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16 de Junho de 2024
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    Fase de execução: desembargador Manoel Carlos Toledo Filho participa de reforma processual no Chile

    De geografia das mais curiosas - mais de quatro mil quilômetros de extensão de norte a sul, porém menos de 200 de leste a oeste -, o Chile comemorou invejáveis 6,1% de crescimento econômico no ano passado (fonte: Associated Press), em plena crise mundial. Para 2012, a estimativa do Banco Central do país é de expansão da economia entre 4,5% e 5%.

    A Justiça do Trabalho chilena, com um bem sucedido sistema de processo judicial eletrônico já implantado na fase de conhecimento (anterior à sentença), também vai muito bem, obrigado. Ou em parte, na verdade, porque o mesmo não se pode dizer da fase de execução, que, se no Brasil é um “gargalo” que a JT se esforça em transpor, no Chile se encontra em estágio ainda pior, desprovida, por exemplo, das ferramentas on-line (BacenJud etc.) que os tribunais brasileiros, em especial os trabalhistas, já adotaram.

    É um verdadeiro “nó górdio” à moda chilena. Para desfazer esse nó, magistrados, advogados e outros especialistas do país, incluindo representantes da Organização Internacional do Trabalho (OIT), trabalham numa reforma processual focada na execução. E o grupo conta com a participação de um desembargador do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 15ª Região, Manoel Carlos Toledo Filho, da 4ª Câmara da Corte. No dia 18 de julho, em Santiago, ele debateu o assunto com os colegas Paola Díaz Urtubia e Álvaro Flores, juízes do trabalho, e com os advogados Diego Corvera, presidente da Asociación Gremial de Abogados Laboralistas de Chile, Natalie Reyes, representante do Centro de Estudios de Justicia de las Américas (CEJA), Rodolfo Caballero Muñoz e Ariel Rossel Zuñiga. A OIT foi representada no encontro pela oficial de programação Patricia Roa, da Subregional para o Cone Sul da América Latina. Na ocasião, o desembargador se reuniu ainda com outra integrante da OIT, a Especialista Principal em Normas Internacionais do Trabalho e Relações Trabalhistas, Kirsten-Maria Schapira-Felderhoff.

    Mestre e doutor pela Universidade de São Paulo (USP), Manoel Carlos é professor do curso de especialização em Direito Material e Processual do Trabalho na Pontifícia Universidade Católica (PUC) de Campinas. Leciona também, como professor convidado, na pós-graduação da Universidade Nacional de Córdoba, na Argentina. Estudioso do Direito Comparado, faz parte das associações argentina e uruguaia de Direito do Trabalho e da Seguridade Social e é membro honorário da Asociación de Abogados Laboralistas del Paraguay.

    Em seu gabinete, na sede do TRT, em Campinas, o desembargador falou ao Setor de Imprensa do Tribunal sobre sua participação na reforma processual chilena:

    Setor de Imprensa: Como são as relações trabalhistas no Chile?

    Desembargador Manoel Carlos Toledo Filho: São mais complicadas no plano do direito coletivo. Os sindicatos chilenos são pouco organizados, segundo advogados e outros especialistas do país. O percentual de filiação é pequeno, apesar de o Chile ter ratificado a Convenção 87 da OIT [que trata da liberdade sindical e da proteção do direito de sindicalização]. No plano do direito individual, as previsões legais são muito parecidas com as nossas.

    SI: Em que pé está o processo trabalhista chileno?

    Des. Manoel Carlos: Vai muito bem na fase de conhecimento, que está totalmente informatizada, já não há mais papel. Isso que a gente está implantando aqui, o Processo Judicial Eletrônico, eles já fizeram lá, com bons resultados. O processo trabalhista está sendo instruído e julgado em cerca de três meses, e não há recurso quanto à matéria de fato. Mas na execução não houve reforma, apenas umas poucas modificações, e têm havido problemas na viabilização da sentença.

    SI: À semelhança do nosso processo trabalhista?

    Des. Manoel Carlos: Sim, mas, no caso deles, é um pouco pior.

    SI: Pior?

    Des. Manoel Carlos: Sim, porque eles ainda não têm a possibilidade de usar, por exemplo, a penhora on-line [permite penhorar o valor da dívida diretamente em contas correntes ou aplicações financeiras de titularidade do devedor, por meio de convênio com o Banco Central, o BacenJud]e outras ferramentas eletrônicas de execução, como o Infojud [dá aos juízes acesso ao banco de dados da Receita Federal, para localização de bens ou endereços dos devedores] e o Renajud [para bloqueios de veículos, uma parceria com o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran)].

