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2 de Maio de 2024
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    Fragmentação da representação sindical dos trabalhadores rurais é apontada como maior desafio à negociação coletiva equilibrada no campo

    Apresentado pelo desembargador Edmundo Fraga Lopes, vice-presidente judicial do TRT-15, o 4º painel do XVIII Congresso de Direito do Trabalho Rural da 15ª Região teve como tema "Sindicalismo e negociação coletiva: desafios e limitações". Os painelistas convidados foram Jotalune Dias dos Santos, presidente da Feraesp (Federação dos Empregados Rurais Assalariados do Estado de São Paulo), e o desembargador Francisco Alberto da Motta Peixoto Giordani, diretor da Escola Judicial (Ejud) do TRT-15 no biênio 2014-2016. O desembargador Edmundo Fraga Lopes destacou a alegria de estar novamente em São José do Rio Preto, dezenove anos após a realização do primeiro congresso de Direito Rural do TRT-15 naquela cidade. Ele rogou que as discussões do conclave possam auxiliar os operadores do Direito do Trabalho a enfrentarem as novas demandas que surgirão com a Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017), apontando que a entrada em vigor do diploma implicará ampliação do trabalho precário.

    Jotalune Dias dos Santos é natural de São João do Piauí-PI e migrou com os pais para o Estado de São Paulo ainda pequeno. Com 14 anos de idade teve seu primeiro vínculo empregatício anotado em carteira de trabalho, na cidade de Echaporã, onde trabalhou numa fazenda de gado leiteiro. Aos 18 anos ele começou a trabalhar no corte da cana-de açúcar, quando iniciou sua militância no Sindicato dos Empregados Rurais de Cândido Mota, do qual foi presidente. Ele compôs o conselho fiscal da Feraesp e foi eleito presidente da entidade no congresso de março de 2017.

    O presidente da Feraesp agradeceu o convite para apresentar "o ponto de vista do movimento sindical dos trabalhadores do setor rural do Estado de São Paulo" e destacou a tradição de participação da entidade nos congressos de Direito Rural do TRT-15. Ele contou que a Feraesp nasceu em 1989, com o objetivo de representar exclusivamente os assalariados rurais, pois as organizações sindicais no campo até então congregavam em uma mesma entidade os pequenos produtores rurais (agricultura familiar) e os empregados rurais, que têm interesses diferentes, pois os primeiros necessitam prioritariamente de custeio e assistência técnica para a produção e os empregados rurais buscam melhores salários e condições de trabalho.

    Jotalune disse que hoje o grande desafio da Feraesp é unificar a representação dos assalariados rurais, pois a dispersão desequilibra a negociação coletiva, e anotou que "em São Paulo temos enfrentado o capital multinacional com sindicatos de base local, aí é 10x0 contra os trabalhadores!". Ele relatou que esteve na sede da OIT (Organização Internacional do Trabalho), em Genébra/Suíça, para apresentar denúncias contra grupos internacionais que atuam no Brasil, e percebeu que uma das grandes preocupações da OIT é a relação predatória do "capital internacional sobre as economias locais".

    Criticando o que chamou de "deforma" trabalhista (Lei 13.467/2017), Jotalune afirmou que no Brasil se vive hoje exclusivamente sob "a lei do mercado, e que quem fala em direito social parece estar cometendo um crime". Ainda assim, o presidente da Feraesp disse que a Reforma gerou um efeito positivo, que foi o de unir as seis maiores centrais sindicais do país e "esquecer as cores das bandeiras por um entendimento comum de que todos perdem com a reforma". Ele também anotou que a OIT teria se manifestado em consultas informais no sentido de que haveria inúmeras incompatibilidades do texto da reforma em face de tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, mas que a estratégia no momento seria de ainda não acionar o STF e aguardar o posicionamento de outras esferas do Judiciário.

    Retomando a questão da fragmentação da representação dos assalariados rurais, Jotalune disse que o artigo 2º do Estatuto do trabalho rural [lei 5.889/73] caracteriza taxativamente o empregado rural como aquele que presta serviços de natureza não eventual a empregador rural, de modo que não haveria margem para a atração de outros sindicatos ou reconhecimento de categorias diferenciadas no meio rural, como ocorre com químicos e motoristas das usinas de açúcar e álcool. Ele diz que "a profissão é diferenciada, mas que não há categoria diferenciada", e que o afastamento da representação dos sindicatos de trabalhadores rurais só contribui para a divisão e enfraquecimento da negociação coletiva no setor.

    No mesmo sentido, o presidente da Feraesp alertou para o risco da criação de representação exclusiva de trabalhadores ligados a determinados produtos rurais, como o de uma federação de cortadores de cana-de-açúcar, e disse "imaginem se tivéssemos sindicatos dos trabalhadores da laranja, do feijão, do tomate", apontando que "estamos lutando contra o capital internacional globalizado e não podemos cair na da pulverização sindical", que serviria apenas a alguns "espertalhões que visam a receber a contribuição sindical".

    Um cidadão contra a Reforma Trabalhista

    O desembargador do TRT-15 Francisco Alberto da Motta Peixoto Giordani, que também é membro fundador da Academia Nacional de Direito Desportivo (ANDD), disse que o país atravessa uma situação delicada, na qual estaríamos na eminência de um "Estado de sujeição laboral", decorrente dos interesses e desejos daqueles que elaboraram a Reforma Trabalhista. Giordani afimou que a reforma foi muito dura pois "passou por cima dos ensinamentos de grandes juristas que demonstraram a necessidade do Direito do Trabalho", e apontou que "aqueles que tem que observar a lei agora é que estão dizendo como a lei deve ser".

    A despeito do orgulho de ser juiz de carreira, Giordani realçou estar falando na condição de cidadão brasileiro, e disse que por trás da alteração da legislação trabalhista há um equívoco brutal, pois o "Estado-social não é gordura, é músculo, é força para a sociedade". Ele destacou ainda a existência de uma "cultura do medo" no país que intimida as pessoas para conseguir impor os retrocessos. Como exemplo, registrou a ameaça de que sem a mudança na CLT haveria perda da competitividade internacional dos produtos brasileiros e, por consequência, não haveria geração de empregos.

    Porém, o desembargador alertou que a sociedade brasileira não está em condições de dispensar a proteção do Direito do Trabalho tanto quanto ainda é necessário manter a tutela dispensada ao consumidor no Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90) ou ao locatário na Lei do Inquilinato (8.245/91), postos que todos são hipossuficientes nas respectivas relações de direito em que participam. Crítico, Giordani disse que o nível de desregulamentação das relações de trabalho que está sendo promovido vai criar um "shopping humano" de trabalhadores.

    Por outro lado, Giordani destacou a importância dos sindicatos nesse momento e, em diálogo com o primeiro painelista, disse que antes de qualquer reforma trabalhista seria imprescindível uma reforma na estrutura sindical, com objetivo de atender ao princípio da liberdade sindical e garantir o pluralismo sindical. Assim, os sindicatos seriam obrigados a atuar de forma mais intensa para garantirem a filiação dos trabalhadores e, em decorrência, sua sustentação financeira. Giordani disse ainda que a Reforma Trabalhista gerou uma chance única, ainda que involuntária, aos sindicatos, dando-lhes a oportunidade de se "fortalecerem e se aproximarem de suas bases", pois se o novo artigo 611-A da CLT permite a prevalência do negociado sobre o legislado, "isso deve ser usado pelos sindicatos para que regras prejudiciais aos trabalhadores não prevalecem nos instrumentos coletivos".

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