Afinal, quem continua com medo da audiência de custódia? (parte 2)
Dando continuidade à nossa análise acerca da audiência de custódia, vamos tratar hoje do Projeto implantando em São Paulo através do Provimento Conjunto 3/2015, da presidência do Tribunal de Justiça do estado, em conjunto com o Conselho Nacional de Justiça e do Ministério da Justiça.
A iniciativa é muito importante e alinha-se com a necessária convencionalidade que deve guardar o processo penal brasileiro, adequando-se ao disposto no artigo 7.5 da Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH) que determina: “Toda pessoa presa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais e tem o direito de ser julgada em um prazo razoável ou de ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo.”
Em diversos precedentes[1] a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) tem destacado que o controle judicial imediato — que proporciona a audiência de custódia — é um meio idôneo para evitar prisões arbitrárias e ilegais, pois corresponde ao julgador “garantir os direitos do detido, autorizar a adoção de medidas cautelares ou de coerção quando seja estritamente necessária, e procurar, em geral, que se trate o cidadão de maneira coerente com a presunção de inocência”, conforme julgado no caso Acosta Calderón contra Equador.
A Corte Interamericana entendeu que a mera comunicação da prisão ao juiz é insuficiente, na medida em que “o simples conhecimento por parte de um juiz de que uma pessoa está detida não satisfaz essa garantia, já que o detido deve comparecer pessoalmente e render sua declaração ante ao juiz ou autoridade competente”. Nesta linha, o artigo 306 do Código do Processo Penal que estabelece apenas a imediata comunicação ao juiz de que alguém foi detido, bem como a posterior remessa do auto de prisão em flagrante para homologação ou relaxamento, não são suficientes para dar conta do nível de exigência convencional. No Caso Bayarri contra Argentina, a CIDH afirmou que “o juiz deve ouvir pessoalmente o detido e valorar todas as explicações que este lhe proporcione, para decidir se procede a liberação ou manutenção da privação da liberdade” sob pena de “despojar de toda efetividade o controle judicial disposto no artigo 7.5. da Convenção”.
Mas outras duas questões podem ser discutidas à luz do artigo 7.5. A primeira é: o que se entende por “outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais”? A intervenção da autoridade policial, do delegado, daria conta dessa exigência? Entendemos que não.
Primeiro porque o delegado de polícia, no modelo brasileiro, não tem propriamente ‘funções judiciais’. É uma autoridade administrativ...
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