O dinheiro é seu, mas é deles
Por Carlos Brickmann, jornalista
Ninguém precisa explicar, a gente sabe. Os bancos e seguradoras são excelentes anunciantes, logo não há muito incentivo para que os meios de comunicação mostrem como é que funcionam no mundo real.
Acontece que os anúncios nos meios de comunicação existem, na maioria esmagadora dos casos, para atingir aos consumidores de informação e convencê-los de sua excelência e solidez. Se o leitor, ouvinte, telespectador ou internauta não for buscar informações nos meios de comunicação, por que é que os anunciantes irão botar lá seu dinheiro?
Equilíbrio, pois. Não é questão ideológica, como a tratada por Proudhon em 'A propriedade é um roubo'; é questão pura e simples de prestação de maus serviços, sempre em prejuízo do cliente - que, por sinal, é também o consumidor de informações, e que vem sendo privado delas em benefício dos anunciantes.
Compre um celular, desses bem caros, e coloque-o no seguro. O pagamento da conta é imediato. Se o aparelho for roubado - bem, depois que o caro colega apresentar toda uma série de documentos, a seguradora se reserva o prazo de dez dias úteis para analisá-los. E, concluída a análise, o pagamento é prometido para daí a 15 dias úteis. Ou seja, durante mais de um mês o segurado é privado de sua propriedade, embora tenha pago caro por ela, embora tenha feito o seu seguro (e, no caminho, sempre surgem outros obstáculos, dúvidas, quedas do sistema, que fazem com que o prazo do pagamento seja ainda maior). Reclamar à supervisão da seguradora?
Perfeito - mas a análise feita por eles demora mais que o tartarugal procedimento para pagar o que devem. Susep, Superintendência dos Seguros Privados? Sim, claro: deve-se procurar diretamente o Saci-Pererê.
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Um leitor tem conta num grande banco estatal, aberta já há algum tempo. Mudou-se para uma cidade a 3.200 km de distância da anterior. E perdeu o cartão da conta. Que fazer? Simples: tem o direito de sacar R$ 100,00 por dia com cheque avulso, com limite de seis saques por semestre. O novo cartão, já solicitado, leva os famosos 15 dias úteis - se não houver problemas. Abrir uma nova conta no novo domicílio e pedir transferência da conta?
Quando tudo estiver pronto, a transferência do seu dinheiro demora de 10 a 15 dias úteis.
Por que? Na era da Internet, da computação, da nuvem, que é que explica a velocidade de diligência dos serviços que lidam com seu dinheiro?
Simples: a gerente da agência onde o nosso leitor quer abrir a conta (agência do mesmo banco) diz que não tem como saber se ele é ele mesmo, embora apresente seus documentos. Afinal, o documento pode ser falsificado, sabe como é. E, na era da digitalização, da comunicação imediata on-line, diz a gerente que não há comunicação entre as agências. Por que ele não viaja 3.200 km para tratar desse assunto na agência anterior?
Dizem que os bancos estatais são mais lentos; mas, na verdade, são tão lentos quanto os privados. Tente resgatar um investimento. O dinheiro cairá na sua conta uns cinco dias (úteis) mais tarde. Dia útil? Computador tem folga? Pois é.
Na verdade, é óbvio: estão usando seu dinheiro para ganhar mais algumas quireras, à sua custa. O dinheiro não fica parado: é aplicado. Mas na conta deles, jamais na sua.
Para os meios de comunicação, é complicado brigar com anunciante. Mas será uma boa opção deixar de fazer a matéria e abandonar seus clientes mais fiéis, aqueles que buscam o veículo para obter informação e opinião?
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carlos@brickmann.com.br
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