Caso FonteCindam: MPF recorre de acórdão do TRF1
Para o órgão, as operações financeiras não tiveram o objetivo de regular o mercado cambial e sim socorrer o Banco FonteCindam, causando um prejuízo de R$ 520 milhões ao Banco Central
O Ministério Público Federal (MPF) apresentou embargos de declaração ao próprio Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), destacando omissões e contradições na decisão da Terceira Turma do Tribunal que julgou improcedentes, simultaneamente, três ações populares. As ações pediam a declaração de nulidade das operações de venda de moeda estrangeira no mercado futuro realizadas pelo Banco Central (Bacen) com o Banco FonteCindam, em 1999.
O procurador regional da República Bruno Calabrich relata que as ações populares não foram remetidas em conjunto ao MPF, mas apenas a de nº 1999.34.00.009903-7. Ele questiona o fato de não terem sido analisadas as operações ocorridas em 14 de janeiro de 1999, relacionadas à venda de 7.900 contratos de dólar futuro, ao preço de R$ 1,32 por dólar, que teria causado prejuízo de cerca de R$ 520 milhões ao erário.
Segundo o MPF, o relator do voto ateve-se apenas às operações ocorridas em 11 e 12 de janeiro de 1999. “É indispensável expressa e detida análise quanto ao objeto de cada ação popular, em homenagem à segurança jurídica e em estrita obediência ao princípio da congruência e ao princípio da fundamentação das decisões judiciais”, destacam os embargos de declaração apresentados.
Para o órgão, houve omissão e contradição também quanto à interpretação das disposições da Lei nº 4.595/64 e das resoluções do Conselho Monetário Nacional (CMN) que, de acordo com o MPF, não amparavam nem autorizavam as operações de socorro do Bacen ao Banco FonteCindam e seus fundos de investimentos, ou a qualquer outra instituição financeira, em condições especiais e diferenciadas – diferentemente do entendimento do tribunal. “A autorização, na verdade, se restringe, ou restringiria, à realização de operações com o mercado interbancário como um todo, e por meio eletrônico”, ressalta o procurador.
Além disso, a intervenção no mercado de câmbio futuro não ocorreu no contexto da impessoalidade e generalidade, considerando que a oferta desses contratos não foi realizada diretamente na BM&F por meio eletrônico, nem estendida a todos que atuam no mercado interbancário de câmbio, mas negociados diretamente com o Banco FonteCindam - um agente específico e previamente determinado.
Quanto à alegação da defesa dos envolvidos de que as operações foram realizadas para debelar uma “crise sistêmica”, o MPF afirma que houve claro desvio de finalidade no uso do instrumento de intervenção no mercado de dólar. As operações não tiveram o objetivo de regular o mercado cambial, e sim socorrer o Banco FonteCindam, desconsiderando injustificadamente outros mecanismos de ação. Para o MPF, essas operações violaram “os princípios da isonomia, da impessoalidade e da moralidade, tendo sido utilizadas sob a falsa motivação de ‘evitar um risco sistêmico’, que se revelou altamente duvidoso, para, em verdade, beneficiar, pessoal e direcionadamente, a instituição financeira em questão”.
Análise técnica - Outros pontos omissos da decisão dizem respeito às conclusões de relatórios de análise que examinaram com profundidade o laudo elaborado pelo perito do juízo no caso do Banco Marka, e em operação exatamente igual à realizada com o Banco FonteCindam, bem como as operações tratadas nos autos da ação popular referente ao prejuízo de mais de R$ 520 milhões aos cofres públicos.
Segundo um dos relatórios, a perícia judicial não havia analisado o contexto completo das operações envolvendo as reservas internacionais. Segundo os réus, a manutenção das reservas internacionais propiciou receitas com a valorização da moeda norte-americana em relação ao real. De acordo com os relatórios juntados pelo MPF, o debate deveria ter ido adiante na análise até fechar o fluxo, incluindo no exame a chamada “dívida invisível”, ou seja, o custo da manutenção das reservas cambiais. “Esse custo se materializa pelo aumento da dívida pública interna, em razão das altas taxas de juros praticadas naquela conjuntura para sustentar a paridade artificial da moeda nacional frente ao dólar, a intitulada âncora cambial”.
Para o MPF, os relatórios de análise que não foram levados em consideração no acórdão do TRF1 destacam que os ganhos indicados pela defesa dos envolvidos não anulam as perdas experimentadas nos contratos futuros questionados. Segundo tais relatórios, deve-se confrontar as receitas com a variação cambial das reservas internacionais com os custos destas, o que confirmaria as elevadas perdas nas operações realizadas.
São acusados pelas operações ilícitas agentes do Banco Central do Brasil e do BB Banco de Investimento, do Banco FonteCindam e seus Fundos de Investimento, além da própria BM&F.
Número do processo: 0009883-25.1999.4.01.3400 (1999.34.00.009903-7)/DF
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