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17 de Junho de 2024
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    Patroas fazem fila de espera por empregadas domésticas

    Publicado por Direito Doméstico
    há 12 anos

    Doméstica é mão de obra escassa

    “Hoje, eu coloco as patroas na fila de espera porque tem muita gente procurando por faxineiras e poucas mulheres querendo desempenhar o trabalho”, afirma a diarista Marcília da Silva Matias, com 65 anos de idade e mais de 40 anos de profissão.

    Profissionais como Marcília estão realmente desaparecendo? E quais seriam os motivos da “fuga” de tais trabalhadoras cada vez mais disputados pelo mercado?

    Uma das resposta pode estar exatamente na grande procura pela mão de obra. Segundo a própria diarista, em um passado não muito distante, apenas as famílias mais ricas contratavam empregadas domésticas, hoje, estudantes, pessoas que moram sozinhas, mulheres que trabalham fora, entre outros perfis, procuram pelo serviço: “É fácil encontrar até quem já foi doméstica pagando por tal trabalho. Tenho uma irmã que é exemplo disso. Ela trabalhou como empregada desde bem jovem e hoje tem uma moça que faz esse serviço em sua casa”, acrescenta.

    Por outro lado, o advogado do Sindicato dos Empregadores Domésticos do Estado de São Paulo (Sedesp), aponta que com o incremento da escolaridade das classes C e D e o aumento da oferta de empregos nas áreas de serviço, comércio e indústria, as pessoas não querem mais trabalhar com o serviço doméstico, o que também gera um déficit de profissionais.

    Desvalorizadas

    Bauru tem, hoje, em torno de 3.500 trabalhadores domésticos cadastrados pelo sindicato da categoria. Maria dos Anjos Pereira de Jesus é presidente do Sindicato dos Empregados Domésticos de Bauru e Região. Ela acredita que as mensalistas e diaristas migram para outros setores da economia, principalmente, por causa dos benefícios não garantidos por lei a elas.

    “Uma empregada doméstica não tem hora extra, adicional noturno ou mesmo salário família. E muitas patroas as exploram. Há mensalistas que não têm hora para sair do trabalho, enquanto diversas diaristas reclamam de empregadores que juntam roupas de um mês para passar em uma única faxina. Dessa forma, elas se sentem desvalorizadas, exploradas e buscam outros empregos”.

    Maria dos Anjos ainda ressalta que, para ingressar em outra atividade, as domésticas voltam a estudar ou buscam cursos para aperfeiçoar atividades que já desempenham bem.

    Direitos parecidos, mas não iguais

    Um empregado doméstico com registro em carteira tem direitos semelhantes a qualquer outro profissional, porém, nem todos eles são garantidos pela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) (veja no quadro ao lado os itens garantidos e os não garantidos por lei às domésticas).

    Para o advogado trabalhista Paulo Sérgio Bobri Ribas, a não garantia dos direitos comuns, como o seguro desemprego, é uma injustiça porque a trabalhadora doméstica é uma funcionária como outra qualquer.

    “A alegação é que a empregada doméstica não gera lucro direto ao empregador, o que não procede, já que o trabalho dela permite que os empregadores saiam para trabalhar fora. Ela cuida da casa, da alimentação, da vestimenta e muitas vezes também das crianças. É obvio que ela gera lucro”.

    O recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), que está atrelado ao Seguro Desemprego, um não existe sem o outro, é opcional para o empregador. Contudo, Ribas lembra que nem todas as empregadas domésticas sabem disso.

    “Como isso vai de acordo com a consciência do empregador, muitas chegam até o escritório dizendo que a amiga tem e elas, não. Aí explico a realidade nada justa”, comenta o advogado.

    Segundo Ribas, uma convenção assinada pela maioria dos países da Europa e Estados Unidos estende os mesmos direitos dos demais trabalhadores às domésticas. “Embora o Brasil ainda não tenha ratificado tal convenção, tudo indica que isso, mais cedo ou mais tarde, vai acontecer”, projeta.

    No caso das diaristas, elas não criam vínculo quando trabalham na mesma casa, no máximo, duas vezes na semana, portanto, não têm direitos trabalhistas.

