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20 de Junho de 2024
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    Corrupção como crime hediondo não resolve o problema

    Publicado por Consultor Jurídico
    há 11 anos

    Na última semana o Senado aprovou o projeto de lei de torna da corrupção crime hediondo, aumentando suas penas e dificultando a concessão de benefícios para os condenados. Porém, para o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, só esta medida não resultará no combate à impunidade. Já criamos outros crimes hediondos, até por iniciativa popular, e tudo mais, mas isso não resulta claramente no combate à impunidade, porque nós estamos muitas vezes a falar da funcionalidade do sistema, vamos chamar assim, de Justiça criminal, que envolve polícia, envolve Ministério Público e envolve a própria Justiça. Então, talvez, aqui um pacto contra a impunidade, inclusive contra os casos de corrupção, devia se exatamente focar nesse amplo aparato. Maior especialização dessas áreas, em suma, dedicação, prioridade. Como o CNJ já vem fazendo, por exemplo, nos chamados crimes de improbidade administrativa ou atos de improbidade administrativa, explica o ministro ao ser entrevistado no programa Poder e Política, do jornal Folha de S.Paulo e portal UOL.

    O ministro também falou sobre a reforma política no Brasil. Gilmar Mendes questionou a opção da presidente Dilma Rousseff de realizar um plebiscito devido a dificuldade de execução e afirmou que o governo está correndo atrás para dar atenção a um tema que não fora tratado. Essa pressa causa preocupação em Gilmar Mendes, que relembra o caso da Ficha Limpa. Nós vimos no caso da Lei da Ficha Limpa. Hoje apontam-se muitos problemas na sua execução. Por quê? Porque se queria correr para aprovar antes de entrarmos no período eleitoral, aquele da anualidade, do artigo 16. Então acabam ocorrendo imperfeições.

    Questionado sobre as vantagens que os magistrados possuem, como férias de 60 dias, Gilmar Mendes deixou claro que é a favor de uma revisão e propõe um período que o juiz trabalhasse na vara, sem expediente externo. Há algo de heterodoxo, de errado, nesse sistema. Poder-se-ia pensar, talvez, num período em que o Judiciário trabalhasse para se organizar. Isso ocorre conosco no Supremo Tribunal Federal, explica o ministro, informando que durante seu período de férias trabalha aproximadamente um mês em seu gabinete. O ministro também se posicionou contrário à decisão do CNJ de levar vantagens dadas ao Ministério Público para os juízes. Na verdade, as vantagens do Ministério Público é que deveriam ter sido supressas e não se fazer extensão ao Judiciário.

    Gilmar Mendes falou ainda sobre o processo do mensalão. Eu já disse em outra oportunidade, acho que eu concordo com outros colegas, o Tribunal não pode ficar refém do processo do mensalão. É preciso virar essa página. O Judiciário precisa cuidar de outros temas, disse o ministro, que crê no encerramento desta ação penal ainda este ano.

    Leia a entrevista:

    O Brasil assiste já há duas semanas muitas manifestações de rua protestando contra muitas coisas. O sr. acha que o Supremo Tribunal Federal e o Poder Judiciário também são, em certa medida, alvos destes protestos?

    Eu tenho a impressão de que todo o poder constituído de alguma forma está tendo a atenção chamada por conta destes protestos. Quando as pessoas gritam contra a corrupção, de certa forma estão em relação ao Legislativo, ao Executivo, mas também em relação ao Judiciário porque pelo menos é o Judiciário que julga esses processos, quando não é alvo da própria acusação. E nós temos, realmente, temos uma grande falha no sistema de justiça criminal. A toda hora, nós noticiamos que um evento como aquele do Carandiru foi julgado 20 anos depois. Em suma, temos um grande problema nessa área. Embora que eu tenho até dito que um lance importante hoje no procedimento da reforma do Judiciário seria dar atenção específica à justiça criminal. Eu tenho impressão que também o Judiciário está tendo a atenção chamada neste momento.

