Amazon: o que o consumidor precisa saber sobre o bug do dia 26 de janeiro?
Por Fernando Antônio Oliveira[1] e Mariana Nascimento Silveira[2]
Na manhã de quarta-feira, 26/01/2022, os usuários de plataformas como Twitter e Instagram foram completamente surpreendidos por relatos de compradores que adquiriram, naquela madrugada, inúmeros produtos de forma gratuita no site da Amazon.
O que parecia mais uma das várias ações anuais com promoções de livros de graças acabou se tornando um transtorno aos consumidores que utilizaram os cupons disponibilizados na plataforma.
De fato, os cupons que eram aplicáveis de forma cumulativa foram resultado de um “bug” (erro) na plataforma, quando a intenção do marketplace era liberar de forma separada cupons de R$15,00 (quinze reais) para serem aplicados em produtos acima de R$30,00 (trinta reais), de forma única e não cumulativa.
Contudo, como o erro, inúmeras pessoas fizeram compras de aparelhos, livros, entre outros, em valores de até R$500,00 (quinhentos reais), com aplicação de vários cupons em uma mesma compra. O que mais surpreende é o tempo pelo qual o bug ficou vigente: 09 (nove) horas.
Após alguns relatos de compradores que receberam seus pedidos, a Amazon iniciou um processo de “contingenciamento” e cancelou inúmeros pedidos realizados com a utilização dos cupons.
Desta forma, com os cancelamentos, o Procon foi acionado e a Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor de São Paulo (Procon-SP) notificou a Amazon na última quinta-feira para apresentar esclarecimentos pelos cancelamentos.
Nos termos do Código de Defesa do Consumidor, é vedado ao fornecedor se negar a cumprir a oferta, o que é plenamente aplicável no caso da utilização dos cupons para os compradores (art. 35), assim como não é possível o rompimento unilateral por parte do prestador do contrato de compra e venda (art. 51).
São exceções às situações expostas os casos de erro nítido e má-fé do consumidor. O erro nítido seria aquele que é identificável como grosseiro, ou seja, seria a oferta de um produto por um preço em muito inferior ao preço original à época. Já a má-fé do consumidor seria, por exemplo, para além do aproveitamento de promoções que se enquadram como erro grosseiro do Fornecedor, a abertura de contas para se multiplicar a sua utilização. Ambas as exceções não foram verificadas até o presente momento, neste caso envolvendo a Amazon.
A boa-fé dos compradores parece clara, na medida em que a Amazon costuma realizar ofertas como a que erroneamente foi disponibilizada, como para objetos literários com promoções de livros gratuitos anteriormente realizadas, sempre de madrugada.
A empresa se defendeu, primeiramente relatando que foi um erro rapidamente corrigido, alegação esta que também é afastada pelo prazo de nove horas pelo qual foi possível utilizar os cupons para a realização das compras.
Por outro lado, a boa-fé por parte da Amazon é afastada pela observância de cancelamentos de compras a partir do dia 27 de janeiro, ao passo que várias pessoas que residem nas capitais já haviam recebidos seus produtos.
A política deveria ser igualitária a todos os usuários da plataforma e não realizar distintamente o cancelamento dos pedidos um dia após a ocorrência do bug.
Ainda, há relatos de consumidores que tiveram as compras retiradas de seus históricos, tendo somente recebido um e-mail de cancelamento não constando qualquer menção aos objetos (ou seja, e-mail genérico).
Portanto, fica evidente que houve um descaso com o ocorrido, equiparando-se ao caso PayPal, pois estamos diante de quatro práticas contrárias ao Código de Defesa do Consumidor: propaganda enganosa, descumprimento de oferta, violação da boa-fé objetiva e prática abusiva.
Porém, contrariamente ao caso Paypal, a Amazon deixou os cupons ativos por tempo muito superior – quase o dobro –, assim como não cancelou todos os pedidos, mas somente alguns que foram identificados e cancelados muito posteriormente à sua realização – alguns, inclusive, já entregues aos consumidores.
Na espera pelos desdobramentos, aguarda-se as justificativas a serem apresentadas pela Amazon ao Procon. Mas, estaremos diante de uma aplicação de multa apenas? Ou observaremos medidas para a tutela dos direitos dos consumidores, com a obrigação de manutenção das entregas?
De qualquer forma, demonstrada a questão jurídica aqui estabelecida e guardadas as casuísticas exceções, parece patente o cabimento da reparação aos consumidores pelos prejuízos sofridos, seja pela tutela específica (pedido de cumprimento da oferta), ou pela indenização por perdas e danos, inclusive danos morais pela experiência frustrada com as compras canceladas, bem como pelo não recebimento das mesmas e o tratamento desigual imposto.
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[1]Advogado sócio de Andrade Chamas, graduado e mestre em Processo Civil pela Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FDRP-USP) e professor de Pós-Graduação em Processo Civil. fernando@andradechamas.com.br
[1] Advogada associada de Andrade Chamas, graduada e mestranda em Direito Antitruste pela Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FDRP-USP) e Pós-Graduada em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET-SP). mariana@andradechamas.com.br
1 Comentário
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Bom dia!
Ótima exposição do ocorrido, bem como dos fatos e argumentos apresentados. Entretanto discordo de somente 1 ponto da sua colocação.
Quando fala da Boa-Fé, por parte dos consumidores, existe a necessidade de compreensão e expectativa do ordenamento que rege o site da Amazon, bem como seu regramento dos cupons ofertados, visto que, conforme relatado, são comuns...
Ocorre que, diferentemente daquilo que costuma ocorrer nas madrugadas, o caso em tela trata-se de acumulo de cupons de desconto, podendo utilizar-se de diversos cupons em 1 única compra, diferente do que ocorre usualmente, onde cupons com altos descontos são publicados, porém sem a possibilidade de utilização a maior.
Dessa forma, nota-se que diverge a situação e, com isso, existe sim a possibilidade da má-fé por parte do Consumidor quando, ao notar o acumulo desproporcional (algo nunca antes visto) aproveita-se do ocorrido para fazer diversas compras de valor alto (R$500 ~R$600) pagando o mínimo, se não nada, conforme visualizado em alguns casos, onde a compra final deu R$00,00
Não obstante, temos ainda as regras que dispõe a utilização dos cupons ofertados nos sites da Amazon, onde é clara a exposição de que os cupons NÂO acumulam na compra, podendo ser utilizado somente 1 cupom por compra. Diga-se de passagem, o regramento é claro e de fácil acesso, entretanto pouco visualizado.
Diante disso, discordo da colocação:
"A boa-fé dos compradores parece clara..."
Visto que, na minha visão, resta clara a má-fé dos compradores ao passo em que aproveitam-se de forma exacerbada e equivocada dos cupons.
Ainda que isso comprove-se, creio que o Procon optara por uma multa, já que sua proteção sempre recairá sobre os consumidores, por mais vil que seja o pensamento desses.
Forte Abraço! continuar lendo