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16 de Junho de 2024
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    Nada a declarar

    há 13 anos

    Fraude contábil no PanAmericano é marcada por informações desencontradas e pouco apreço pelos acionistas.

    Denise Carvalho e Fernando Torres | De São Paulo

    Uma equipe de pelo menos quatro executivos escolhidos pelo BTG Pactual já está dando expediente na sede do PanAmericano, localizada na avenida Paulista, região Sul de São Paulo, 15 dias depois do anúncio da compra do banco que pertenceu ao apresentador Silvio Santos.

    As diretorias dos executivos indicados pelo BTG ainda não foram definidas. Mas o time "já está tomando pé da situação financeira do PanAmericano", segundo executivos ligados à instituição ouvidos pela reportagem. O BTG, de André Esteves, e a Caixa Econômica Federal - sócia do PanAmericano com 35% do capital - começaram a estudar para quais diretorias seus indicados serão nomeados.

    Nada disso foi oficialmente comunicado aos acionistas do PanAmericano, surpreendidos no ano passado por um dos maiores escândalos contábeis dos últimos anos no país. Mas não foi a primeira "falha de comunicação".

    Anteriormente, a nomeação de José Luiz Acar Pedro Filho para o cargo de diretor-superintendente não foi considerada um "fato relevante", já que nenhum comunicado foi enviado ainda à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que fiscaliza o mercado de capitais, ou à BM&FBovespa, onde as ações do banco em apuros continuam a ser negociadas em um dos segmentos reservados para empresas com governança mais avançada, o Nível 1.

    "Vendemos nossas ações no PanAmericano porque nos sentimos como se tivéssemos sido assaltados", diz André Gordon, sócio-fundador e gestor das carteira da GT Investimentos, administradora de recursos. "Não gostamos de participar de empresas que não conseguimos avaliar porque não divulgam informações."

    Procurado pelo Valor, o BTG afirmou, em nota, que "somente após as devidas concordâncias, o banco se pronunciará sobre a composição da diretoria".

    A GT Investimentos comprou papéis do PanAmericano após a descoberta do rombo, de R$ 2,5 bilhões, no início de novembro. Para Gordon, a ocasião parecia perfeita para apostar num banco que, apesar dos problemas encontrados, estava bem posicionado no mercado, com chances de se restabelecer rapidamente.

    O ex-controlador - dono de um conglomerado de 33 empresas, como a rede de televisão SBT e a empresa de cosméticos Jequiti - "não ganhou nada, não perdeu nada", segundo disse aos jornalistas na saída de reunião na sede do BTG na qual selou a venda de seu banco.

    Com o negócio, de R$ 450 milhões, Silvio Santos salvou seu patrimônio, antes dado como garantia para o FGC pelo empréstimo de R$ 2,5 bilhões para cobrir o rombo.

    Na rápida conversa com os jornalistas, Silvio também revelou um segredo: "Não entendo nada de banco". Outra informação relevante que chega tarde aos acionistas. Ela caberia na seção de riscos do prospecto da oferta de ações do banco, realizada em 2007.

    Procurado pela reportagem para comentar o assunto, o PanAmericano não se pronunciou. O Banco Central também não quis se manifestar. Em nota, a Caixa afirma, por sua vez, que, "por determinação da CVM, não poderá prestar outras informações sobre o assunto até a publicação do balanço do PanAmericano".

    Na sexta-feira, a Caixa divulgou lucro de R$ 3,8 bilhões em 2010, 25% acima do ano anterior. O banco estatal decidiu ignorar o impacto do rombo do PanAmericano nos resultados, o que lhe custou uma ressalva (indicação de erro nas contas) do auditor independente.

    O banco argumentou que não tinha informações sobre o tamanho do estrago das chamadas "inconsistências contábeis" do PanAmericano. Por isso, não fez provisão no balanço para absorver o impacto que deve vir a público amanhã, com a divulgação do esperado balanço do terceiro trimestre de 2010 do PanAmericano.

    Atualmente, a diretoria executiva do PanAmericano é composta por oito integrantes. Cinco foram indicados pela CEF: José Henrique Marques da Cruz (comercial), Raphael Rezende Neto (controle e risco), Mário Ferreira Neto (crédito), Celso Zanin (captação e relações com investidores) e Eliel Teixeira de Almeida (cartões). Os outros três são indicações do FGC: Celso Antunes da Costa (superintendente), Ivan Dumont Silva (financeiro e novos negócios) e José Alfredo Lattaro (administrativo). Eles substituíram a antiga diretoria do banco no início de novembro, depois da descoberta da fraude. Embora o executivo José Luiz Acar Pedro Filho já tenha sido anunciado, não há nenhuma menção ao nome dele no site do PanAmericano nem em documentos registrados na CVM. O diretor-superintendente ainda é Celso Antunes da Costa.

    Até sexta-feira, o acionista do PanAmericano que decidisse se informar sobre a situação da instituição com base nos comunicados oficiais saberia apenas que o FGC fez um novo acordo com o grupo Silvio Santos, elevando o valor do aporte total a ser feito no banco de R$ 2,5 bilhões para R$ 3,8 bilhões, no dia 3 de fevereiro (veja quadro).

    Três dias antes, o BTG havia firmado acordo para comprar o PanAmericano. Conforme amplamente noticiado pela imprensa, com declarações de diversas partes, a venda só foi fechada depois de costurado o novo empréstimo do FGC, que aceitou assumir indiretamente o prejuízo da instituição, alegando preocupação com a solidez do sistema financeiro.

