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17 de Junho de 2024
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    Hospital psiquiátrico do Piauí será fechado

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    Ação está de acordo com as novas legislações que priorizam a dignidade da pessoa com deficiência

    O Hospital Penitenciário Valter Alencar em Teresina, Piauí, que abriga pacientes com transtorno mental recolhidos ao sistema prisional piauiense será extinto. Um acordo celebrado entre os Poderes Judiciário e Executivo do Piauí determinou a extinção progressiva do hospital. Os internados passarão por triagem e serão encaminhados para a Rede de Atenção Psicossocial do estado.

    Segundo o juiz José Vidal de Freitas, uma inspeção judicial realizada em 2012 constatou que, apesar do Hospital Penitenciário Valter Alencar ser uma unidade prisional cadastrada como hospital de custódia e tratamento psiquiátrico no Departamento Penitenciário Nacional (Depen), do Ministério da Justiça, não dispunha de mínima infraestrutura e condições materiais e de pessoal para manter recolhidos pacientes com transtornos mentais, oferecendo-lhes a assistência médica devida. Ainda de acordo com o juiz, durante a inspeção comprovou-se que apenas um médico e um psiquiatra atendiam uma vez por semana, em um turno, e o hospital não dispunha de medicações, que, quando chegavam, eram distribuídas pelos próprios agentes penitenciários.

    Para a assistente social Denise Duarte Bruno, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), a medida se alinha às diretrizes contidas no novo Estatuto da Pessoa com Deficiência e deve ser pensada a partir de um olhar retrospectivo para o Movimento da Luta Antimanicomial, que surgiu no final da década de 1980, em um encontro de trabalhadores da área de saúde mental e que teve, como uma de suas principais conquistas, a aprovação da Lei 10.216/2001 (Lei Antimanicomial).

    Esta lei determinou o fechamento progressivo dos hospitais psiquiátricos - onde eram encontrados, com muita frequência, abusos e violação de direitos humanos - e a instalação de serviços substitutivos para atendimento dos ex-internos, como os CAPS (Centros de Atenção Psicossocial), as Residências Terapêuticas, Programas de Redução de Danos e os Centros de Convivências, dentre outros.

    “Ao lado desta vinculação às conquistas do movimento antimanicomial, acredito que a extinção progressiva do Hospital Penitenciário Valter Alencar, com a triagem e encaminhamento dos internos para projeto específico na Rede de Atenção Psicossocial, alinha-se às normativas da Lei 13.146/2015, conhecida como Estatuto da Pessoa com Deficiência, onde há a determinação de que todas as pessoas portadoras de deficiência terão garantidos todos os seus direitos quando da aplicação das sanções”, diz Denise Duarte. Um desses direitos, explica, é o direito ao atendimento na rede de saúde, sem o confinamento dos portadores de sofrimento mental a hospitais psiquiátricos, previsto na Lei Antimanicomial.

    “A Luta Antimanicomial e a Lei Antimanicomial não se restringiam aos portadores de transtornos mentais que não tivessem cometido delitos, mas, a toda parcela da população que apresentava este quadro. Considero que o estado do Piauí, com o acordo entre seus Poderes Judiciário e Executivo, coloca em relevo uma forma adequada e corajosa de enfrentar a questão de asilamento dos pacientes com transtorno mental submetidos às medidas penais”, diz.

    Segundo dados do Sistema de Informações Penitenciárias (Infopen-2014), o sistema prisional brasileiro possui 813 homens e 33 mulheres com deficiência intelectual e 2.497 pessoas em cumprimento de medida de segurança na modalidade de internação psiquiátrica. Aproximadamente 85% destas pessoas estão em alas psiquiátricas ou hospitais de custódia e tratamento psiquiátrico, e os 15% restantes em unidades prisionais comuns.

    Para essas pessoas, antes da edição da Lei Antimanicomial, quase sempre a única “terapia” era a internação compulsória em hospital psiquiátrico, tradicionalmente reconhecidos ambientes de exclusão social, violência, morte e torturas.

    Na década de 1990, a partir de experiências com reformas psiquiátricas internacionais, especialmente na Itália, e recomendações da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas) contidas na Carta de Caracas (1990), o Brasil passou a desenhar uma nova política de saúde mental, que se materializou nos dispositivos da Lei 10.216/2011. A Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou o ano de 2001 como o Ano Internacional de Saúde Mental, mesma data em que entrou em vigor a Lei Antimanicomial, ainda pouco conhecida e aplicada nos meios jurídicos. Essa Lei introduziu novo conceito para o atendimento e atenção dos até então chamados “loucos de todos os gêneros”.

    O acordo para extinção do Hospital Penitenciário Valter Alencar trata-se de mais uma estratégia da gestão do ministro Ricardo Lewandowski (STF) a ser oficializada em breve com o intuito de melhorar a qualidade dos espaços prisionais.

    Denise Duarte Bruno considera que essas ações vão trazer benefícios não apenas aos apenados, mas à sociedade em geral, na medida em que cria a perspectiva de reinserção familiar e comunitária de pessoas que, por suas peculiaridades, aderem melhor ao tratamento quando mantidos seus laços familiares e sociais. “E, se a ressocialização se dá de forma mais adequada - e possivelmente mais breve - toda sociedade se beneficia”, destaca.

    “Toda inclusão é positiva, claro. E o sistema prisional tem obviamente menos condição de especialização e tratamento”, concorda a psicanalista Giselle Câmara Groeninga, diretora nacional do IBDFAM.

    “Os transtornos mentais que se traduzem em sofrimento, angústias avassaladoras, podem, sem dúvida, ser mais bem cuidados em instituições apropriadas. Inclusive os delitos cometidos também compreendidos à luz do transtorno, o que não significa elidir a punição. Apenas contextualizar e sopesar as causas determinantes e, no caso, atenuantes”, diz.

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