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16 de Junho de 2024
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    Com colaborações premiadas, MPF deflagra 2ª fase da Operação Esculápio em Marília (SP)

    Escritório de contabilidade é alvo de mandados de busca e apreensão; procuradores ajuízam mais duas denúncias contra envolvidos em licitações irregulares no complexo Famema

    há 5 anos

    O Ministério Público Federal, com o apoio da Polícia Federal, deflagrou nesta sexta-feira a segunda fase da Operação Esculápio, que investiga fraudes em licitações e desvios de recursos do Hospital das Clínicas de Marília (SP). Com base em informações advindas de dois acordos de colaboração premiada obtidos pelo MPF, autoridades cumpriram mandados de busca e apreensão no escritório de contabilidade Contábil Gélamo. Também nesta sexta, o MPF ajuizou duas novas denúncias contra os envolvidos por contratações ilegais para prestação de serviços de radioterapia e oftalmologia no período de 2011 a 2015. Parte dos acusados já responde a duas ações judiciais relacionadas à escolha irregular de uma empresa que realizou serviços superfaturados de hemodiálise na unidade de saúde.

    O Hospital das Clínicas é vinculado à Faculdade de Medicina de Marília (Famema) e recebe recursos federais e estaduais para prestar atendimentos pelo SUS a pacientes de 62 municípios da região. As quantias são geridas pela Fundação de Apoio à Faculdade de Medicina de Marília (Famar), o epicentro do esquema fraudulento. As investigações revelaram que a entidade direcionava licitações do hospital para favorecer empresas pertencentes a seus integrantes ou a pessoas próximas a eles. Entre os envolvidos estão professores e médicos da instituição de ensino e membros da cúpula do HC na época das irregularidades.

    Colaborações premiadas – As ações de busca deflagradas nesta sexta-feira são decorrência de dois acordos de colaboração premiada fechados pelo MPF em dezembro do ano passado. Representantes de duas empresas de serviços médicos concordaram em confessar aos procuradores os crimes e contar detalhes das práticas de direcionamento das licitações, em troca de benefícios como redução de pena e prestação de serviços alternativos à comunidade. Os colaboradores sumarizaram os principais mecanismos que foram utilizados para dar aparente ar de legalidade à licitação, sendo que, na prática, já se sabia desde o início qual empresa ganharia a disputa: o IRM - Instituto do Rim de Marília.

    As versões apresentadas pelos colaboradores passaram por checagem e conferência do MPF ao longo dos últimos dois meses, tendo sido confirmadas por meio de diversas provas de corroboração, inclusive exame pericial. Constatou-se que o IRM chegou até mesmo a elaborar uma “logomarca” para a empresa concorrente poder participar da licitação, e análise pericial de arquivos eletrônicos por parte do Instituto de Criminalística da Polícia Federal comprovou que um dos sócios do IRM foi o autor de um documento forjado em nome da empresa que perderia a licitação.

    Novas denúncias – Em duas denúncias apresentadas à Justiça Federal em Marília nesta sexta-feira, são descritos novos crimes de fraudes e direcionamento de licitações, assim como superfaturamento de preços de serviços que configuraram peculato. Em um total de 218 páginas de acusação, os procuradores detalham cada circunstância que resultou na contratação indevida de empresas para prestar serviços ao complexo Famema. Apenas estes dois contratos, contidos nas novas denúncias, totalizaram o valor de R$ 10,5 milhões no período de 2011 a 2015, montante decorrente de licitações consideradas irregulares pelos procuradores.

    Uma das duas novas denúncias trata das irregularidades para a contratação, em 2012, da Quantum Assessoria em Física Médica, que prestaria serviços de radioterapia no HC. A Quantum, oficialmente sediada na residência de seus proprietários em Marília, nunca teve instalações físicas próprias e mantinha um quadro irrisório de funcionários registrados. Ainda assim, já prestava serviços ao HC desde 2006. A nova contratação apenas formalizaria a continuidade desse vínculo, agora por meio da Famar e não mais pela antiga Fundação Municipal de ensino Superior (Fumes).

