E falar de aborto sempre foi e sempre será um tabu, afinal não se quer dialogar sobre o direito das mulheres, mas sim sobre corpos femininos como depósitos de espermas e de bebês, simplesmente incubadoras para servir aos homens e ao moralismo. Aborto para a sociedade não é crime e sim pecado, mas como podemos viver num estado dito laico onde valores religiosos falam mais alto do que direitos humanos?

    Falar sobre sexo, sexualidade, orientação sexual, identidade de gênero é algo entendido como estimulo, “ideologia de gênero”, menos como formação inclusive para prevenir abusos e violações, afinal conhecer o corpo é fundamental para uma vida saudável. É importante lembrar que por anos sexo tinha como objetivo somente a reprodução, hoje, além disso, é também para satisfação do prazer e quando mulheres querem sentir prazer são acusadas de promiscuas, pecadoras, mas quando homens satisfazem seu prazer, inclusive estimulados desde a infância, são elogiados e motivados a serem cada vez mais “pegadores”.

    No Brasil está presente no Código Penal1 possibilidades de Aborto Legal e mais recentemente foi aprovado o direito de aborto legal em caso de fetos anencéfalos conquistado por decisão do STF no ano de 20122. Seguem os casos em que não serão punidos:

    Todavia a Bancada Fundamentalista presente no Congresso Nacional tem planejado a retirada de direitos das mulheres, como foram projetos como Estatuto do Nascituro, PEC 181 e Projeto de Lei 5069/2013.

    O texto original do Projeto de Lei 5069/20133 de Eduardo Cunha falava sobre detenção a toda pessoa, inclusive profissionais de saúde, que orientasse uma mulher quanto aos procedimentos seguros para a prática do aborto. Entretanto as emendas realizadas pelo deputado Evandro Gussi do PV, piorou o projeto e mesmo após a Lei 12.845/20134 sancionada para garantir a obrigatoriedade do SUS em atender de forma integral vitimas de violência sexual, sugerindo a desobrigatoriedade de profilaxia em caso de estupro e retomando a necessidade de corpo de delito para que a mulher comprove a violência sofrida.

    No artigo 13 no referido projeto de lei diz:

    À proposição principal, foram apensados os seguintes projetos:

    Dentro da trajetória legislativa mais recente surge a PEC 1816 que inicialmente propõe tratar sobre licença maternidade para bebês prematuros, mas vira um cavalo de troia e se torna uma Proposta de Emenda Constitucional que visa falar sobre concepção de vida, entendendo que a vida começa com o coito e dessa forma até pílula do dia seguinte seria considerado aborto. O mais assustador dessa PEC foi não somente a proibição de toda forma de aborto, inclusive os legais, mas principalmente por ter sido votado por 18 (dezoito) homens votando contra os direitos das mulheres e a favor da PEC, tendo apenas 1 (uma) mulher que votou contra a PEC e pelo direitos das mulheres.

    Há um mito terrível que se ecoa de que descriminalizar o aborto irá banalizar o aborto, como se fosse algo prazeroso para as mulheres, países que descriminalizaram como o Uruguai mostra que na verdade é o contrário, antes da houve diminuição de cerca de 30% de abortos, o que acontece com a descriminalização é a abertura a discussão e possibilidade de pesquisa para garantir que as mulheres tem cada vez mais tranquilidade de realizar o procedimento sem que corram risco de morte.

    Em 2016 um caso foi levado a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, que proferiu decisão no dia 29/11/2016 entendendo que a criminalização do aborto até o terceiro mês de gestação fere os direitos fundamentais da mulher. O voto foi apresentado pelo ministro Luís Roberto Barroso, seguido pelos ministros Rosa Weber e Edson Fachin10. Atualmente está em curso uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental sob número 442 de autoria do Partido Socialismo e Liberdade para que o aborto seja descriminalizado abortos realizados até 12 (doze) semanas. A proposta de ADPF11 surge a partir da citada decisão de Barroso com a fundamentação da pesquisa do Instituto Anis, instituto dirigido pela antropóloga e professora de Direito da Universidade Nacional de Brasília Débora Diniz que está sofrendo duras criticas e ameaças em razão de seu ativismo.

    Quero terminar esse texto deixando uma pesquisa realizada pelo site Catraca Livre12 com 8 (oito) dados assustadores sobre aborto no Brasil e convido a reflexão se mantiver como crime vai impedir que mulheres façam? Não vai, o que podemos e devemos fazer é garantir que mulheres não morram em razão da prática clandestina de aborto.

    1. A cada dois dias, uma mulher morre vítima de aborto inseguro no Brasil. Todos os anos, ocorrem 1 milhão de abortos clandestinos.

    2. São 250 mil internações no SUS (Sistema Único de Saúde) e R$ 142 milhões gastos por causa de complicações pós-aborto.

    3. Uma em cada cinco mulheres até os 40 anos já abortaram no país, segundo a Pesquisa Nacional do Aborto, desenvolvida pela Anis – Instituto de Bioética.

    4. As mulheres que abortam são, em geral, casadas, já têm filhos e 88% delas se declaram católicas, evangélicas, protestantes ou espíritas.

    5. Cerca de 20 milhões dos abortos são realizados no mundo de forma insegura todos os anos, resultando na morte de 70 mil mulheres, sobretudo em países pobres e com legislações restritivas ao aborto.

    6. 97% dos abortos clandestinos ocorrem em países em desenvolvimento. Ao mesmo tempo, 80% dos países desenvolvidos permitem o procedimento.

    7. Uma pesquisa da Organização Mundial da Saúde e do Instituto Guttmacher (EUA), publicada em 2016, demonstrou que nos países em que o aborto é proibido o número de procedimentos não é menor do que em lugares onde é legalizado.

    8. Em 2007, Portugal autorizou o aborto até as 10 semanas de gestação. Dez anos depois, pesquisa da ONG Associação para o Planejamento da Família mostra que o número de abortos caiu e as mortes decorrentes da prática são quase nulas. Na década de 1970, eram 100 mil abortos, sendo que 2% deles resultavam em morte, enquanto dados de 2008 mostram que o país registrou 18 mil abortos e, hoje, este número está em queda constante.

    VIVAS NOS QUEREMOS!

    Laina Crisóstomo é Advogada feminista, pós graduada em Docência do Ensino Superior, pós graduada em Violência urbana e insegurança, mestranda em Ciências Criminais, presidenta e fundadora da ONG TamoJuntas que presta Assessoria multidisciplinar para mulheres em situação de violência.

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    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/aborto-como-direito-humano/599820069

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