    Sabe que, a propósito disso, o ex-ministro agora Cezar Peluso defendia uma reforma que reduzisse o número de instâncias recursais. Teria que ser uma emenda constitucional. Havia dúvidas se era constitucional ou não fazer isso. Qual a sua opinião sobre isso para abreviar o tempo entre o processo e os diversos julgamentos e o cumprimento da pena?

    Eu tenho a impressão que nós caímos numa cilada. Inicialmente, acho que foi até o próprio ministro Peluso como relator que consagrou a tese, que era questionada no Supremo Tribunal Federal, a propósito da necessidade de que houvesse trânsito em julgado para mandar alguém ao presídio. Essa foi a tese por ele sustentada em razão dos múltiplos abusos que se perpetravam e deixou alguma válvula de escape para aqueles casos em que, com a sentença, já se justificasse a prisão provisória nos casos de crimes organizados, casos de continuidade delitiva etc. Mas foi ele mesmo que defendeu essa tese. O Tribunal a sufragou. Creio que por uma ampla maioria. Depois se viu que isso estava se resultando no final num quadro de impunidade porque as pessoas recorrem e passam a recorrer abusivamente agora para o STJ e depois para o Supremo Tribunal Federal. Eu tenho a impressão de que a resposta pode se dar no próprio plano legislativo e até no plano jurisprudencial.

    Como assim?

    Podemos tanto dizer que a partir do 2º grau já pode ocorrer a prisão se o juiz assim avaliar, se o Tribunal assim avaliar. Vamos estar consoantes com todas as declarações de direito, inclusive com a Convenção Interamericana de Direitos. Portanto, não acredito que haja aqui tantos problemas.

    Mas não é necessário fazer uma emenda constitucional para...

    Não. Não é necessário fazer uma emenda. E aquela emenda, que foi chamada "PEC Peluso" tinha ainda um problema porque ela dizia que quase todas as decisões e aí não era só na esfera penal, mas também na esfera civil em geral já teriam força executória com a decisão de 2º grau. E aí nós teríamos uma grande insegurança por quê? Porque as decisões do Supremo e do STJ virariam algo lítero-poético-recreativo, não é? Com todos problemas que nós dizemos. Acabou se atirando no que vira e acertando no que não vira. Em suma, não foi uma boa proposta. Eu acho que vale como metáfora. Quer dizer, nós precisamos melhorar a justiça criminal. E eu acho que nesse ponto a mensagem da PEC Peluso é interessante. Acho que isso tem que ser prioridade mesmo.

    Mas teria que ser feito no âmbito do próprio Judiciário?

    No âmbito do próprio Judiciário e também... Quer dizer, pode-se fazer uma revisão ou assentar isso em regras de processo penal. Não é preciso, portanto, uma emenda constitucional para isso.

    Mas para que um leigo entenda, seria necessário que talvez uma súmula vinculante, alguma decisão...

    Dizer que em caso tais, em 2º grau e com a condenação já se cumpra [a pena]. Ontem, por exemplo, nós tivemos aquele caso de um deputado de Rondônia [Natan Donadon] já nos segundos embargos de declaração. Tecnicamente, não houve trânsito em julgado, mas o Tribunal disse: "Agora já é abusivo. Vamos considerar, portanto, fictamente que já transitou em julgado." Manda-se executar a decisão. Não é mais passível de recursos. Então, talvez nós tenhamos que ter algum tipo de referencial a partir do 2º grau e deixar o Tribunal avaliar se é o caso de fazer-se logo o decreto de prisão.

    O sr. mencionou o caso do deputado Natan Donadon, do PMDB de Rondônia. Ele foi condenado já no Supremo Tribunal Federal no ano de 2010 a 13 anos de reclusão por formação de quadrilha e peculato. Em 2010. Nós estamos em 2013. Nesse caso o sr. acha que o Supremo poderia, talvez, antes ter tomado a decisão que tomou nesta semana?