    SI: Então, na reunião do dia 18, em Santiago, foram debatidas as propostas de mudança na execução?

    Des. Manoel Carlos: Sim, e inclusive com a participação de uma representante da CEJA, instituição vinculada à OEA [Organização dos Estados Americanos] e que participa de todos os projetos e atividades relacionados ao aprimoramento da Justiça no continente. O principal tema em discussão foi mesmo a penhora on-line. Eles queriam saber como funciona, como surgiu... E além de os chilenos não terem ainda nenhuma ferramenta eletrônica de execução, desconsiderar a personalidade jurídica, a fim de atingir diretamente bens dos sócios da executada, é algo complicado para eles.

    SI: Não há previsão legal para isso?

    Des. Manoel Carlos: Não há previsão legal específica, como existe aqui, o que também dificulta a viabilização da execução.

    SI: Como vão ser encaminhadas as propostas?

    Des. Manoel Carlos: Esse grupo de trabalho vai compilar todos os dados e sugestões a respeito, não apenas dessa reunião, e vão encaminhar ao Congresso chileno, propondo as mudanças, que devem ir além do processo trabalhista. Assim como aqui no Brasil, os chilenos estão em vias de aprovar um novo Código de Processo Civil, no qual também estão previstas modificações na execução, tentando torná-la mais dinâmica.

    SI: Em matéria de legislação trabalhista, os chilenos possuem alguma espécie de consolidação, como a CLT?

    Des. Manoel Carlos: Eles têm um Código do Trabalho muito parecido com a nossa CLT. A primeira parte traz o direito material, e a segunda, o processual.

    SI: E já houve alguma reformulação anterior?

    Des. Manoel Carlos: Houve várias reformulações, sobretudo no Direito Processual e no que se refere à terceirização. Eles implementaram a responsabilidade solidária de todos os envolvidos, a qual só não ocorre se o tomador de serviços exerce efetivamente o dever de vigilância sobre o prestador, circunstância em que a responsabilidade passa a ser supletiva. O sistema é muito parecido com o do Uruguai, que, aliás, de certa forma se inspirou na reforma chilena para reformar sua legislação.

    SI: A reforma na execução no Chile teria um caráter apenas técnico, de implantação de ferramentas on-line, ou envolveria também novas modificações legislativas?

    Des. Manoel Carlos: Na realidade, seria reformular o contexto geral dos procedimentos na fase de execução do processo judicial, não só o trabalhista, mas o civil também, e aí então uma das opções a mais que se teria seriam a penhora on-line e as outras ferramentas de constrição via Internet. A execução, na forma como ela existe hoje no Chile, não está se mostrando eficiente.

    SI: A ideia é estabelecer previsão legal para a adoção dessas ferramentas ou proceder como foi feito aqui, adotando-as mesmo sem a previsão em lei?

    Des. Manoel Carlos: O ideal seria com previsão legal. A penhora on-line começou no Brasil sem uma previsão legal específica, havia só uma previsão contextual. Essa previsão contextual que nós tínhamos à época [2001] os chilenos têm hoje. É mais uma questão de vencer a barreira que esse tipo de inovação costuma enfrentar. No Brasil, de início, muita gente achava que a penhora on-line era um absurdo, um abuso... Mas com o tempo ela foi vencendo gradativamente essas resistências. Assim, eu acho que, do mesmo jeito que começamos aqui, os chilenos podem começar lá. Eles têm a mesma base legal e toda a estrutura necessária. Mas é claro que, se houver previsão legal especifica, fica mais fácil.

    SI: Quais os próximos passos do grupo de trabalho?

    Des. Manoel Carlos: Eles já estão praticamente na fase de conclusão dos trabalhos. Devo voltar ao Chile em setembro, para participar de um congresso internacional [XX Congreso Mundial de Derecho del Trabajo y Seguridad Social, de 25 a 28 de setembro, em Santiago], oportunidade em que poderei constatar pessoalmente como o debate evoluiu. Além disso, no dia a dia eu mantenho contato com os integrantes do grupo, pela Internet.

    SI: Tecnicamente falando, implantar a penhora on-line não é nenhum bicho de sete cabeças...

    Des. Manoel Carlos: É fácil até. É mais uma questão de vencer a resistência ao uso de uma ferramenta que sabidamente vai bloquear o dinheiro de muita gente, como aconteceu no Brasil. Num primeiro momento, muita gente se assustou, porque era muito rápido. Acabou gerando uma resistência inicial que teve de ser vencida.

    SI: As pessoas não estão acostumadas com uma justiça mais efetiva...

    Des. Manoel Carlos: Exato.

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