    A partir de março, domésticas paulistas vão ter piso de R$ 690

    Em janeiro, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) anunciou novos valores para o piso salarial regional no Estado de São Paulo, em vigor a partir de março de 2012. Segundo o economista Mauro Gallo, acima do salário mínimo nacional que é de R$ 622,00, o mínimo paulista terá três categorias: R$ 690,00, R$ 700,00 e R$ 710,00.

    O mínimo de R$ 690,00 deverá ser pago a trabalhadores domésticos e outros profissionais com carteira assinada e não protegidos por acordos coletivos negociados por sindicatos, como serventes e trabalhadores rurais, entre outros. Como o aumento surgem dúvidas tanto para esses profissionais, quanto para quem vai contratar. E é preciso colocar tudo na ponta do lápis quando o assunto é o que pesa menos no bolso dos contratantes, e o que é mais rentável para as domésticas.

    Segundo o economista, as profissionais do lar devem levar em conta que, quando diaristas, não têm direito a férias, 13º salário e INSS. O contratante deve atentar para o fato de que deverá arcar com tais despesas, além de outros possíveis gastos como passe de ônibus e alimentação (veja tabela acima). De acordo com as contas apresentadas na tabela, Gallo acredita que contratar uma mensalista é a melhor opção para o empregador. “Se ela trabalhar 22 dias por mês, o custo será de aproximadamente R$ 45,00 por dia”. O que não pode ser deixado de lado é a real necessidade dos serviços. As pessoas que têm filhos pequenos e trabalham fora precisam de uma empregada que vá mais vezes. Já para a doméstica, a faxina é mais interessante, até porque ela pode pagar seu INSS como dona de casa”.

    Profissões ‘servis’ tendem a decair

    Especialistas apontam o “sumiço” das empregadas domésticas como um efeito que tende a se repetir em outras atividades ainda comuns ao brasileiro, mas que já ficaram no passado dos países mais desenvolvidos. É o caso, por exemplo, de profissionais como engraxates, empacotadores, manobristas, cobrador de ônibus, entre outras funções que, com a ajuda da tecnologia, podem ser feitas pelo próprio cliente.

    Em muitas lojas, por exemplo, a diminuição no número de vendedores já é facilmente notado. Os consumidores têm as mercadorias todas expostas e ao alcance das mãos para escolher o que mais lhe agrada. No caso das empregadas domésticas para as diaristas, por exemplo, as mudanças também ocorreram pelas mudanças nas famílias, que passaram a ficar mais tempo fora de casa, sem a necessidade de uma pessoa para acompanhar o andamento e a organização diária da casa.

    Para Fausi dos Santos, filósofo e professor, desde o início do século 20, novas linhas de pensamento humanista surgiram e recolocaram a questão da importância e do papel do indivíduo no meio social. Segundo ele, o efeito disso no mundo do trabalho foi o surgimento de sindicatos e associações de trabalhadores que de forma política buscaram humanizar as relações de produção.

    “Os trabalhos insalubres ou servis, foram denunciados e vistos como uma afronta à dignidade humana e aos direitos do indivíduo. Essa maior humanização nas relações de trabalho é o que levará ofícios antes comuns a um novo patamar de existência. Observe que, com a preocupação de mostrar que todos somos iguais, trocamos o tratamento dos que fazem trabalho doméstico dizendo que são secretárias do lar”, aponta.

    Fausi acrescenta que a maior qualificação profissional também contribui para essa mudança nas relações de trabalho, porém, destaca que a grande mola propulsora é ideológica. “O maior entendimento do homem e de sua subjetividade não nos permite tolerar a “coisificação” da pessoa e sua redução ao nada. Mas é óbvio que as relações de poder ainda oprimem o sujeito em várias esferas sociais. Por outro lado, as constituições de cada país e a própria Declaração Universal dos Direitos do homem, são os resultados efetivos da tendência à humanização das relações”, acredita.