    As investigações revelaram uma série de manobras para direcionar o resultado da licitação. Entre elas, a inserção de requisições técnicas restritivas (como a exigência de fornecimento de equipamentos que coincidiam exatamente com aqueles já operados pela Quantum no hospital) e a baixa publicidade do processo, com a divulgação do edital somente no diário oficial e em um jornal de Marília. Limitada a concorrência, a empresa foi a única a apresentar proposta, rapidamente aprovada e homologada pela comissão da Famar.

    Foi no contrato da Famar com a Quantum que os procuradores encontraram o maior superfaturamento identificado no âmbito da Operação Esculápio. Apesar de a empresa ter vencido a licitação em que concorreu sozinha com um preço equivalente a 50% da tabela SUS, o que poderia indicar a vantajosidade do contrato, os procuradores descobriram que na verdade esse valor era apenas fachada. Durante a prestação dos serviços, a Quantum foi indevidamente beneficiada com o custeio de inúmeras despesas que deveria ela própria assumir e que eram financiadas pela Famar, como locação de espaço físico, contas de água e energia e até mesmo funcionários, que eram fornecidos pela fundação que gerencia o complexo Famema, apesar de a Quantum já estar sendo remunerada por isso.

    Também chamou a atenção dos procuradores o fato de a Famar ter disponibilizado gratuitamente equipamentos de radioterapia de alto custo, adquiridos com recursos públicos do SUS, para a Quantum prestar os serviços, sem ter que pagar nada a título de aluguel destes equipamentos. Por fim, descobriu-se que a Famar custeava até mesmo insumos do serviço de radioterapia que já estavam embutidos no preço pago à empresa terceirizada. Todas essas vantagens ocultas resultaram em superfaturamento e em uma enorme margem de lucro à empresa e a seus sócios, pois praticamente não tinham custos com a execução do serviço de radioterapia.

    Olhos – As fraudes relacionadas à Quantum seguiram o mesmo modelo adotado poucos meses antes no processo que resultou na contratação do Centro Diagnóstico de Oftalmologia de Marília (CDOM), tema da outra nova denúncia do MPF. Assim como a firma de radioterapia, a empresa de serviços oftalmológicos já atuava no HC desde 2006, estendendo indevidamente sua presença no hospital pelos anos seguintes com base em prorrogações irregulares. Em 2011, o conluio entre representantes do CDOM e da Famar garantiu à companhia um novo contrato, no valor anual de R$ 1,6 milhão.

    Os procuradores descobriram que o CDOM era uma firma de fachada, constituída para permitir que os sócios do Instituto de Olhos de Marília (IOM) se beneficiassem indiretamente da contratação. Segundo as apurações, o CDOM e o IOM formavam, na realidade, uma mesma empresa, compartilhando sedes físicas, atividades administrativas e o próprio corpo clínico. A principal diferença estava na composição societária: enquanto o IOM era integrado majoritariamente por professores da Famema, o Centro estava em nome de pessoas sem vínculo formal com o complexo hospitalar da faculdade, o que legitimaria a empresa para a execução de serviços no HC sem levantar suspeitas.

    Visando à perpetuação do contrato, os sócios do IOM se associaram à cúpula da Famar para elaborar um edital que direcionasse a licitação e resultasse na escolha do CDOM. A pouca visibilidade dada ao processo seletivo, que se repetiria no caso da Quantum, restringiu a disputa. Ao mesmo tempo, a participação de outras empresas tornou-se bastante difícil com uma exigência injustificada, prevista no edital, de que o profissional responsável pelos serviços tivesse mestrado ou doutorado emitido exclusivamente pelo Conselho Brasileiro de Oftalmologia. Apenas uma das sócias do CDOM havia concluído a pós-graduação indicada.

