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6 de Maio de 2024
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    Juíza Andréa Pachá relata casos de Direito de Família no livro "A Vida não é Justa"

    Era impossível concluir uma audiência sem constatar a impressionante carga dramática ali existente. É assim que a juíza titular da 4ª Vara de Órfãos e Sucessões do Rio de Janeiro, Andréa Pachá, explica como surgiu a ideia de fazer um livro inspirado nos conflitos que presenciou em 15 anos trabalhando em Varas de Famílias. Ela começou a publicar, desde janeiro do ano passado, algumas histórias em sua página no Facebook.

    Diante dos inúmeros compartilhamentos e da identificação que sentiu com os leitores, Andréa Pachá reuniu alguns casos no livro A vida não é justa, lançado em 2012 pela Editora Agir. Entre estes, relata um procedimento administrativo para sepultamento de um bebê que estava há um mês no Instituto Médico Legal. Nesta entrevista, além de outros aspectos da obra, Andréa avalia os avanços e deficiências no Direito de Família.

    Como surgiu a ideia do livro?

    O livro nasceu de um processo natural da observação e do interesse pelos milhares de conflitos que assisti de um lugar privilegiado, com o olhar de quem está ali para decidir e julgar os processos. Antes de ser juíza, trabalhei com teatro, cinema e dramaturgia. Era impossível concluir uma audiência sem constatar a impressionante carga dramática ali existente. Muitas vezes, tive vontade de registrar em vídeo os depoimentos. São histórias tão ricas de humanidade, tão reveladoras das nossas contradições e precariedades que, além de me emocionar profundamente, percebi que mereciam ser contadas e compartilhadas com muitas pessoas que sentem as mesmas angústias e dores, ainda que em cenários diferentes. Comecei publicando algumas histórias no meu perfil do Facebook, desde janeiro do ano passado. Os amigos começaram a compartilhar o conteúdo e o retorno dos leitores me encorajou a consolidar algumas dessas histórias neste livro.

    Quais das histórias apresentadas mais lhe causaram impacto?

    A maioria das histórias contadas é um acúmulo das muitas histórias similares, ora com os fatos curiosos de um processo, ora de outro. Durante os 15 anos em que permaneci como titular na Vara de Família, não houve um dia em que eu não tenha voltado para casa emocionada ou impactada com algum conflito cotidiano.No entanto, numa das histórias narradas, incluo o nome da parte interessada. Pude narrá-la desta forma porque não era um processo que tramitava em segredo de justiça. Foi um procedimento administrativo para sepultamento de um bebê que estava há um mês no Instituto Médico Legal. O título é O enterro do filho de Édipo. Nunca me senti tão impotente, tão triste. Encerrei as demais audiências e demorei alguns dias para retomar a normalidade.

    Na sua experiência profissional, a senhora acompanhou as mudanças nas famílias brasileiras, o que ensejou muitos avanços no Direito de Família. Quais os avanços que considera mais importantes? Por quê?

    O afeto como elemento estruturante do Direito de Família e o fim dos muitos preconceitos machistas, sexistas, autoritários são, sem dúvida, os avanços mais importantes e significativos. Nenhuma relação é verdadeira quando se sustenta no domínio, na prevalência do mais forte, na obediência sem racionalidade.

    Ao proteger os vulneráveis, ao afirmar a afetividade, o Estado deixa de fortalecer uma única forma de família, que advinha do casamento, e passa a amparar a todos os que pretendem se aglutinar em ambiente de amor, solidariedade, ética, inclusive ampliando a proteção para os casais homoafetivos, que sempre foram discriminados e excluídos. O Estado é mais democrático, os cidadãos têm seus direitos resguardados e ganha a sociedade nesse ambiente de reconhecimento de direitos e de igualdade.

    Quais alterações na lei ainda são necessárias para que o Direito de Família possa atender a todos os arranjos familiares?

    Penso que nunca a legislação será suficiente para atender a todos os arranjos. A família vive em permanente mutação. É importante que o texto legal seja o mais aberto possível para que, quando necessário, o Judiciário possa proteger os direitos, que se renovam diariamente nesse cenário.No entanto, parece contraditório que não haja regulamentação clara quanto ao casamento homoafetivo e que não haja equiparação total da união estável ao casamento.

    Como a Justiça brasileira pode solucionar os entraves e longos prazos relacionados aos processos que envolvem o direito da família?

    As Varas de Família, em geral, são tratadas de maneira muito informal por parte das administrações. Não há Câmaras Especializadas na matéria, falta pessoal qualificado, falta material adequado. Muitas vezes, inexiste equipe multidisciplinar.Seria extremamente importante que se reconhecesse o fato de que é por meio da atuação dos juízes de família que muitos cidadãos forjam a imagem que têm do Judiciário. É o segmento da Justiça mais conhecido e deveria ser mais bem estruturado, inclusive com a formação permanente dos magistrados que atuam nessa área de jurisdição.

    Na visão contemporânea do processo, justiça tardia não é justiça, como diria Rui Barbosa. Em sua opinião, o que poderia ser feito pelo Poder Judiciário para simplificação dos procedimentos, sobretudo para as demandas das famílias?

    O título do meu livro é A vida não é justa. Muitas vezes, a justiça que se busca nas Varas de Família é o restabelecimento do amor que acabou. Não há processo, prazo, simplificação que resolva essa equação: um não ama por dois.É importante que as pessoas que buscam a tutela do Estado entendam a existência de limites para atuação do juiz nos conflitos familiares. Sou uma entusiasta da mediação nas varas de família. Penso que é um bom caminho para simplificar os ritos processuais. E a participação dos advogados é essencial para que as partes se sintam seguras a escolher esse método de composição dos litígios.

    O que a motivou a ser sócia do IBDFAM?

    O IBDFAM reúne os melhores pensadores do Direito de Família no País. É um espaço de reflexão permanente. É uma fonte importantíssima para todos os que atuam nessa área. Mais do que um instituto técnico, é um espaço conectado com os melhores valores de ética, justiça, cidadania e liberdade. Não era possível continuar atuando nessa área

    sem me juntar ao Instituto. Eu disse ao Rodrigo da Cunha Pereira, no último Congresso em Belo Horizonte, que antes mesmo de me associar ao IBDFAM, o nosso vínculo sócio-afetivo já era muito forte e definitivo.

    *Rodrigo da Cunha Pereira - presidente nacional do IBDFAM.

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    Poxa! Só queria muitooo falar com ela ... continuar lendo