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16 de Junho de 2024
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    Entrevista - Nena Sales (Diretora-presidente do IBDFAM-PA)

    Com 13 anos de carreira, a advogada Nena Sales Pinheiro foi reeleita diretora-presidente do IBDFAM - Instituto Brasileiro de Direito de Família - no Pará. Nesta entrevista, ela fala sobre sua área de atuação, os avanços e obstáculos do Direito de Família no Brasil e sobre o trabalho desenvolvido pelo instituto que ela comandará pelos próximos dois anos

    Troppo - A sociedade brasileira ainda desconhece o Direito de Família?

    Nena Sales - Em geral, ainda há pouca consciência e conhecimento de seus direitos e de como reclamá-los perante o juiz. Esse desconhecimento é maior no que tange aos direitos e obrigações patrimoniais e sucessórios, sendo freqüentes as dúvidas sobre o regime de divisão de bens no casamento ou na união estável, e sobre direitos hereditários.

    Troppo - Mesmo assim há muitos processos nas varas de família que provocam lentidão na resolução dos casos. Qual a solução?

    Nena Sales - A solução é investir em meios alternativos de pacificação social, incentivando a conciliação e adotando a técnica da mediação familiar. O Tribunal de Justiça do Estado implantará, em junho, um Núcleo de Mediação de Conflito, formado por uma equipe interdisciplinar que conta com 23 mediadores capacitados. O juiz da Vara de Família ao constatar que se trata de conflito de alta litigiosidade, principalmente quando envolver interesses de menores, encaminhará o processo para o Núcleo de Mediação que atuará de forma inovadora na abordagem jurídica, como alternativa ao sistema tradicional judiciário para tratar os conflitos.

    Troppo - Qual demanda é mais difícil de ser resolvida?

    Nena Sales - As que envolvem briga pessoal de marido e mulher, com orgulho ferido, diante do alto estado de beligerância entre as partes, que levam para o juiz seus conflitos mais íntimos, pretendendo proteção sob o que consideram uma agressão pessoal praticada pela outra parte. Do ponto de vista técnico jurídico, as questões mais complexas são as que envolvem as sofisticadas fraudes aos direitos patrimoniais do outro cônjuge. Há pessoas que fazem de tudo para esconder o patrimônio obtido durante a união para evitar que seja divido com o ex. São fraudes que podem ser detectadas e combatidas.

    Troppo - Qual foi o caso mais marcante que chegou até a senhora?

    Nena Sales - O caso mais difícil que advoguei envolvia dois temas muitos polêmicos: a homossexualidade e a alienação parental. Minha cliente estava há quatro anos sem ver os cinco filhos menores porque o marido, que ficou com a guarda das crianças, conseguiu suspender judicialmente o direito de visitação. A visitação foi retomada e acompanhada pelas assistentes sociais e psicólogas das Varas de Família visando o trabalho de recomposição do afeto entre mãe e os filhos. A mãe assumiu perante o juiz a sua orientação homossexual e enfrentou o forte preconceito do marido. Trata-se de alienação parental, uma grave situação que ocorre dentro das relações de família, em que após o término da vida conjugal, o genitor guardião, por um sentimento de vingança, começa a destruir a imagem que o filho guarda do outro genitor. Assim, o agressor acaba fazendo duas vítimas: a criança, que é constantemente colocada sob tensão e 'programada' para odiar o outro genitor, sofrendo profundamente durante o processo; e o ex-cônjuge que vê sua imagem completamente destruída perante o filho e amarga imenso sofrimento.

    Troppo - Como está o Direito de Família brasileiro em relação ao de outros países?

    Nena Sales - Ainda tem um perfil conservador, por sua forte tradição cristã. Daí a resistência no Brasil aos avanços da bioética, como inseminação artificial, pesquisa com células-tronco, fecundação artificial post mortem e, ainda, a pluralidade das relações familiares, principalmente diante das novas entidades e tipos de famílias, como a monoparental, a socioafetiva e a homoafetiva. Ainda é muito forte o modelo de família tradicional representado por homem, mulher e filhos unidos pelo casamento.

    Troppo - Quais os direitos reais de uma família que sai do padrão geral, como a formada por homossexuais?

    Nena Sales - O direito à orientação sexual integra a identidade da pessoa e é, por isso mesmo, direito personalíssimo elevado ao estatuto de direito fundamental. Nossos tribunais reconhecem as uniões homoafetivas como entidades familiares fixando a competência do juízo especializado em Direito de Família para discussão da matéria. E há inúmeros julgados reconhecendo esses direitos, entre os quais o direito do sobrevivente de receber benefícios previdenciários decorrentes do plano de previdência privada do qual o falecido companheiro era participante, com os idênticos efeitos da união estável; o direito real de habitação no imóvel no qual o companheiro residia com o falecido; a garantia ao companheiro da totalidade do acervo hereditário; o reconhecimento de inelegibilidade oriunda de uma relação homoafetiva, e mais recentemente, dia 27/04/10, em decisão unânime, o STJ manteve entendimento inovador que permitiu a adoção de duas crianças por um casal de mulheres. Os magistrados ratificaram entendimento já consolidado pelo STJ: nos casos de adoção, deve prevalecer sempre o melhor interesse da criança.

    Troppo - A senhora foi reeleita para comandar por mais dois anos o IBDFAM-PA. Qual é o trabalho que o Instituto desenvolve?

    Nena Sales - O IBDFAM é uma associação que tem por finalidade promover e transmitir, em caráter interdisciplinar, estudos, pesquisas e discussões, sobre as relações de família e sucessões a todos os seus membros e à sociedade em geral. O paraense interessado poderá se associar ao IBDFAM e receber em casa o Boletim IBDFAM e o boletim eletrônico sobre as ações do instituto em âmbito nacional e sobre as novidades do Direito de Família em geral. Para se associar basta entrar no site www.ibdfam.org.br e seguir os passos indicados para a inscrição.

    Troppo - Quais as ações que o IBDFAM -PA realizará nesse biênio?

    Nena Sales - Estabelecerá parcerias com as escolas superiores de Direito e ciências afins, da Magistratura, do Ministério Público, da Advocacia para a realização de atividades conjuntas, visando aprimorar e refinar a atuação técnica como forma de melhor resolver as questões familiaristas. Promoveremos o V Congresso Paraense de Direito de Família com a participação de expressivos palestrantes paraenses e nacionais que abordarão temas importantes do Direito de Família. Nos dias 26 e 27 de setembro, realizaremos o III Encontro de Direito de Família em Santarém, cidade onde fundamos um Núcleo do IBDFAM, na gestão passada. Planejamos, ainda, a fundação de novos Núcleos do IBDFAM em outros municípios de nosso Estado.

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