Efetividade no novo CPC não é uma lenda urbana
Na coluna passada asseveramos que a “celeridade” no novo CPC era uma “lenda urbana”. Naquele ensaio, explicamos que, ao menos a curto prazo, o CPC/2015 não será capaz de imprimir a tão desejada “velocidade” no procedimento, já que ele se parece mais preocupado com o reforço de garantias constitucionais e com a qualidade da prestação jurisdicional, do que com o mero aspecto “tempo”.
Não obstante a previsão de que ainda levará tempo significativo entre o protocolo da petição inicial e o trânsito em julgado da decisão, há mecanismos no CPC/2015 capazes de conferir maior “efetividade” às decisões judiciais e, assim, à tutela jurisdicional, de forma tanto provisória, quanto definitiva.
De início, o art. 139, inciso IV, permite que o juiz determine “todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária”. Trata-se de um dever-poder geral de efetivação que a lei confere ao juiz para que, doravante, o destinatário de toda e qualquer decisão judicial se torne mais “coagido” a cumprir, o quanto antes, a determinação (medida ou providência) que lhe tenha sido imposta.
Esse dever-poder de efetivação é reforçado pelos arts. 536 e 537, que permitem que o juiz fixe qualquer “medida de apoio” (v.g., imposição de multa, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva) que se faça necessária para garantir a efetivação da tutela específica ou a obtenção da tutela pelo resultado prático equivalente.
Caso a medida de apoio fixada seja da espécie “multa”, o desembolso pelo inadimplente deve ser imediato, ainda durante o descumprimento, já que o novo Código passa a permitir, expressamente, a execução provisória da multa (§ 3º do art. 537).
Pode o juiz valer-se, ainda, do expediente da “tutela provisória”. Se estiverem presentes os requisitos “aparência do direito” e “risco de dano” (nos termos do art. 300, “probabilidade do direito” e “perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo”), deve o juiz deferir a tutela provisória de urgência, antecipada ou cautelar.
Caso não se faça presente o “risco de dano”, mas o direito da parte pareça “evidente” (e.g., prova documental suficiente e tese firmada em julgamento de casos repetitivos), deve o juiz deferir a tutela provisória da evidência (art. 311).
A tutela provisória — tanto de urgência, quanto da evidência — permite que o titular do direito comece a usufruir o bem da vida a que (aparentemente) faz jus ainda durante o curso do procedimento, antes mesmo da prolação da sentença.
Não custa lembrar que toda decisão interlocutória, não apenas a que defere tutela provisória, é dotada de eficácia imediata. Afinal, todos os recursos cabíveis contra as interlocutórias — agravo de instrumento (art. 1.015) ou apelação/contrarrazões à apelação (art. 1.009, §§ 1º e 2º) — são desprovidos de efeito suspensivo automático (ope legis), como asseverado pelo art. 995.
Finalmente, caso o juiz considere que parte do pedido, ou algum dos pedidos cumulados esteja maduro para julgamento antes dos demais ou pronto para resolução em relação a algum dos litisconsortes, pode o juiz proferir, de imediato, “sentença parcial”.
Essa nova técnica do “julgamento antecipado parcial do mérito” (art. 356) enseja que o juiz profira decisão definitiva, fundada em cognição exauriente, apta a formar coisa julgada material, sempre que um pedido, ou parte dele, estiver maduro para julgamento em relação a algum dos litisconsortes partes, não obstante ainda ser necessário que o procedimento continue se desenvolvendo, com instrução probatória, para resolução dos pedidos restantes em relação às demais partes.
Em outras palavras, tudo o que já estiver maduro para julgamento pode ser tornar objeto de “sentença parcial” imediata, enquanto o restante da causa prossegue, em paralelo, para instrução e julgamento.
Por seu turno, em grau de tribunal, está o relator dotado do dever-poder de “apreciar o pedido de tutela provisória nos recursos e nos processos de competência originária do tribunal” (art. 932, II), sendo-lhe permitido conferir, de modo provisório, a tutela pleiteada ao final, independentemente de se tratar de instância ordinária ou excepcional. Foram mantidos, ainda, os poderes do relator de, em determinadas hipóteses, proferir o julgamento final já de modo imediato e mediante decisão singular, sem que o feito seja levado ao colegiado (art. 932, IV e V).
No que tange à “execução provisória”, o art. 521 amplia as hipóteses em que o exequente está dispensado de prestar caução. Permite-se que execução alcance a fase satisfativa antes mesmo do trânsito em julgado e a despeito de inexistir prestação de garantia para o caso de eventual reversão do julgamento em grau recursal. Essa ampliação da dispensa da caução vai ao encontro do art. 4º, que consagra o direito das partes de “obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa”.
Como se vê, o CPC/2015 dota os magistrados, em qualquer grau de jurisdição, de um arsenal de mecanismos capazes de conferir maior efetividade às decisões judiciais e, por consequência, de antecipar a fruição, pelo titular do direito, do bem da vida a que faz jus.
Permite o novo Código, portanto, uma maior “efetividade” da tutela jurisdicional, não obstante o procedimento provavelmente não vir a se tornar necessariamente mais “célere”. E não há qualquer incoerência nisso, já que “efetividade” e “celeridade”, ao menos para o Direito Processual Civil, não são — nem nunca foram — sinônimos obrigatórios...
Bruno Garcia Redondo é Doutorando e Mestre em Direito Processual Civil pela PUC-SP. Professor efetivo de Direito na PUC-Rio e UFRJ. Procurador. Advogado. bruno@garcia-redondo.com
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