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16 de Junho de 2024
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    Divisão em entrâncias e decesso remuneratório

    Publicado por Enviadas Por Leitores
    há 13 anos

    Por José Fernando Santos de Souza*

    "MUDAM-SE OS TEMPOS, MUDAM-SE AS VONTADES, MUDA-SE O SER, MUDA-SE A CONFIANÇA; TODO O MUNDO É COMPOSTO DE MUDANÇA, TOMANDO SEMPRE NOVAS QUALIDADES." - CAMÕES


    A estrutura una do Poder Judiciário brasileiro, é pacificamente reconhecido em doutrina e confirmado pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal em vários julgados. Nesse sentido é a lição de José Afonso da Silva, maior constitucionalista brasileiro, que afirma:

    "O art. 92 [da Constituição de 1988], como já fazia o art. 112 da Constituição de 1969, inclui os órgãos da justiça estadual entre os que exercem o Poder Judiciário; em assim fazendo, acolheu a doutrina que vem sustentando, pacificamente, aliás, a unidade da jurisdição nacional."

    O Supremo Tribunal Federal também se manifestou adotando a tese da unidade do Poder Judiciário. Cite-se, pela particular relevância, trecho do voto do Ministro Cezar Peluso, relator na ADI nº 3.367-DF, que declarou a constitucionalidade do Conselho Nacional de Justiça:


    "O pacto federativo não se desenha nem expressa, em relação ao Poder Judiciário, de forma normativa idêntica à que atua sobre os demais Poderes da República. Porque a Jurisdição, enquanto manifestação da unidade do poder soberano do Estado, tampouco pode deixar de ser una e indivisível, é doutrina assente que o Poder Judiciário tem caráter nacional, não existindo, senão por metáforas e metonímias, Judiciários estaduais ao lado de um Judiciário federal."

    A divisão da estrutura judiciária brasileira, sob tradicional, mas equivoca denominação, em Justiças, é só o resultado da repartição racional do trabalho da mesma natureza entre distintos órgãos jurisdicionais. O fenômeno é corriqueiro, de distribuição de competências pela malha de órgãos especializados, que, não obstante portadores de esferas próprias de atribuições jurisdicionais e administrativas, integram um único e mesmo Poder. Nesse sentido fala-se em Justiça Federal e Estadual, tal como se fala em Justiça Comum, Militar, Trabalhista, Eleitoral, etc., sem que com essa nomenclatura ambígua se enganem hoje os operadores jurídicos.

    Na verdade, desde JOAO MENDES JÚNIOR, cuja opinião foi recordada por CASTRO NUNES, sabe-se que:

    'O Poder Judiciário, delegação da soberania nacional, implica a idéia de unidade e totalidade da força, que são as notas características da idéia de soberania. O Poder Judiciário, em suma, quer, pelos juízes da União, quer pelos juízes dos Estados, aplica leis nacionais para garantir os direitos individuais; o Poder Judiciário não é federal, nem estadual, é eminentemente nacional, quer se manifestando nas jurisdições estaduais, quer se aplicando ao cível, quer decidindo em superior, quer decidindo em inferior instância.'

    Desenvolvendo a idéia, asseveram ANTONIO CARLOS DE ARAÚJO CINTRA, ADA PELLEGRINI GRINOVER e CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO:

    'O Poder Judiciário é uno, assim como una é a sua função precípua - a jurisdição - por apresentar sempre o mesmo conteúdo e a mesma finalidade. Por outro lado, a eficácia espacial da lei a ser aplicada pelo Judiciário deve coincidir em princípio com os limites espaciais da competência deste, em obediência ao princípio una Iex, una jurisdictio. Daí decorre a unidade funcional do Poder Judiciário.

    É tradicional a assertiva, na doutrina pátria, de que o Poder Judiciário não é federal nem estadual, mas nacional. E um único e mesmo poder que se positiva através de vários órgãos estatais estes, sim, federais e estaduais.

