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3 de Maio de 2024

Política e diálogo no contexto da reeleição de Dilma Rousseff

Publicado por Carolina Salles
há 9 anos

Poltica e dilogo no contexto da reeleio de Dilma Rousseff

Por Leonardo Boff*

A reeleição de Dilma Rousseff propicia reflexões sobre as várias formas de se fazer política partidária. Fazer política é buscar ou exercer concretamente o poder. Que fique claro o que Max Weber escreveu em seu famoso texto A política como vocação: "Quem faz política busca o poder. Poder, ou como meio a serviço de outros fins, ou poder por causa dele mesmo, para desfrutar do prestígio que ele confere".

Esse último modo de poder político foi exercido, por quase todo o tempo de nossa história, pelas elites a fim de se beneficiarem dele, esquecendo que o sujeito de todo o poder é o povo. Trata-se do famoso patrimonialismo tão bem denunciado por Raimundo Faoro em seu clássico Os donos do poder.

Vejo cinco formas de exercício de poder.

Primeiro, a política do punho fechado. Trata-se do poder exercido de cima para baixo e de forma autoritária. Há um só projeto político, aquele do detentor do poder, que pode ser um ditador ou uma classe dominante. Eles simplesmente impõem o projeto e esmagam os alternativos. Foi o que mais vigorou na história brasileira, especialmente sob a ditadura militar.

Segundo, a política do tapinha nas costas. É uma forma disfarçada de poder autoritário. Mas diferencia-se do anterior, porque este se abre aos que estão fora do poder mas para atrelá-los ao projeto dominante. Recebem algumas vantagens, desde que não constituam outro projeto alternativo. É a conhecida política paternalista e assistencialista, que desfibrou a resistência da classe operária e corrompeu tantos artistas e intelectuais. Funcionou entre nós especialmente a partir de Vargas em diante.

Terceiro, a política das mãos estendidas. O poder é distribuido entre vários portadores que fazem alianças entre si sob a hegemonia do mais forte. Há alianças entre o partido vencedor com os demais partidos aliados para garantir a governabilidade. É o presidencialismo de coalizão parlamentar. Esse tipo cria favorecimentos, disputas de postos importantes no Estado e mesmo a corrupção. Foi o que ocorreu nos últimos anos.

Quarto, a política das mãos entrelaçadas. Parte-se do fato básico de que o poder está difuso nos movimentos e instituições da sociedade civil e não apenas na sociedade política, nos partidos e no Estado. Esse poder social e político pode convergir para algo benéfico para todos. Trata-se da grande discussão atual, que prevê a participação dos movimentos sociais e dos conselhos para junto com o Parlamento e o Executivo definirem políticas públicas. Busca-se uma democracia participativa que enriquece a representativa. Negar esta forma é não querer democratizar a democracia e permanecer na atual, que é de baixa intensidade.

Sonho que se sonha só é pura ilusão. Sonho que se sonha juntos é sinal de solução

Especificando: a política das mãos entrelaçadas acontece quando o chefe de Estado se propõe a uma ampla dialogação com todos os segmentos a fim de repactuar os atores sociais ao redor de um projeto comum mínimo. O pressuposto é: aquém e além das diferenciações e dos interesses conflitantes, existe na sociedade a ideia de que país queremos, a solidariedade mínima, a busca do bem comum, a observância de regras consentidas e o respeito a valores de sociabilidade sem os quais viraríamos uma matilha de lobos. As mãos estendidas podem se entrelaçar coletivamente. Mas para isso precisa-se do exercício do diálogo, que implica ouvir a todos e buscar convergências na linha do ganha-ganha e não do ganha-perde. É a ética na política e da boa política verdadeiramente democrática.

Por fim, temos a ver com política como sedução no melhor sentido da palavra, subjacente à proposta da presidenta Dima. Ela propõe um diálogo aberto com todos os atores políticos, também da área popular. Urge seduzir aqueles 48% que não votaram nela para que secundem um projeto de Brasil que beneficie a todos a partir da inclusão dos mais penalizados, da criação de desenvolvimento ecológica e socialmente sustentado que gere empregos, propicie melhores salários, favoreça a redistribuição de renda, crie um transporte decente e garanta mais segurança para os cidadãos, além do cuidado para com a natureza e a potencialização de um horizonte de esperança para o povo poder se reencantar com a política.

Alguém precisa ser inimigo de si mesmo para estar contra tais propósitos. A arte dessa dialogação é reencantar a política das coisas e seduzir as pessoas para esse sonho bem-aventurado.