    De doméstica a chef de cozinha

    Empregada doméstica por mais de 15 anos, Maria Isabel Modesto da Silva tinha uma peculiaridade que despertava a atenção pode onde ela passada: o dom para cozinhar. “Eu recebia elogios e era solicitada para o preparo de pratos. Gostava de cozinhar, de estudar e não gostava de ser empregada doméstica”.

    Sempre atenta às novidades culinárias, Maria Isabel conta que deixava a TV ligada enquanto trabalhava para aprender direitinho a fazer os pratos mostrados. Depois, preparava algumas surpresa para o almoço dos patrões. “Apesar de gostar de cozinhar, eu não estava satisfeita com o trabalho como doméstica. Além do baixo salário, muitas dessas profissionais são exploradas...”

    Por outro lado, Maria Isabel lembra que encontrou boas patroas pelo caminho, inclusive uma delas a incentivou bastante a procurar cursos para sua profissionalização. Assim vieram os cursos de culinária dentro e fora da cidade e, quando o trabalho não permitia o avanço dos estudos, ela mudava de emprego: “Não queria deixar que nada atrapalhasse meu avanço e meus estudos”.

    Como chef de cozinha, a entrevistada já cruzou o Oceano Atlântico em um cruzeiro. Também já coordenou eventos de gastronomia em cidades como Bauru e São Paulo.

    A cozinheira que de início se especializou em comida árabe e adentrou no francês, italiano, entre outras culinárias, agora abriu uma marmitaria de comida regional em Bauru. Ela garante que o segredo para melhorar de vida está em ter força de vontade e descobrir o que se gosta: “Tenho amor em cuidar do estômago dos clientes”.

    ‘Gosto mesmo é de criar raízes’

    A garantia do trabalho fixo e da carteira assinada. Estas são vantagens que Margarete Fonseca da Silva acredita ter no trabalho como empregada doméstica. Há cerca de 20 anos ela trabalha na casa do casal Orlando e Maria Aparecida Vasconcelos. E antes disso, trabalhou por 10 anos em outra residência: “Gosto do trabalho que proporciona criar raízes”, conta.

    Com a rotina de trabalho de segunda a sexta-feira, Margarete diz que ainda sobra tempo para cuidar da sua casa e do neto. Como a organização da rotina de trabalho fica por sua conta, ela garante que não tem hora fixa para sair e que sempre consegue finalizar seu trabalho cedo: “Com o emprego fixo, eu consigo ir para casa mais cedo. Diferente da diarista que, dependendo da casa, passa o dia todo faxinando”, aponta.

    Já o casal de empregadores afirma que Margarete faz parte da família. “Vimos os filhos dela crescerem. Eles vinham sempre brincar em nossa casa”, lembra Orlando.

    Já Maria Aparecida diz não gostar de mudar de funcionária. E, segundo ela, o segredo para “fidelizar” a empregada vai além do respeito: “É preciso ter amor pelas pessoas. Quando comemoramos bodas de ouro, a foto de Margarete estava entre as imagens da família”, finaliza.

    ‘Fica um vazio quando ela não está em casa’, relata adolescente

    Há 14 anos Creusa Aparecida Dias se dedica ao trabalho de empregada doméstica na casa da mesma família. E, embora acredite ganhar menos sendo mensalista do que diarista, ela diz ver outras razões no trabalho, além do salário: “Vi as meninas da casa nascerem e crescerem. Ajudo a criá-las, pois perderam a mãe, e são como minha segunda família”.

    Creusa lava, passa, cozinha e ainda dá orienta as irmãs Flávia e Aline Gomes Gasparini, de 14 e 10 anos, respectivamente. “Quando eu não estou trabalhando, às vezes elas me ligam para pedir conselhos ou tirar dúvidas. Fico muito satisfeita em poder ajudar. Procurar outro emprego, por exemplo, é algo que nunca me passou pela cabeça”, afirma.

    Tal sentimento de carinho existente na relação e que ultrapassa os limites do emprego também são sentido pelas meninas. “Sentimos que ela faz parte da nossa família. É como uma segunda mãe para a gente. É tão importante tê-la em casa que aos fins de semana ou mesmo quando ela vai embora fica um vazio na casa”, afirma Flávia.

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