    (...) fala a Constituição das diversas Justiças, através das quais se exercerá a função jurisdicional. A jurisdição é uma só, ela não é nem federal nem estadual: como expressão do poder estatal, que é uno, ela é eminentemente nacional e não comporta divisões. No entanto, para a divisão racional do trabalho é conveniente que se instituam organismos distintos, outorgando-se a cada um deles um setor da grande massa de causas que precisam ser processadas no país. Atende-se, para essa distribuição de competência, a critérios de diversas ordens: às vezes, é a natureza da relação jurídica material controvertida que irá determinar a atribuição de dados processos a dada Justiça; outras é a qualidade das pessoas figurantes como panes; mas é invariavelmente o interesse público que inspira tudo isso (o Estado faz a divisão das Justiças, com vistas à melhor atuação da função jurisdicional).'

    Negar a unicidade do Poder Judiciário importaria desconhecer o unitário tratamento orgânico que, em termos gerais, lhe dá a Constituição da República. Uma única lei nacional, um único estatuto, rege todos os membros da magistratura, independentemente da qualidade e denominação da Justiça em que exerçam a função (Lei Complementar nº 35, de 14.03.1979; art. 93, caput, da CF). A todos aplicam-se as mesmas garantias e restrições, concebidas em defesa da independência e da imparcialidade. Códigos nacionais disciplinam o método de exercício da atividade jurisdicional, em substituição aos códigos de processo estaduais. Por força do sistema recursal, uma mesma causa pode tramitar da mais longínqua comarca do interior do país, até os tribunais de superposição, passando por órgãos judiciários das várias unidades federadas. E, para não alargar a enumeração de coisas tão conhecidas, relembre-se que a União retém a competência privativa para legislar sobre direito processual (art. 22, inc. I).

    Nesse diagrama constitucional, nunca se ouviu sustentar que as particularidades concretas da organização da estrutura judiciária violassem o pacto federativo. E não se ouviu, porque perceptível sua natureza nacional e unitária, embora decomposta e ramificada, por exigências de racionalização, em múltiplos órgãos dotados de sedes e de âmbitos distintos de competência. Não se descobre, pois, sob esse ângulo, por que a instituição do Conselho Nacional de Justiça não se ajustaria à organização constitucional do Poder.

    Não se quer com isso afirmar que o princípio federativo não tenha repercussão na fisionomia constitucional do Judiciário. Sua consideração mais evidente parece estar à raiz da norma que delega aos Estados-membros competência exclusiva para organizar sua Justiça, responsável pelo julgamento das causas respeitantes a cada unidade federada (art. 125). Toca-Ihes, assim, definir a competência residual de seus tribunais, distribuí-la entre os vários órgãos de grau inferior, bem como administrá-la na forma prevista no art. 96, coisa que revela que a estrutura judiciária tem um dos braços situados nas Justiças estaduais.

    (...)

    Não é, como tentei demonstrar, imutável o conteúdo concreto da forma federativa. As relações de subordinação vigentes na estrutura do Judiciário, dado seu caráter nacional, como o reconhece a autora (item 51 da inicial), podem ser ampliadas e desdobradas pelo constituinte reformador, desde que tal reconfiguração não rompa o núcleo essencial das atribuições do Poder em favor de outro. E foram redefinidas pela Emenda nº 45, sem usurpação de atribuições por outro Poder, nem sacrifício da independência. A redução das autonomias internas, atribuídas a cada tribunal, não contradiz, sob nenhum aspecto, o sistema de separação e independência dos Poderes. A Corte cansou-se de proclamar que não são absolutas nem plenas as autonomias estaduais, circunscritas pela Constituição (art. 25), porque, se o fossem, seriam soberanias. E o Conselho não tem competência para organizar nem reorganizar as Justiças estaduais."

    Acompanhando"in totum"o voto do Ministro relator Cesar Peluso na Medida Cauletar na ADIN 3854/DF, ajuizada pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), o eminente Ministro Eros Grau asseverou:

    "Os tribunais e juízes dos Estados-membros, do Distrito Federal e dos Territórios são órgãos do Poder Judiciário (art. 92, inciso VII), componentes de um mesmo todo, de essência nacional, junto com o Supremo Tribunal Federal (inciso I), o Superior Tribunal de Justiça (inciso II), os tribunais regionais federais (inciso III), os tribunais e juízes do trabalho (inciso IV), os tribunais e juízes eleitorais (inciso V) e os tribunais e juízes militares (inciso VI).R.T.J. 203 195

    2. Bem por isso, a Constituição refere-se a todos esses órgãos como categorias da estrutura judiciária nacional". (negritei)

    3. A Constituição do Brasil confere distintos tratamentos aos três Poderes. Quanto ao Legislativo e ao Executivo, ela cogita exclusivamente do que respeita à esfera federal, o Congresso Nacional (arts. 44 e seguintes) e a Presidência da República (arts. 76 e seguintes). Já no que concerne ao Poder Judiciário, no entanto, ela abarca todas as esferas e áreas de jurisdição.

