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30 de Maio de 2024
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    Biodireito, bioética e tragédia grega são abordados em palestras no TRT

    O lançamento do livro Direitos e Fundamentos entre Vida e Arte, que aconteceu nesta sexta-feira, no plenário do TRT-MG, foi marcado por duas palestras sobre temas intrigantes. Uma delas, proferida pela juíza Taísa Maria Macena de Lima, versou sobre paradoxos sexuais e os riscos das escolhas envolvendo decisões sobre o corpo e a vida, própria e de outros, diante das infinitas possibilidades da medicina. A outra, do professor Diogo Luna Moreira, tratou do exercício da liberdade na moderna era da biotecnologia, tendo como parâmetro de análise a tragédia grega Édipo-Rei, de Sófocles.

    Os dois palestrantes, juntamente com a professora Maria de Fátima Souza Sá, são coordenadores da obra, uma coletânea de textos de profissionais de diversas áreas, lançada pelo projeto Leis&Letras, da Escola Judicial e da Biblioteca Juiz Cândido Gomes de Freitas, do TRT-MG.

    Em sua palestra, a juíza, que é titular da 20ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, explicou que a discussão sobre a bioética e o biodireito não é uma busca isolada do profissional de Direito, pois pressupõe escolhas que envolvem valores e crenças da humanidade. Afinal, a biotecnologia humana abre as portas até para a criação de clones humanos. E daí surge a questão: quais são os limites que devem ser traçados ao exercício dessas novas possibilidades cientificas, que parecem infinitas? Será que tudo o que é possível é ético e desejável?, questiona.

    Exatamente por isso, segundo a juíza, o diálogo entre filosofia, direito, ciência e arte tornou-se fundamental para o enfrentamento das questões abordadas no livro. Questões essas que vão desde as novas possibilidades de prolongamento da vida - em confronto com a liberdade de escolha do paciente e da reflexão sobre o que é, de fato, o melhor e mais digno para o ser humano - aos métodos de reprodução para escolha de embriões e fornecimento de material genético, entre outras.

    Ao tratar dos paradoxos sexuais, tema desenvolvido em parceria com a professora Maria de Fátima, a palestrante abordou questões ligadas ao hermafroditismo e todo o preconceito e questões jurídicas que perpassam o problema. Tendo como base o filme de produção argentina XXY, que conta a historia de um jovem hermafrodita, a cujos pais foi oferecida a oportunidade de optar por uma cirurgia de definição sexual quando do seu nascimento, a juíza levantou a questão jurídica relativa a quem pertence essa escolha, ou seja, a quem cabe tomar essa decisão envolvendo o corpo de um incapaz. E mesmo quem tem capacidade jurídica pode não ser capaz de tomar decisão envolvendo autonomia corporal, como por exemplo, uma decisão de natureza médica a ser tomada por alguém que sofra de anorexia nervosa.

    Taísa Macena citou ainda o caso da tenista hermafrodita que, por ter altas doses de testosterona no corpo, estava em condição de injusta superioridade sobre suas adversárias. Seria aí um caso de desigualdade de condições, a ser investigada com cautela. Daí a necessária interseção com outros ramos da ciência jurídica e outros saberes, trazida na obra coletiva em lançamento.

    Juízes João Bosco de Barcelos Coura, presidente da Amatra3, e Taísa Macena de Lima, desembargador César Pereira da Silva Machado Júnior, diretor da Escola Judicial, prof. Diogo Luna Moureira e desembargador Márcio Flávio Salem Vidigal (foto: Madson Morais)

    A biotecnologia e um dilema clássico

    Ao trazer a tragédia de Sófocles para o contexto biotecnológico atual, o professor Diogo Luna Moreira, segundo palestrante da tarde, expôs a transfiguração da verdade traduzida na história de um homem que, ao tentar fugir do destino ditado pelo oráculo, segue fatal e tragicamente ao encontro dele. A tragédia representou a construção dos conceitos de auto determinação e reconhecimento que vêm sendo trabalhados pelo Direito atual, justifica o professor.

    Ao ouvir a predição do oráculo de que ele estava destinado a matar o pai e desposar a mãe, Édipo era, naquele momento, livre para redefinir os traços da sua vida. Mas ao tentar fugir desse destino encara-o a toda força, pois foge do lar onde era filho adotivo e acaba encontrando pelo caminho os seus pais biológicos, quando, então, dá-se o próprio evento trágico predito pelo oráculo. Assim, mesmo não sendo um sujeito passivo diante do destino, pois parte em busca de sua identidade perdida, Édipo enfrenta as conseqüências da sua escolha e termina com a cegueira física e psicológica de si mesmo. O agir, segundo o palestrante, evidencia a responsabilidade do personagem sobre as consequências de sua ação.

    Fazendo a contextualização da tragédia com a biotecnologia, Diogo Luna comenta: Hoje, diante dessas novas e infinitas possibilidades da ciência, nos encontramos na situação de Édipo: buscamos vida de qualidade, reconhecimento, perspectivas antes nunca vislumbradas. Podemos buscar esse novo destino, fugir das nossas limitações humanas, mas há possibilidades trágicas no uso indiscriminado das novas tecnologias. Temos que assumir os riscos das conseqüências, ainda desconhecidas, e é preciso saber exercer, ou não, essa liberdade. Temos de discutir o que de fato queremos para a humanidade e devemos ser ponderados no exercício das nossas liberdades atuais, sob pena de ingerência sobre a liberdade das futuras gerações. Porque, do mesmo modo que podemos ser éticos, podemos ser édipos, conclui o palestrante. (Margarida Lages)

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