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16 de Junho de 2024
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    Judiciário / Juizados entrarão em colapso, aponta estudo interno do TJ - Mudança desagradou a todos - Uma difícil equação

    Tribunal suspendeu sessões noturnas mesmo após receber análise que previa problemas para cidadãos. Audiências já ficam para o início de 2010

    O fim das sessões noturnas fará com que os juizados especiais do Paraná entrem em colapso. A previsão consta de um estudo elaborado pelo Tribunal de Justiça do Paraná em dezembro passado. A análise, assinada pelo desembargador Ivan Campos Bortoleto, segundo vice-presidente do TJ e supervisor dos juizados especiais, não impediu que o tribunal suspendesse as audiências noturnas: desde o início do ano, o expediente nos juizados do estado se encerra às 17 horas.

    A determinação do fim das sessões noturnas se deveu a uma necessidade de redução de custos. Os funcionários recebiam uma gratificação para permanecer à noite no trabalho. A gratificação foi criada em 2004 e era paga a cerca de 390 servidores. Com o fim do pagamento extra, as audiências marcadas para depois das 17 horas estão sendo reagendadas. Um levantamento da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Paraná revela que em Curitiba algumas transferências já estão sendo feitas para 2010.

    Avaliação -

    O estudo sobre a gratificação noturna paga a servidores foi solicitado pelo presidente do TJ do Paraná, desembargador José Antônio Vidal Coelho, para avaliar a real necessidade do pagamento extra. No relatório, o desembargador Ivan Campos Bortoleto aponta a impossibilidade de extinção da gratificação, e não vislumbra sequer a revisão do valor pago. Mesmo assim, Vidal Coelho determinou o corte da verba a partir de 1º de janeiro.

    Atualmente, o Paraná possui 41 unidades autônomas do juizado especial e 114 unidades adjuntas, que funcionam com outras varas da Justiça estadual. Pelo relatório, 33% das comarcas do Paraná não possuem espaço físico para realização de audiências dos juizados especiais no período matutino. No período vespertino o problema atinge 47% do total.

    Além do espaço físico, os juizados sofrem com a falta de pessoal. Dos 228 cargos de auxiliar administrativo criados para as unidades adjuntas apenas um havia sido preenchido até outubro de 2008. "Há um flagrante déficit funcional nas unidades adjuntas, que vêm funcionando graças aos serviços prestados por servidores e serventuários do foro judicial em acúmulo de função, pela qual recebem como contraprestação a malsinada gratificação noturna", aponta o relatório.

    Nas unidades autônomas a situação não é diferente, pois dos 539 cargos de auxiliar administrativo previsto na lei, apenas 317 estão ocupados. O estudo da segunda vice-presidência revela que 84% dos funcionários lotados nos juizados especiais realizam atividades após o expediente normal e 66% das unidades afirmam que não podem funcionar apenas no horário normal.

    Procurado pela reportagem da Gazeta do Povo, o desembargador Ivan Bortoleto preferiu não comentar o corte da gratificação. Ele informou que sua opinião está expressa no documento encaminhado à presidência.

    O presidente Vidal Coelho vem sendo procurado desde a semana passada para comentar o assunto, mas não foi localizado. A assessoria de imprensa informou que a posição oficial do TJ foi divulgada em nota, no dia 12 de janeiro. O texto afirma que o trabalho noturno nos juizados especiais foi suspenso em razão da contratação de novos servidores.

    O presidente do Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário do Estado do Paraná (Sindijus-PR), José Roberto Pereira, rebate a afirmação. Ele afirma que não há pessoal suficiente e que nas comarcas de primeira entrância escrivães e oficiais de justiça cumprem dupla jornada para atender os juizados especiais.

    Nova gestão -

    A partir de 2 de fevereiro, novos desembargadores assumem a direção do Tribunal de Justiça do Paraná. Eleito em dezembro, Carlos Augusto Hoffman tomará posse como presidente. A reportagem ligou para o gabinete do desembargador, mas foi informada que ele passaria a tarde em audiência.

    Quem assume a segunda vice-presidência é João Luís Manassés de Albuquerque. O desembargador disse que tem conhecimento da situação dos juizados especiais, porém não comentaria o assunto por ainda não ter assumido o cargo. Ele prometeu estudar o problema assim que tomar posse. Mas, quanto à possibilidade da retomada do pagamento da gratificação, ele afirma que a decisão cabe ao presidente do TJ.