    4. Daí a unidade do Judiciário, que há de ser concebido como Judiciário nacional, excepcionando algumas exigências da Federação. Nesse sentido, reporto-me a voto do Ministro Moreira Alves na Rp 1.155/DF. No mesmo sentido, a observação de Galeno Lacerda ("O juiz e a Justiça no Brasil", in Salvio de Figueiredo Teixeira (Coord.) O Judiciário e a Constituição, São Paulo, Saraiva, 1994, op. cit., p. 127):"apesar de existir um Poder Judiciário Federal, ao lado dos estaduais, a verdade é que essa distinção também se mostra artificial, uma vez que os Juízes e Tribunais dos Estados-Membros aplicam também a legislação federal em cerca de 99% de suas decisões. Por isso, seria mais próprio falar, no Brasil, em justiça unitária nacional. A verdade é que permanece nas instituições brasileiras a predominância do Poder Central, reminiscência, talvez, do Estado monárquico originário."

    5. O Poder Judiciário compreende a magistratura federal e a magistratura estadual, a Constituição do Brasil outorgando a todos os juízes, estaduais e federais, as mesmas garantias (vitaliciedade, inamovibilidade, irredutibilidade de venci- mentos), os mesmos direitos, as mesmas vedações e as mesmas vantagens.

    6. Em suma, a Constituição consagra igualdade de tratamento a todos os membros do Poder Judiciário, o que, ademais, se impõe em benefício da sua autonomia e independência."

    Destarte,"As Justiças estaduais não são propriamente estaduais, senão órgãos da Justiça nacional descentralizados. Descentralização de tipo especial, mas essencialmente descentralização. Aos Estados cabe tão-somente o direito (melhor diria o ônus) da organização judiciária, mesmo assim segundo os princípios que lhes traça a Constituição Federal, e ainda o direito de dividir, como bem entender, o seu território em circunscrição judiciária. E é somente nesse sentido que se pode falar em justiças estaduais; locais pela organização, pela manutenção. No mais, não diferem em nada das Justiças federais, assim chamadas Justiças especiais, organizadas e mantidas pela União, como a do Trabalho e a Eleitoral, que por sinal, são também descentralizadas". (JOSE AFONSO DA SILVA, in Do recurso extraordinário no direito processual brasileiro. São Paulo: RT, 1963. p. 9)

    Nada obstante o direito da organização judiciária, e ainda o direito de dividir, o território em circunscrição judiciária, a divisão em 1ª, 2ª e 3ª entrância diferentemente do que ocorre em relação as Justiças especiais, organizadas e mantidas pela União, ao nosso sentir permissa venia além de malferir o princípio da unicidade do Poder Judiciário, está criando simplesmente diferença de subsídios e, por consequência, ferindo de morte o princípio da isonomia.

    Ora, tal forma de divisão em entrância da forma como é feita pelos órgãos da Justiça nacional nos Estados-membros, ao invés de servir para melhorar a atuação da função jurisdicional, no meu humilde modo de ver serve apenas e tão somente ao engessamento, por não possibilitar, por exemplo, a designação para outras Comarcas dentro da mesma Seção Judiciária, prejudicando a eficiência operacional e a gestão de pessoas, a exemplo de como é realizado pelas chamadas Justiças especiais, ou seja, a Federal e do Trabalho.