    Isso é um aprendizado, Fernando. Nós agora que estamos tendo a oportunidade de chegar ao fim de um julgamento penal. Porque antes como se sabe, embora tenha se alardeado que o Supremo não julgava, não gostava na verdade, não havia licença para que os processos fossem submetidos, uma vez que os processos dependiam de licenças da Câmara ou do Senado. Nós estamos nesse aprendizado. E o Tribunal é muito cioso na observância e tem que ser dos direitos e garantias individuais porque a decisão reflete não somente no caso, mas também tem um efeito irradiador para todo o sistema jurídico, jurídico-penal, se for o caso. Mas esse é um bom exemplo. Eu tenho a impressão que no futuro nós teremos que, decidindo um caso em matéria criminal, teremos que expedir logo a ordem de prisão e não ficarmos a esperar embargos de declaração, que saiam embargos infringentes ou embargos para Deus. Em suma, não faz sentido.

    O sr. acha que o momento pelo qual passa o país ajudou o Supremo a refletir nesse caso do Donadon e tomar essa decisão nessa semana?

    Não. O Tribunal vem refletindo já há muito tempo a propósito do assunto. Eu tenho a impressão que já na gestão, por exemplo, da ministra Ellen [Gracie], se criou uma secretaria para gerenciar os processos criminais. Depois houve uma série de ajustes nas várias gestões no sentido de dar prioridade aos processos, evitar as prescrições, que eram muito comuns no âmbito do Supremo Tribunal Federal especialmente com esse vai e volta de processos entre o Supremo, Procuradoria-Geral, Polícia Federal. Os próprios inquéritos acabavam tendo um caso de prescrição, afinal... Em suma, nós temos aprimorado a partir da consciência que se teve de que o Tribunal tinha que julgar sim processos criminais.

    No caso do Donadon em específico, o sr. acha que foi uma coincidência, então, o fato de ter sido nesta semana? Depois de duas semanas de protestos do país contra a impunidade.

    Eu acho que, se nós olharmos, esse processo, salvo engano, a ministra Cármen Lúcia já tinha colocado em pauta algumas vezes. Mas aí também a nossa pauta está tumultuada, não é? Tivemos esse caso, por exemplo, dos partidos políticos, toda essa discussão a propósito da reforma e isso atrasou também a pauta do Supremo. Então, eu tenho a impressão que não está associada a isso. Pelo contrário. Eu acho que a própria relatora já vinha fazendo um esforço enorme de colocar o processo em pauta o mais rápido possível segundo os embargos de declaração.

    O seu colega, o ministro Dias Toffoli, disse aqui que o processo do mensalão, que terminou o julgamento no ano passado (2012), talvez ainda dure mais um ou dois anos até de fato estar transitado em julgado. É isso mesmo?

    Eu tenho a expectativa de que nós encaminhemos esse assunto agora no 2º semestre. Eu tenho a impressão de que com esse aprendizado institucional que todos nós estamos experimento, haurindo, eu creio que vamos fazer um esforço para encerrar esse assunto. Eu já disse em outra oportunidade, acho que eu concordo com outros colegas, o Tribunal não pode ficar refém do processo do mensalão. É preciso virar essa página. O Judiciário precisa cuidar de outros temas. E eu tenho a impressão de que muitos colegas estão imbuídos deste propósito.

    Agora do ponto de vista objetivo. Não são muitos réus. Muitos entraram com os chamados embargos de declaração que devem ser apreciados no 2º semestre, como já disse o presidente do Supremo, Joaquim Barbosa. O sr., com a sua experiência no Supremo, acha que os embargos de declaração podem ser apreciados todos e julgados no 2º semestre?

    Eu tenho a impressão que sim. Acho que sim.

    Ao longo do 2º semestre?

    Ao longo do 2º semestre.

    Aí, em seguida, ou ainda antes, porque um já entrou, com o embargo infringente. O Supremo vai ser confrontado sobre se aceita ou não esse tipo de recurso. O sr. tem opinião formada e conhecida já?

    Não. Nós temos que discutir essa qu...

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