    No dia 1º de fevereiro, os jornais disseram que a Caixa compraria R$ 10 bilhões em direitos creditórios e depósitos interfinanceiros, por conta de um acordo operacional firmado entre as empresas. Apesar de ter citado o acordo em fato relevante no dia 31, o PanAmericano só confirmou o valor envolvido na noite do dia 4 de fevereiro, após pedido de esclarecimento da CVM.

    "Como em outros casos problemáticos de governança dos últimos anos, falta transparência e sobram informações desencontradas e pontos de interrogação", avalia Alexandre Di Miceli, professor da USP e coordenador do Centro de Estudos em Governança (CEG) da Fipecafi. Para ele, não houve grande surpresa no surgimento de um caso dessa magnitude. "Infelizmente, muitas empresas adotam apenas a governança para 'inglês ver'. Os investidores aceitam isso e, como resultado, acabam tendo surpresas desagradáveis."

    A CVM foi questionada sobre o fato de o BTG aparentemente ter negociado a aquisição do PanAmericano tendo informação sobre o novo aporte de R$ 1,3 bilhão - sem que a informação tivesse sido amplamente divulgada ao mercado, conforme rezam as boas práticas de governança. Até então, só se sabia, por meio da imprensa, que o rombo era maior e não a solução para ele. Por meio da assessoria de imprensa, a autarquia disse que não comenta o assunto.

    Ao ser questionado se teria tido acesso ao balanço ainda não publicado do banco - referente ao terceiro trimestre de 2010 - o BTG disse, por meio de nota, que teve acesso "a informações gerenciais que deram um panorama da situação atual do PanAmericano".

    João Nogueira Batista, vice-presidente do conselho do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), reconhece que é difícil controlar as informações em operações de fusão e aquisição com grande visibilidade. "Mas esse é o ônus de ser empresa de capital aberto", afirma.

    Em transações de aquisição em que a empresa objeto tem capital aberto, ele destaca que a conduta adequada "é que os controladores desta última mantenham a administração informada o suficiente para comunicar aos acionistas".

    Se isso não ocorrer voluntariamente, cabe aos administradores ir atrás da informação. Caso contrário, "eles podem ser responsabilizados por ação não diligente", diz Nogueira Batista.

    O vice-presidente do IBGC lembra, entretanto, que toda divulgação "encerra em si mesma um risco", que deve ser calculado pela empresa. Assim, ele destaca que, independentemente de se divulgar muita ou pouca informação, o importante é que ela seja o mais uniforme possível.
     

    Registro de perda e aporte causa dúvida

    Para desenhar a estrutura pela qual os minoritários - incluindo a Caixa Econômica Federal - não assumem perda com a bilionária baixa contábil a ser feita no PanAmericano, os agentes envolvidos na operação lançaram mão de uma desconhecida conta, chamada de "Depósito de Acionista".

    Em vez de haver um aumento de capital tradicional, em que todos os acionistas são chamados a aportar mais recursos na companhia, optou-se por uma saída em que o grupo Silvio Santos faz um aporte nessa conta, com os recursos que obteve, em contrato separado, por meio de empréstimo do Fundo Garantidor de Crédito (FGC).

    Embora o valor definitivo das "inconsistências contábeis" não tenha sido divulgado, a sinalização é que essa conta absorverá todas as perdas antes que isso afete o patrimônio do banco.

    Como não há detalhes nos comunicados oficiais sobre o funcionamento dessa conta, o Valor pediu mais detalhes ao PanAmericano, mas não obteve resposta.

    Questões como se há algum tipo de remuneração desse depósito em caso de sobra de saldo, se ele entra ou não na conta do patrimônio de referência do banco ou se ele tem preferência em relação aos acionistas ou credores em caso de falência da instituição não foram esclarecidas.

    Segundo o Valor apurou, não se pensou em nada disso porque o plano é que o valor do aporte case exatamente com as baixas contábeis com a conta recebendo os recursos e ficando sem saldo já no momento seguinte. Dessa forma, isso não afetaria nem o BTG Pactual nem os interesses dos acionistas minoritários.

    Mesmo que as baixas contábeis feitas agora se revelem excessivamente conservadoras e parte das provisões ligadas a carteiras de crédito, por exemplo, seja revertida, não há possibilidade de retorno de dinheiro para o grupo Silvio Santos nem para o FGC, consequentemente.

    Há pelo menos cinco processos na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) ligados ao caso PanAmericano. Dois deles têm como origem reclamação de investidores após o anúncio das "inconsistências contábeis" e tiveram início em novembro.

    Um terceiro, aberto no mesmo mês, foi motivado por negócios envolvendo papéis da companhia. Outro, iniciado em 28 de fevereiro, trata da divulgação de comunicados e fatos relevantes. Por fim, um quinto, com data de 2 de fevereiro, foi aberto para análise da venda do controle da instituição.

    A abertura desses procedimentos internos dentro da CVM não significa que eles se tornarão, necessariamente, processos sancionadores, em que há acusação e julgamento dos envolvidos.

    Conforme o Valor apurou, há minoritários que aguaram a publicação do balanço do banco no terceiro trimestre de 2010, agendada para o dia 15, para decidir se também buscarão seus direitos em outra esfera, como na Justiça.

    Ainda que o empresário Silvio Santos, antigo controlador do banco, tenha dito que estava feliz com a venda da instituição ao BTG Pactual porque nem os minoritários tinham perdido dinheiro, o fato é que as ações ainda estão cotadas 21% abaixo do que estavam antes da divulgação do primeiro rombo, de R$ 2,5 bilhões, no dia 9 de novembro. (FT)

     
    Fonte: Valor Econômico
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    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/nada-a-declarar/2563913

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