Para isso é obrigatório olhar para a frente. Quem ganhou a eleição deve mostrar magnanimidade e quem a perdeu, humildade e disposição de colaborar em vista do bem comum.

É idealismo? Sim, mas no seu sentido profundo. Uma sociedade não pode viver só de estruturas, burocracia e disputas ideológicas em torno do poder. Tem que suscitar a cooperação de todos e alimentar sonhos de melhoria permanente que inclua e beneficie, o mais poossível, a todos para superar a nossa espantosa desigualdade social.

Razão têm as comunidades eclesiais de base quando cantam: "Sonho que se sonha só é pura ilusão. Sonho que se sonha juntos é sinal de solução. Então, vamos sonhar juntos, sonhar em mutirão".

Esta é a convocação suprapartidária que a presidenta Dilma está fazendo ao Parlamento, aos movimentos populares e a toda a nação. Só assim se esvazia o discurso das divisões, dos preconceitos contra certas regiões e se sanam as chagas produzidas no ardor da campanha eleitoral com todos os seus excessos de parte a parte.

*teólogo e filósofo, é também escritor.

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44 Comentários

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É um apelo pavoroso a rendição de 62% da população que vai contra-balancear os atos ingerentes deste governo?
Nunca tive tanta certeza de que DEVO me impor pelo bem do Brasil como um todo.
E, antes de tudo, depois da traição evidente de nossa eleita até aos seus eleitores, falando em debates promessas insustentáveis, fazendo o jogo do "nós contra eles", falando de juros, preços, e tudo mais sem poder realizar o que tanto proclamou em sua campanha, depois de destruir Marina, por estar ao lado de banqueiros, vai quebrar um de seus grandes discursos com a possibilidade de convocar um... BANQUEIRO para ajudar no seu desgoverno?
É de olhar o nome do comentarista e já ter dele algo raso, que não vai ao encontro da realidade. continuar lendo

Perfeito ..... continuar lendo

Concordo. Porque a prodigiosa Presidente não convence seus pares e principalmente o Ex Lula a dividir sua riqueza com os pobres, dividir o dos outros é bom, quero ver dividir o que é seu... continuar lendo

Esse frei é pt. Para ele os pts são deuses e habitam um olimpo onde do alto de sua magnitude e magnanimidade dignam-se a olhar para a plebe... continuar lendo

Já tive o desprazer de em algum momento de minha vida apreciar os escritos e pensamentos do Sr Boff. Contudo, hoje mais maduro, ficou claro para mim que ao longo de sua vida só procurou desinformar para deformar, haja vista sua contundência em defender um governo despido de qualquer virtude, alinhado com ditaduras genocidas e rapace de nossos recursos em prol de um comunismo caquético pretendido pelo Foro De São Paulo. E ele é extremamente perigoso à nossa democracia, pois para muitos que se pretendem intelectuais, se reveste de misticismo, escamoteia o sentido da religiosidade cristã para propagar como verdade a máxima de que "os meios justificam os fins". Por mais conhecimentos que ele tenha e saiba usar da palavra oral e escrita como poucos, para mim não passa de mais um lixo comunista. Antigamente, cheguei a questionar a atitude do Santo Papa João Paulo II ao impor-lhe o silêncio, mas hoje vejo que aquilo foi um ato profético do nosso querido Papa Peregrino. continuar lendo

Aprecio demais o teólogo Leonardo Boff, e as descrições sobre o exercício do poder são fantásticas. continuar lendo

Que delícia acessar o JusBrasil e encontrar sempre artigos de qualidade. E o melhor aprendendo a refletir sobre política. continuar lendo

Bom, porem, cuidado com esse hipopcrita comunistazinho ...o tal de boffee... continuar lendo

Ter o senso de bem comum é uma dádiva continuar lendo

dialogo??? pt? comunistas????? kkkkkkkkhipocrisia barata... continuar lendo

Sensu de bem comum, uma presidente que assaltava bancos, que sequestrou pessoas!!! Filho do Lula maior acionista da Friboi; Lula o mair dono de terras do cetro-oeste!!! Coligados ao PMDB do Sarney dono de 2/3 do Maranhão! Uma bando de vagabundo que não sabe o que é trabalho e que agora dão bolsa família para os da mesma espécie, enquanto os empresários e os trabalhadores, quais geram renda ao país são massacrados com alta carga tributária e uma aposentadoria de miséria. Te pergunto uma coisa: Onde está a justiça quando alguém que trabalhou a vida toda recebe 1 salário mínimo de aposentadoria, enquanto aquele que ficou só na aba de alguém recebe o mesmo salário mínimo de auxilio idoso? Qual o benefício de pagar a previdência? continuar lendo