Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
27 de Maio de 2024
    Adicione tópicos

    Artigo: Os sem cérebro - Luiz Garcia

    Publicado por OAB - Rio de Janeiro
    há 13 anos

    Os sem cérebro

    Luiz Garcia*

    Um feto sem cérebro não sobrevive; quase sempre morre umas poucas horas depois do parto. No Brasil, e, com certeza, na maioria dos países razoavelmente civilizados, o aborto nesses casos é quase sempre autorizado pela Justiça, mesmo que a anencefalia não esteja na relação de abortos justificados pelo Código Penal.

    A questão está para ser decidida pelo Supremo Tribunal Federal, e o resultado é duvidoso. Sete anos atrás, uma liminar do ministro Março Aurélio Mello, a favor do aborto, foi derrubada por sete votos contra quatro. Hoje, a interrupção da gravidez tem, se vale o precedente, quatro votos garantidos contra três. Os entendidos em STF não arriscam previsão sobre a posição dos outros quatro.

    Seja qual for a decisão da Justiça, a questão pode ter uma utilidade: a difusão de informações sobre a anencefalia. Ela ocorre em um caso por mil, e não representa risco para a saúde da mãe. Sua causa é desconhecida, mas alguns especialistas sustentam que a ingestão de ácido fólico durante a gravidez pode evitar cerca de metade dos casos. Se houver o diagnóstico, um juiz pode autorizar o aborto. Os fetos, que não têm calota craniana, visão ou audição, vivem por pouco tempo: cerca de 25% morrem no parto, metade resiste de alguns minutos a uma hora e 25% resistem alguns dias.

    Num quadro como esse, que não inclui a mais remota possibilidade de sobrevivência e no qual o sofrimento da mãe é o que se pode imaginar, fica difícil concordar com quem não inclui a anencefalia na curta lista de motivos aceitáveis para o aborto. O Código Penal o permite quando houve estupro ou existe risco de vida para a mãe. Não custa lembrar, a propósito, que o filho nascido de um estupro pode ser uma pessoa inteiramente normal. E que o direito da mãe ao aborto não costuma fazer qualquer diferença para o criminoso autor da violência contra ela.

    Enquanto o STF não chega a uma decisão sobre o direito ao aborto dos fetos sem cérebro e sem futuro, juízes e tribunais estaduais têm decidido por conta própria - e na maioria dos casos o aborto é permitido. Inclusive com um argumento pelo menos curioso: o de que a Constituição assegura o direito à vida dos recém-nascidos, o que os fetos ainda não são.

    Parece ser um sofisma com boa causa, o que não diminui a necessidade de uma decisão definitiva do mais alto tribunal do país.

    Luiz Garcia é jornalista.

    Artigo publicado no jornal O Globo, 28 de junho de 2011.

    • Publicações13410
    • Seguidores221
    Detalhes da publicação
    • Tipo do documentoNotícia
    • Visualizações11
    De onde vêm as informações do Jusbrasil?
    Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/artigo-os-sem-cerebro-luiz-garcia/2753121

    0 Comentários

    Faça um comentário construtivo para esse documento.

    Não use muitas letras maiúsculas, isso denota "GRITAR" ;)