Ortotanásia à vista
Por Eudes Quintino de Oliveira Júnior,advogado (OAB-SP nº 35.453) e reitor da Unorp
O projeto do Senador Gerson Camata, que pretende excluir a roupagem de ilicitude da ortotanásia, há nove anos tramita pelo Senado Federal e agora foi aprovado pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania daquela Casa. Ganha corpo e segue para a Câmara dos Deputados.
Faz-se necessária a distinção jurídica entre ortotanásia, eutanásia, distanásia e suicídio assistido. A ortotanásia difere da eutanásia e também da distanásia e do suicídio assistido. A primeira é a suspensão que o médico faz dos meios artificiais para prolongar a vida de um doente terminal, ministrando-lhe, no entanto, medicamentos para diminuir seu sofrimento, além de conferir confortos familiar, psíquico e espiritual.
Já a eutanásia, que na sua origem etimológica significa a boa morte, é a antecipação da morte do doente terminal, atenuando-lhe o sofrimento e dores intoleráveis, com a contribuição efetiva de alguém, ministrando-lhe, por exemplo, alguma droga. A distanásia é a morte lenta e sofrida de um paciente terminal, com a utilização de todo arsenal terapêutico, visando, desta forma, prolongar o processo da morte. O suicídio assistido é quando o próprio paciente passa a ser o agente ativo, com a orientação e auxílio de um médico ou terceiro.
Das formas de decisão sobre a morte, somente a ortotanásia reúne os requisitos de aceitabilidade perante o direito, medicina e religião. Não se coloca em discussão a indisponibilidade da vida e sim o direito do cidadão de definir a respeito do seu fim, buscando a dignidade da morte através do princípio da autonomia.
A Igreja Católica meteu a primeira cunha no assunto quando editou o documento Declaração sobre a Eutanásia, da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, aprovado em maio de 1980. Nele, considera lícita a conduta do médico que, na iminência de uma morte inevitável, depois de ter lançado mão de todos os recursos existentes necessários, renuncia a tratamento que daria somente um prolongamento precário e penoso da vida, sem, contudo, interromper os cuidados normais devidos ao paciente.
O Conselho Federal de Medicina, por sua vez, adiantou-se e pela Resolução nº 185/2006 permitiu ao médico a realização da ortotanásia, isento de qualquer processo administrativo de natureza ética e afastada sua responsabilidade criminal, pois, pelo Código Penal, seria um crime de homicídio. A Resolução foi barrada pela Justiça e seus efeitos suspensos, pois na hierarquia das leis, bateu de frente com o Código Penal.
O projeto que tramita pela Casa Legislativa define o paciente em estado terminal como sendo aquele portador de doença incurável, progressiva e em estágio avançado, com prognóstico de morte próxima.
Paralelamente, institui procedimentos paliativos, mitigadores do sofrimento, com a contribuição de assistência psíquica, social, familiar e espiritual.
O paciente em fase terminal de doença passa a ser o responsável pela autorização da ortotanásia e, na impossibilidade, seus familiares ou seu representante legal, para que o médico suspenda os procedimentos desproporcionais e extraordinários destinados a prolongar artificialmente a vida. Se o paciente, quando lúcido, pronunciou-se contrariamente à ortotanásia, será respeitada sua manifestação.
Se vingar o projeto, a autonomia da vontade humana passa a ser responsável pela questão valorativa da morte digna. O homem não se manifesta a respeito de seu nascimento, mas é tutelado pela legislação desde a vida uterina. Agora, a decidir sobre sua morte, continua protegido.
Bom sinal!
(*) E.mail: eudesojr@hotmail.com
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