Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
16 de Junho de 2024
    Adicione tópicos

    Justiça condena responsáveis por desabamento ocorrido em 1971

    Publicado por Expresso da Notícia
    há 18 anos

    A Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais condenou o Estado de Minas Gerais a indenizar as vítimas do desabamento do Pavilhão de Exposições do Parque da Gameleira, em Belo Horizonte, ocorrido no dia 4 de fevereiro de 1971. O acidente soterrou centenas de operários, causando a morte e a invalidez em muitos deles.

    Também foram condenados solidariamente a construtora Serviços Gerais de Engenharia S.A. (Sergen) e o Departamento de Obras Públicas (Deop), sucessor da Companhia de Desenvolvimento Urbano (Codeurb), órgão responsável pela fiscalização da obra àquela época, que, por sua vez, sucedeu a Companhia Urbanizadora Serra do Curral (Ciurbe). Embora o desabamento tenha ocorrido em 1971, o pedido de indenização julgado só foi ajuizado em 1984. Julgaram o recurso os desembargadores Isalino Lisbôa (relator), Fernando Bráulio e Silas Vieira.

    A indenização a título de danos morais foi fixada em R$ 30 mil para os casos de morte e R$ 25 mil para os casos de invalidez. Ficou determinado ainda, a título de danos materiais, o pagamento de pensão da vítima falecida, até quando completasse 65 anos, no valor correspondente a dois terços do salário recebido na data do acidente. Para os inválidos, a pensão é vitalícia. Todos os valores serão devidamente corrigidos por juros e correção monetária.

    De acordo com o relator Isalino Lisbôa, o valor dos danos morais decorrem de ato ilícito de grave repercussão nacional, "verdadeiro atentado à vida de humildes trabalhadores por absoluta omissão e negligência do Poder Público, que tinha a obrigação de fiscalizar eficazmente a fatídica obra e nada fez". No seu entendimento, o Estado já poderia, há mais de 30 anos, ter resolvido a questão administrativamente, conforme fez em outros casos, "mas relegou e desprezou o direito dos apelados, que tiveram que sobreviver a duras penas pela perda, na maioria dos casos, do responsável único pelo sustento do lar e da família".

    Prescrição

    Preliminarmente, os magistrados divergiram quanto à prescrição do direito a acionar judicialmente a Fazenda Pública, tendo em vista que o pedido de indenização foi ajuizado somente em 1984, após o prazo legal máximo de cinco anos, contados da data do acidente, que aconteceu em 1971. Para os três desembargadores, a prescrição qüinqüenal do fundo de direito contra a Fazenda Pública deixa de existir quando envolver menor absolutamente incapaz. "Verifica-se que, quando do ajuizamento da ação, figuravam no pólo ativo, vários menores. O pedido não envolve direito apenas de viúvas dos trabalhadores mortos, mas também pensão para o sustento dos filhos" , acordou unanimemente a Oitava Câmara Cível.

    Entretanto, o desembargador Silas Vieira discordou dos desembargadores Isalino Lisbôa e Fernando Bráulio, que entenderam que o prazo de cinco anos para a ação judicial começa a correr a partir do momento que a Administração se recusa expressamente a reconhecer o direito das vítimas, o que não se verificou nos autos. "Nunca o Estado ou a Sergen contestaram

    o direito à indenização" , destacaram Isalino Lisbôa e Fernando Bráulio, citando o laudo da comissão investigadora, designada pelo próprio Estado, que conclui pela responsabilidade de todas as empresas e entidades envolvidas na construção do Pavilhão de Exposições.

    "A existência de relatório elaborado a pedido do réu, apontando diversos erros na obra, equivale a verdadeiro reconhecimento de responsabilidade e conduziu as vítimas a acreditarem que os danos seriam reparados administrativamente. A negligência do Ente Público Estatal, que não agiu como logicamente era esperado, não pode dar causa ao reconhecimento da prescrição, de forma a inviabilizar a pretensão dos autores", explicaram os magistrados.

    Os réus são condenados solidariamente, o que faculta aos autores da ação executar a todos, ou a qualquer deles, oportunidade em que a lei reserva possibilidade daquele que quitar integralmente a dívida, reaver parte proporcional cabível aos demais.

    Atraso

    Vários são os fatores que conduziram ao atraso no julgamento da demanda. O processo foi distribuído em 23 de outubro de 1984, tramitando perante a 7ª Vara de Fazenda Pública Estadual e Autarquias, a qual posteriormente denominou-se 4ª Vara. Segundo o desembargador da 11ª Câmara Cível do TJMG, Afrânio Vilela, que julgou o processo como juiz da 1ª Instância, apenas em 19 de novembro de 1999, os autos foram entregues ao cuidados da 5ª Vara de Fazenda Pública e Autarquias. "Após quatro anos naquele Juízo, utilizando de importantes e necessários atos processuais ditados por meus antecessores, e organizando milhares de documentos e folhas, foi possível decidir", esclareceu o magistrado.

    Afrânio Vilela entende que a "pecha de morosidade" não pode se atribuída exclusivamente ao Poder Judiciário, porquanto as partes utilizaram-se dos devidos recursos processuais, garantidos pela Constituição Federal , sob pena de nulidade do processo.

    "Conforme demonstram as diversas certidões constantes nos autos, por inúmeras vezes, as partes, inclusive a autora, retiraram o processo de cartório e com ele ficaram além dos limites do prazo legal, sendo necessária a expedição de notificações aos seus advogados para que

    procedessem a sua devolução", informou o magistrado.