    Mudança desagradou a todos

    A suspensão das audiências no juizado especial durante o período noturno vem causando problemas para todas as partes envolvidas. Os funcionários reclamam da redução no salário por conta da suspensão do adicional noturno e do aumento no volume de trabalho, que agora tem que ser feito por menos pessoas e em menos tempo. Os advogados, por sua vez, lamentam as mudanças nas datas das audiências. E o cidadão que depende da Justiça se sente prejudicado pela demora na resolução dos problemas.

    Maria de Fátima Saldanho foi uma das pessoas que teve o atendimento remarcado. Ela tinha a primeira audiência de um processo contra uma loja de automóveis agendada para o dia 20 de janeiro. Com as mudanças, o encontro só acontecerá no dia 7 de abril. "É complicado, porque já gastei R$ 1,6 mil no conserto do carro, que estava na garantia, e a loja se recusou a pagar. Tive que arcar com o prejuízo. Tinha esperança de resolver isso logo, mas vou ter que esperar mais um pouco" , reclama.

    Assim como ela, o motorista Elias Biora de Souza também terá que aguardar mais para ver o fim de uma briga com uma empresa de transporte. "Um ônibus bateu no meu carro e a empresa se recusou a pagar o conserto. Ainda estou com o carro amassado", conta. Elias também tinha audiência marcada para janeiro e será atendido no início de abril.

    Para o advogado Luiz Antonio Gomes Araújo, que trabalha na área de direitos do consumidor, o impacto das mudanças deverá ser sentido daqui para frente. "As pessoas ainda estão sendo avisadas da remarcação. Acredito que mais para frente sentiremos o impacto. Sabemos que o juizado já trabalha com uma estrutura precária e com essa redução no horário de atendimento fica ainda mais difícil de cumprir seu papel social", comenta.

    Uma difícil equação

    Frederico Eduardo Zenedin Glitz é professor de Direito Civil e Coordenador do Núcleo de Prática Jurídica da UniBrasil.

    Desde o início de janeiro, segundo a imprensa, os juizados especiais cíveis e criminais estão com atendimento suspenso a partir das 17 horas. A medida se impôs em razão da suspensão do pagamento de gratificação aos funcionários que prestam serviço no período noturno. Tratar-se-ia de uma medida de economia de recursos públicos.

    A medida tem gerado críticas, não só daqueles usuários que terão suas audiências remarcadas, como da própria Ordem dos Advogados do Brasil, na figura de seu presidente, que aponta o prejuízo ao cidadão.

    A decisão, na verdade, só demonstra a dificuldade que o Estado brasileiro tem tido para prestar o adequado acesso à Justiça. Inúmeras e conhecidas são as dificuldades: audiências agendadas a perder de vistas, sobrecarga de trabalho dos juízes e cartórios, morosidade processual, etc.

    Este recente caso, contudo, atrai repercussão ainda mais nefasta: atinge em maior grau a parcela da população de menor renda e, portanto, mais suscetível aos prejuízos decorrentes da demora em uma decisão judicial.

    Devemos lembrar que a proposta dos juizados especiais é justamente proporcionar o mais amplo acesso ao Poder Judiciário, mesmo daquelas causas de menor complexidade e, em especial, daqueles que não poderiam arcar com as custas judiciais tradicionais. Este objetivo inicial parece estar se cumprindo, especialmente quando se constata o número de causas ajuizadas e resolvidas anualmente. A limitação material dos juizados acaba, então, refletindo retrocesso.

    O cidadão que busca os juizados especiais está exercendo um de seus direitos mais básicos, que é o acesso à Justiça. Quando encontra, porém, também estas portas fechadas, perde a crença em sua capacidade de participação.

    Se de um lado se fala em construção de uma sociedade mais democrática, justa, humana e digna, por outro se deve atentar que somente com a adequada e célere prestação jurisdicional poderemos transformar a realidade em que vivemos. Negar esse direito é impor alienação.

    Uma solução mágica para este tipo de problema não existe, envolve comprometimento e engajamento. Se de um lado é necessária (e louvável) a economia de recursos públicos, por outro, seu impacto social deve ser também avaliado.

    Fonte: Gazeta do Povo

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