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4 de Maio de 2024
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    "Com Constituição alemã de Weimar, Estado é chamado a proteger o cidadão"

    Publicado por Consultor Jurídico
    há 5 anos

    O jurista Lenio Streck, colunista da ConJur, explica a importância do marco inaugural do constitucionalismo social, de que forma a Constituição de Weimar inspirou outras Cartas pelo mundo e de que forma suas previsões ajudaram a engrossar o caldo da ascensão do nazismo na Alemanha.

    Leia a entrevista:

    Qual foi a influência da Constituição de Weimar na consolidação dos direitos fundamentais e sociais?

    Ela foi ruptural. E digo isso porque, com ela, não temos mais uma Carta Magna dizendo “o que é” ou “quais são os limites” do Estado. A partir da Constituição de Weimar, há um “fim” (em sentido de finalidade) ao Estado. Ela inaugura, junto com a do México, de 1917, aquilo que se chamou de constitucionalismo social, colocando o Estado como promovedor de políticas públicas. Do velho Estado regulador passamos para o Estado promovedor. Hans Kelsen foi um dos primeiros a defender a Constituição como norma. Embora um autor como Hermann Heller tivesse uma preocupação especial com a Constituição como algo político, não se pode dizer que desdenhasse do sentido normativo. A expessão força normativa da Constituição vem depois de 1949. De todo modo, Heller menciona, em sua “Teoria do Estado”, a “Constituição formada por normas”, destacando sua “função diretora e preceptiva”.

    Por que a Constituição de Weimar foi pioneira na consolidação dos direitos fundamentais?

    Entendo que esse pioneirismo não se relaciona somente a direitos fundamentais. Com Weimar, o Estado é chamado a proteger o cidadão, inaugurando o que poderíamos chamar de “função social do Estado contemporâneo”. Daí o caráter ruptural mencionado na resposta anterior. Eis o grande legado de Weimar. Mais que garantir – como no Estado projetado a partir das Revoluções Liberais – a liberdade dos cidadãos, primando pela garantia da livre iniciativa, sobretudo, nas relações de mercado, a Constituição de Weimar projeta, também, a proteção do indivíduo. Com ela, a propriedade obriga: eis um marco para superar a velha noção da propriedade como mercadoria. Esse ideário, por exemplo, influiu, no Brasil, na Carta de 1934, ao vedar sua utilização contra o interesse social ou coletivo.

    Como a Constituição de Weimar inspirou constituições de outros países?

    Comecemos pela Constituição de 1934, do Brasil, já referida. A "parte social" da Constituição de 1934 é diretamente decorrente de Weimar. Vou além: todo o Constitucionalismo Contemporâneo é devido a Weimar. O Constitucionalismo Social só existe ou existiu graças à noção de Constituição como norma, como dever. A Constituição já não é uma mera folha de papel ou Carta Política. Agora, a partir de Weimar, e sacramentado pelo Constitucionalismo do segundo pós-Guerra, fala-se em transformação das relações sociais por meio da noção de Constitucionalismo Compromissório. A noção de Constitucionalismo dirigente vem nos anos 70 e é reaproveitada por autores como Canotilho, pela qual a Constituição impõe uma finalidade a ser perseguida, e o governo diz como alcançar essa finalidade, ou seja, projeta os meios para tais finalidades, para usar um argumento que simplifique essa questão. Mas, veja-se: constitucionalismo social é Weimar; Constitucionalismo dirigente é bem posterior. Especificamente sobre a inspiração advinda de Weimar, objeto da pergunta, considero importante, aqui, destacar o global contexto de crescimento do operariado e de ascendente industrialização no mundo todo. Ou seja, o que é projetado a partir de Weimar, que em seu “Livro Dois” elenca direitos, por exemplo, relativos à “vida social”, à educação e à escola” ou à “vida econômica”, reflete reivindicações presentes em diversos países que, por óbvio, não se furtavam a esse cenário, comum a muitas nações no início do século XX. Não à toa, muito do que nela se encontra pioneiramente (assim como na Constituição Mexicana de 1917), acaba refletido em outros documentos constitucionais.

    Como a Constituição de Weimar inspirou as Constituições brasileiras, especialmente a de 1988?

    Sucintamente, naquilo que chamo de "resgate das promessas da modernidade". Weimar é parte de um cenário de profunda crise não apenas política, como, também, institucional. Embora possam ser destacados contextos diferentes, evidentemente, é inegável, também, semelhanças com o momento pelo qual passava o Brasil, à época da transição democrática. Assim como a Constituição de Weimar, a Carta de 1988, no Brasil, coloca-se como um documento dirigente e compromissório, projetando justamente o “resgate” mencionado anteriormente: (re) situar a nação, tardiamente modernizada. Como destaca Joseph Barthélemy, Weimar foi uma espécie de “laboratório constitucional”, e muitas de suas projeções ganharam contornos universais – condição que não se verifica somente na Constituição de 1988, mas, muito antes, já na de 1934, que trazia um catálogo de direitos prestacionais como reflexo dessa condição inspiradora. Entretanto, importante frisar, a despeito dessa influência dirigente, temos um “passo atrás” com a nossa Constituição, sistematicamente enfraquecida, a ponto de, hoje, como diria Gilberto Bercovici, termos uma “Constituição Dirigente Invertida”.

    Como o senhor compara a Constituição do México, de 1917, com a Constituição de Weimar?

    Sem dúvida, há questões semelhantes. A Constituição Mexicana, de 1917, foi produto de uma série de agitações sociais desde 1910, e o contexto de Weimar é, nesse sentido, muito próximo. Ou seja, ambas as Cartas estão inseridas em um contexto social marcado por reivindicações que culminam na passagem de um modelo que “diz o que é o Estado” para um paradigma constitucional que aponta “finalida...

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