    Outro exemplo, que contribuiu para a demora da ação, foi citado por Afrânio Vilela: "Após diversas tentativas infrutíferas de marcação de perícia médica, os autores, maiores interessados no julgamento rápido do pedido, chegaram ao absurdo de se ausentar, injustificadamente, do exame marcado".

    Em sua sentença, o magistrado apontou a atual legislação processual brasileira como um dos maiores responsáveis pela extrema morosidade na solução das demandas judiciais. "Essa legislação retrógrada, imprecisa, obstaculizadora da plena realização da Justiça, permeada de recursos, de requerimentos sem nexo e de burocracia processual, que impede a rápida prestação jurisdicional", avaliou.

    Para Afrânio Vilela, os legisladores brasileiros precisam alterar as regras dos procedimentos judiciais de ações, para torná-los mais ágeis e mais justos, especialmente para com os cidadãos carentes. "O Judiciário não elabora leis, apenas as interpreta e as aplica, sem delas poder se

    apartar, sob pena de ofender a própria Constituição Federal , que estabelece o devido processo legal com todas as provas que a parte entender possível de ser utilizada em sua defesa", comentou.

    Sobre o excessivo protecionismo legal concedido ao Poder Público, Afrânio Vilela manifestou sua indignação: "No Brasil, é necessário sair da retórica falsa, segundo a qual o acesso à Justiça é direito constitucional, e adotar efetivamente critérios que façam as Autoridades cumprirem os comandos judiciais, dentro de prazo mais razoável e mais moral do que o sistema precatório. E isso não é função do Judiciário, e, sim do Legislativo", frisou.

    O acidente

    Os empregados contratados para a construção do Parque de Exposições de Belo Horizonte, encontravam-se em horário de almoço, quando foi retirada uma das últimas escoras da laje do prédio. Segundo depoimentos das testemunhas, os engenheiros da Sergen já haviam sido advertidos pelos operários dos estalos na estrutura da construção. Um mestre de obras chegou a determinar a 150 homens que providenciassem o "reescoramento" da laje, face ao iminente perigo de desabamento, mas a iniciativa foi interrompida por ordem dos próprios engenheiros da empresa. A dilatação da laje nas vigas, que era de dois centímetros no início da retirada das

    escoras, superava a 15 centímetros por ocasião do desabamento.

    Laudos periciais feitos à época e o parecer da Comissão de Alto Nível designada pelo Estado concluíram que a Sergen, contratada para construir a superestrutura, as instalações elétricas e hidráulicas-sanitárias, foi a responsável pelo acidente. A perícia demonstrou que o concreto utilizado na construção não possuía a resistência pedida pelo calculista, o que contribuiu para aumentar a possibilidade de rompimento da laje. Além disso, a retirada do escoramento não atendeu às normas técnicas de engenharia. "O método utilizado, embora não tenha causado a ruptura, impediu que se avaliasse previamente o desempenho da estrutura, permitindo que o desabamento ocorresse de maneira imprevista", explicou o documento.

    As investigações também revelaram que a Codeurb não procedeu a devida fiscalização da obra, que teve início em 15 de junho de 1969. Somente em 6 de novembro daquele ano é que foi registrada a presença de um de seus funcionários no local.

    Segundo os autos, a falta de integração entre os diversos responsáveis pela edificação do pavilhão ficou provada, pois sequer foi designado o engenheiro responsável pela obra. "A suntuosidade do empreendimento exigia que as decisões fossem concentradas em profissional ou grupo de profissionais dotados de grande capacitação técnica. Contudo, não havia um norte a seguir, desempenhando cada um dos réus suas atribuições como se fossem partes isoladas do conjunto da obra", denunciou o laudo.

    A Sergen alegou que deveria ser excluída do processo, pois mantinha relação de natureza patronal com as vítimas do acidente e que cumpriu com as obrigações contratuais exigidas. Disse que por várias semanas pagou "abono de emergência" às pessoas que se apresentavam como familiares das vítimas. Argumentou não ser dona da obra, mas contratada pela entidade governamental para executar o serviço, sob fiscalização do órgão público, apenas com responsabilidade pelo projeto estrutural. Ainda, segundo a Sergen, a estrutura foi erguida sobre fundações projetadas e executadas por outra firma.

    Já o Estado sustentou que não mantinha nenhuma relação jurídica com os responsáveis pela execução da obra, exceto com a Ciurbe, pelos atos da qual não se considera responsável, por ser simples acionista. Alegou que não tinha obrigação de fiscalizar a obra, já que não era parte nos contratos celebrados com o calculista, com a firma de fundações ou com as firmas de construção civil. Salientou que o simples fato de se tratar de uma obra pública não implica em atribuição de responsabilidade ao Estado.

    • Publicações8583
    • Seguidores176
    Detalhes da publicação
    • Tipo do documentoNotícia
    • Visualizações1368
    De onde vêm as informações do Jusbrasil?
    Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/justica-condena-responsaveis-por-desabamento-ocorrido-em-1971/135565

    Informações relacionadas

    Associação dos Magistrados Mineiros
    Notíciashá 10 anos

    Após 14 horas de trabalho, bombeiros tiram carro dos escombros

    0 Comentários

    Faça um comentário construtivo para esse documento.

    Não use muitas letras maiúsculas, isso denota "GRITAR" ;)