    O contrato com o CDOM foi mantido até 2016 por sucessivos aditivos. Ao todo, a empresa recebeu mais de R$ 5,4 milhões da Famar. De acordo com as investigações, boa parte dos pagamentos se destinou à liquidação de despesas do grupo, entre elas os custos do IOM com atendimentos particulares. Com isso, os sócios puderam aumentar seus ganhos a partir do aumento da margem de lucro do IOM.

    Busca e apreensão – Os mandados cumpridos nesta sexta-feira visaram à coleta de mais provas quanto ao funcionamento do esquema. O escritório de contabilidade Contábil Gélamo foi um dos principais articuladores das fraudes para a contratação do Instituto do Rim de Marília (IRM), que executou serviços de hemodiálise no HC entre 2011 e 2013. As buscas por computadores e documentos no escritório e na casa do contador foram definidas a partir de informações que dois envolvidos forneceram aos investigadores por meio de acordos de colaboração premiada firmados em dezembro do ano passado.

    Para direcionar o resultado da seleção aberta pela Famar, os médicos contaram com o auxílio do escritório Gélamo, que prestava serviços de contabilidade ao IRM havia 15 anos. O contador providenciou a documentação forjada de outras duas empresas para simular a disputa que sagraria o IRM vencedor. Pertencentes a ex-alunos dos nefrologistas, as companhias não tinham condições de prestar os serviços estabelecidos no edital e participariam da licitação de maneira apenas formal, a pedido dos outros envolvidos.

    Arquivamentos – Também nesta sexta-feira, o MPF promoveu o arquivamento de dois inquéritos policiais ante a ausência de irregularidades em áreas que também foram objeto de investigação. Um desses inquéritos apurou o processo de contratação da empresa que viria a prestar serviços de anestesiologia ao complexo Famema. Nesse caso, os procuradores não encontraram indícios de conluio entre as empresas concorrentes ou cláusulas no edital que visassem o direcionamento da licitação. O preço ofertado, por sua vez, se mostrou compatível com o valor de mercado e com o que era cobrado na região.

    Outra investigação arquivada foi a que apurou a regularidade dos chamados “plantões de disponibilidade da gestão do cuidado”. Trata-se de uma modalidade de plantão instituída pela Famar para remunerar médicos que permanecessem de sobreaviso para resolver questões administrativas do complexo. Após serem ouvidas dezenas de pessoas e verificados documentos, o MPF não encontrou indícios de ter havido crime na criação dessa modalidade de plantão.

    Aprofundamento das investigações – Simultaneamente, o Ministério Público Federal remeteu de volta para a Polícia Federal a investigação que apura a contratação de serviços de densitometria óssea para o complexo Famema. Além disso, os procuradores requisitaram o aprofundamento das investigações com foco nas contratações diretas de exames, sem licitação por parte da Famar, na área de radiologia.

    Operação Esculápio – A primeira fase da Operação Esculápio foi deflagrada em julho de 2015, quando foram cumpridos 12 mandados de busca e apreensão nas sedes da Famar, da Famema e em endereços ligados aos médicos dirigentes do complexo. Desde então, as investigações avançaram com base não só nos acordos de colaboração premiada e nos documentos já apreendidos, mas também no depoimento de testemunhas e no conteúdo de movimentações bancárias e de interceptações telefônicas autorizadas judicialmente.

    A Famema e a Famar já foram alvo também de procedimentos do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo e de uma CPI na Câmara Municipal de Marília. Em outubro do ano passado, a Justiça Federal acolheu um pedido formulado pelo MPF e o Ministério Público Estadual e determinou que o Departamento Nacional de Auditoria do SUS (Denasus), vinculado ao Ministério da Saúde, realize uma ampla auditoria nas contas do complexo hospitalar da faculdade. A análise ainda não foi concluída.

    Para conduzir os casos relacionados à Operação Esculápio, a Procuradoria-Geral da República constituiu uma força-tarefa que é composta pelos procuradores da República Diego Fajardo Maranha Leão de Souza, Fabricio Carrer, Jefferson Aparecido Dias e Pedro Antonio de Oliveira Machado.

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