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2 de Maio de 2024
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    Habeas Pinho

    há 9 anos

    Na Paraíba, alguns elementos que faziam uma serena foram presos. Embora liberados no dia seguinte, o violão foi detido. Tomando conhecimento do acontecido. o famoso poeta e senador Ronaldo Cunha Lima, já falecido, enviou uma petição ao Juiz da Comarca, em versos, solicitando a liberação do instrumento musical.

    Eis a peça redigida pelo advogado Senador Ronaldo Cunha Lima:

    Exmo. Sr. Juiz Roberto Pessoa de Sousa.

    O instrumento do “crime” , que se arrola
    Nesse processo de contravenção
    Não é faca, revolver ou pistola,
    Simplesmente, Doutor, é um violão.

    Um violão, doutor, que em verdade
    Não feriu nem matou um cidadão
    Feriu, sim, mas a sensibilidade
    De quem o ouviu vibrar na solidão.

    O violão é sempre uma ternura,
    Instrumento de amor e de saudade
    O crime a ele nunca se mistura
    Entre ambos inexiste afinidade.

    O violão é próprio dos cantores
    Dos menestréis de alma enternecida
    Que cantam mágoas que povoam a vida
    E sufocam as suas próprias dores.

    O violão é música e é canção
    É sentimento, é vida, é alegria
    É pureza e é néctar que extasia
    É adorno espiritual do coração.

    Seu viver, como o nosso, é transitório.
    Mas seu destino, não, se perpetua.
    Ele nasceu para cantar na rua
    E não para ser arquivo de Cartório.

    Ele, Doutor, que suave lenitivo
    Para a alma da noite em solidão,
    Não se adapta, jamais, em um arquivo
    Sem gemer sua prima e seu bordão

    Mande entregá-lo, pelo amor da noite
    Que se sente vazia em suas horas,
    Para que volte a sentir o terno acoite
    De suas cordas finas e sonoras.

    Liberte o violão, Doutor Juiz,
    Em nome da Justiça e do Direito.
    É crime, porventura, o infeliz
    Cantar as mágoas que lhe enchem o peito?

    Será crime, afinal, será pecado,
    Será delito de tão vis horrores,
    Perambular na rua um desgraçado
    Derramando nas praças suas dores?

    Mande, pois, libertá-lo da agonia
    (a consciência assim nos insinua)
    Não sufoque o cantar que vem da rua,
    Que vem da noite para saudar o dia.

    É o apelo que aqui lhe dirigimos,
    Na certeza do seu acolhimento
    Juntada desta aos autos nós pedimos
    E pedimos, enfim, deferimento.

    Recebida a petição inicial pelo Juiz, este proferiu a seguinte decisão, também em versos:

    Recebo a petição escrita em verso
    E, despachando-a sem autuação,
    Verbero o ato vil, rude e perverso,
    Que prende, no Cartório, um violão.

    Emudecer a prima e o bordão,
    Nos confins de um arquivo, em sombra imerso,
    É desumana e vil destruição
    De tudo que há de belo no universo.

    Que seja Sol, ainda que a desoras,
    E volte á rua, em vida transviada,
    Num esbanjar de lágrimas sonoras.

    Se grato for, acaso ao que lhe fiz,
    Noite de luz, plena madrugada,
    Venha tocar á porta do Juiz.

    (a) Roberto Pessoa de Sousa, Juiz de Direito.

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    4 Comentários

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    E o juiz ainda respondeu em soneto... continuar lendo

    É, de deixar orgulhosos, a todos que leem, quando se mistura a arte em prosa, versada. E a reposta da petição, sem os vergões jurídicos. Chamaria de sonetos poéticos, que encanta um pedaço da nossa profissão, a melhor homenagem que podemos ilustrar é reconhecer o subscritor, como poeta jurídico, e o reconhecimento do I. Juiz, no melhor da prosa poética jurídica. Que tantos outros surjam, para podermos nos orgulhar, que de tantas sinfonias jurídicas ,possam repousar em bons olhos e ouvidos. Parabéns continuar lendo

    Simplesmente fantástica essa petição!!
    Maravilhosa.... continuar lendo

    Que obra prima da suprema poesia
    Que fará parte do processo e da ação
    Cumprimento os doutores com alegria
    e mais ainda o afortunado violão. continuar lendo