    Ora, nada obstante a estrutura judiciária seja nacional e unitária, em obediência ao princípio uma lex, una jurisdictio, tendo em vista a divisão em entrâncias, além de não existir a mesma mobilidade que há em relação aos outros juízes que integram as chamadas Justiças especiais, ou seja, Federal e do Trabalho o que é pior é que, em razão da divisão então existente, há decesso remuneratório, os Magistrados ficam presos dentro da circunscrição, não podem, por exemplo, ser designados para qualquer outra Vara além daquela onde exercem a sua atividade jurisdicional, na contramão, do que existe em relação as Justiças especiais Federal Comum e do Trabalho, onde os Presidentes das referidas Cortes de Justiça têm a liberdade de designar o Juiz para qualquer lugar dentro da Seção Judiciária.

    Em tal contexto, faz-se necessário e indispensável que a divisão em entrâncias seja extinta, não somente para que haja mais mobilidade na designação dos Magistrados, a exemplo do que é feito nas chamadas Justiças especiais, mas, sobretudo, para que não ocorram mais decessos remuneratórios, pois, conquanto os Estados-membros possuam competência para organizar sua Justiça, a divisão em entrâncias, fere simplesmente de morte o princípio da unidade do Poder Judiciário e significa concessão de tratamento jurídico paralelo a cargos com funções iguais.

    Como já assinalamos nas linhas pretéritas, a jurisdição é uma só, ela não é nem federal nem estadual: como expressão do poder estatal, que é uno, ela é eminentemente nacional e não comporta divisões, razão pela qual no nosso modesto entendimento a divisão em 1ª, 2ª e 3ª entrâncias, da forma como é feita nos Estados-membros, se antes ela servia à melhor atuação da prestação jurisdicional, hoje, ela não tem mais nenhuma razão de ser, por contrariar princípios constitucionais, além de está prejudicando sobremaneira à eficiência operacional e a gestão de pessoas.

    É preciso que mudanças urgentes sejam implementadas, acabando com essa divisão da jurisdição em entrâncias, tal como é feita, na atualidade, com vistas não apenas ao aperfeiçoamento da gestão, mas, sobretudo, no sentido de aumentar a eficácia, eficiência e efetividade da prestação jurisdicional, e, principalmente evitar que diferenças de subsídios continuem existindo, pois, como visto alhures em vista do caráter nacional e unitário do poder judiciário não se justifica que haja um tratamento desigual entre magistrados cujas atribuições jurisdicionais são as mesmas e integram um único e mesmo Poder.

    É de se chamar a atenção que pelo só fato desse método de dividir o exercício da atividade jurisdicional em 1ª, 2ª e 3ª Entrância, que como já dissemos, é prejudicial à eficácia, eficiência e efetividade da prestação jurisdicional, por causa disso, diferentemente dos Juízes da Justiça Federal comum e do Trabalho, que como não existe essa divisão, todos percebem os mesmos subsídios, além do direito igual que todos têm de concorrer para a 2ª Instância, onde existe diferença apenas em relação aos subsídios daqueles integrantes do 2º grau, os Juízes nos Estados-membros em que pese exercerem as mesmas atribuições jurisdicionais e integrarem um único e mesmo Poder, insista-se o que está ocorrendo por conta da chamada divisão é verdadeira ofensa à regra constitucional da igualdade ou isonomia.

    Ex positis, em obediência ao princípio una lex, una jurisdictio, em nome do bom senso, da igualdade ou isonomia, faz necessário a extinção quanto a forma atual de organização em entrâncias. Isso porque, enquanto se aguarda a aprovação da nova LOMAN, à eficácia, a eficiência e efetividade da prestação jurisdicional continuarão sendo prejudicadas, justamente em virtude da divisão que é feita em entrâncias, diferentemente das chamadas Justiças especiais, organizadas e mantidas pela União, sem falar no decesso remuneratório que até lá grande parcela de Magistrados estarão sofrendo, mês a mês, com grave ofensa à regra constitucional da igualdade ou isonomia que deve existir entre magistrados cujas atribuições jurisdicionais são as mesmas e integram um único e mesmo Poder.

    Espero que as considerações acima suscitadas não sejam simplesmente esquecidas, não caiam no vazio, pois o que aqui buscamos, é tão somente que sejam obedecidos os princípios da isonomia salarial e da igualdade com outros colegas magistrados cujas atribuições jurisdicionais são as mesmas e integram um único e mesmo Poder o que é plenamente CONSTITUCIONAL, conforme reiterada jurisprudência no STF.

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