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17 de Junho de 2024
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    Professor Alysson Mascaro inaugura ciclo de palestras promovido pela Escola Judicial sobre temas polêmicos da atualidade

    Por Ademar Lopes Junior

    Uma discussão sobre ética num momento de perecimento dos padrões éticos. Esse foi o principal fio condutor da palestra conduzida pelo jurista e filósofo do direito Alysson Leandro Barbate Mascaro, doutor e livre-docente em Filosofia e Teoria Geral do Direito pela Universidade de São Paulo e atualmente professor de Filosofia do Direito na graduação da Universidade Presbiteriana Mackenzie. A palestra intitulada "Ética e Direitos Sociais", voltada a magistrados, servidores, advogados e estudantes, inaugurou na manhã desta sexta-feira, 22/2, no Plenário do TRT-15, o Ciclo de Palestras sobre Temas Polêmicos da Atualidade, promovido pela Escola Judicial da Corte, sob coordenação do desembargador Eduardo Benedito de Oliveira Zanella.

    Segundo defendeu Mascaro, apesar das diversas impressões subjetivas sobre a ética, duas teorias sobre a construção da história se levantam sempre que se pretende discutir o tema. A primeira delas, nascida entre os antigos gregos, é a de que a história se move de modo circular, e explicaria que, de "modo pendular", a humanidade viveria num constante processo de conquistas e retrocessos de direitos e dos padrões éticos. De acordo com o palestrante, apesar de errada a teoria, o raciocínio é "belíssimo em sua concepção" e ainda seduz alguns pensadores nos tempos atuais. A segunda teoria é de que a história seria linear, explicando os avanços da humanidade como conquistas sem retrocesso. Esse pensamento, segundo Mascaro, estaria na raiz da própria concepção da Justiça do Trabalho no Brasil, cuja existência justificaria, por exemplo, a garantia de não retrocesso dos ganhos e direitos sociais dos trabalhadores, após séculos de escravidão. De inspiração positivista, essa visão se estampa até mesmo na bandeira nacional, em seu lema "Ordem e Progresso", mas que deixou esquecido na história um terceiro lema, originalmente defendido pelos positivistas; "Ordem, Amor e Progresso", lamentou o palestrante. Ambas as teorias, porém, não se sustentam sob uma análise filosófica mais apurada. Segundo o professor Mascaro, a primeira peca por criar uma sensação de conformismo e manter a humanidade de braços cruzados, apenas aguardando a mudança do pêndulo para o lado em que se encontram os seus interesses. A segunda, também sedutora, dá a impressão de que a história se constroi sobre degraus de conquistas que se sobrepõem, mas que na verdade não explicaria relevantes fatos históricos como o genocídio nazista ou o período de escravidão no Brasil.

    Contra as duas teorias, o professor Mascaro defendeu uma reflexão mais ampla, de que a história é aberta, e não poupou críticas aos tempos atuais em que a humanidade se debate contra uma acirrada crise do capital. O palestrante ainda passeou sobre outros conceitos como Justiça, e ressaltou as diferenças sobre esse tema em diferentes culturas como fonte de justificativa da crise ética ou de solução para ela. Para os africanos, por exemplo, a Justiça, simbolizada pelo martelo de dois gumes de Xangô, tanto aniquila o que promove a injustiça quanto aquele que clama por justiça sem ter direito a ela, e por isso o assunto é "sagrado" entre eles, que evitam invocar a justiça como fonte de solução de conflitos. Já para os ocidentais, o símbolo de justiça está na imagem que segura numa mão a balança e noutra a espada, o que pode ser entendido como um equilíbrio de forças, mas que para muitos, representa um direito pessoal de luta, capaz de ser pleiteado nos tribunais.

    Mais que simples curiosidades, o tema desperta outras questões, como a valorização de soluções mais baseadas na realidade de cada povo e lugar e menos em princípios e ordenamentos estranhos aos nossos, e menos ainda naqueles sustentados pelo poder do capital, capazes de pôr em risco nossas garantias constitucionais e até mesmo as da CLT. Segundo o professor Mascaro, nos tempos atuais "os princípios da Justiça são bons se forem os da Common Law".

    Dentre os principais questionamentos sobre ética, apresentados pelo professor Alysson Mascaro, foram abordados o pensamento de Aristóteles, com sua Ética a Nicômaco, e a defesa de que "a virtude está no meio-termo" e de que a Justiça é a correção das desigualdades (régua de Lesbos), promovendo a distribuição de direitos de acordo com a realidade dos envolvidos (tirar de quem tem mais e dar a quem tem menos). Essa visão se aproximaria, segundo Mascaro, do conceito de Justiça do Trabalho, e por isso seria tão odiada nos tempos atuais.

    Contrário a essa teoria, na Idade Média se constrói o ideal de homem justo como aquele que cumpre a lei (a régua de Deus). Curiosamente, esse conceito ainda hoje é o que mais se impõe entre os operadores do direito, e justifica quase tudo pela "letra da lei", sem se importar com a ética ou justiça: "Se sigo a lei, faço a justiça". Esse conceito, estudado e validado pelo filósofo Imamnuel Kant no século XVIII, defende a justiça com o uso da "régua inflexível", o que está de acordo com a lógica do mundo capitalista que se firmava à epoca do filósofo alemão e que ainda hoje, curiosamente, "odeia a Justiça do Trabalho", afirmou o palestrante. Para comprovar esse raciocínio, o professor lembrou ao público que jamais ouviu uma voz se levantar defendendo o fim de outras justiças, como a penal ou a civil.

    Em sua conclusão, Mascaro ressaltou que "infelizmente, essa dor pelas perdas dos direitos sociais hoje não encontra eco na defesa dos trabalhadores", e no Brasil, especialmente, essa situação tende a piorar devido à "indigência intelectiva que defende a justiça mas faz a injustiça". O palestrante defendeu como única saída para esse perecimento dos direitos sociais o despertamento da classe trabalhadora, mas ressaltou o papel importante dos tribunais trabalhistas nessa luta, com sua vocação pela defesa dos direitos dos hipossuficientes, e conclamou a todos os magistrados a escrever nessa página em branco da história, que não é linear nem circular, mas aberta.

    Escola, Arte e Cultura

    Na Mesa dos trabalhos da abertura do evento, a diretora da Escola Judicial, desembargadora Maria Inês Corrêa de Cerqueira César Targa, falou da importância da Escola Judicial do TRT-15, da contribuição dos diretores e servidores que passaram por lá e da nova perspectiva que assume na atual Administração. Mais que um "locus" de aprendizado, a escola deverá adotar uma nova forma de trabalho, incluindo em seus programas um aprendizado mais humanizado. Segundo a magistrada, "só se aprende o que a emoção abraça", e com esse lema, a nova direção da Ejud lança o Projeto Escola, Arte e Cultura, apostando na contribuição da arte para um aprendizado mais eficaz, promovendo especialmente os atores desse processo. Nesse sentido, para abrir os trabalhos do dia, a desembargadora Maria Inês apresentou um grupo musical formado por uma magistrada e quatro servidores, responsáveis pela execução das músicas "A novidade" (Gilberto Gil), "Disparada" (Geraldo Vandré) e "Comida" (Arnaldo Antunes), todas, segundo a magistrada, guardando alguma relação com o tema da palestra do dia.

    Juíza Rita de Cássia Scagliusi do Carmo, Joyce Evelin Maia Braga e Claudio Ventura Mendes (vocais), Andreli Alexandre Bruder (violão) e Fábio Padoan Oliveira (baixo)

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