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20 de Junho de 2024
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    Quatro advogados condenados por fraudes em alvarás judiciais

    Publicado por Espaço Vital
    há 5 anos

    Sete anos e três meses após o início de um caso judicial que não faz a melhor história da Justiça e da Advocacia gaúchas – e que se transformou numa longeva tartaruga processual – a 4ª Câmara Criminal do TJRS confirmou na quinta-feira (5) a condenação de quatro pessoas envolvidas em fraudes de alvarás judiciais, no Foro de Caxias do Sul (RS). Quatro das penas foram mitigadas na sua extensão e uma mantida. A prescrição da pretensão punitiva favoreceu um dos réus.

    Parte do dinheiro desviado (total de R$ 230 mil, em valor nominal; atualizado e com juros legais desde a data do primeiro ilícito, hoje equivale a R$ 1.246.163,80 – cálculo extraoficial) deveria ser destinada ao Fundo Estadual de Defesa do Consumidor (FECON/RS). Os atos criminosos sucessivos foram praticados entre 28 de dezembro de 2010 e 18 de julho de 2012. A ação penal tramita desde 3 de setembro de 2012.

    Não há trânsito em julgado. Os réus ainda podem interpor embargos de declaração à própria 4ª Câmara Criminal do TJRS e recorrer aos tribunais superiores. Por efeitos da decisão de 6 x 5 do STF as prisões só podem ocorrer depois de esgotados todos os recursos.

    Para recordar o caso

    O Ministério Público denunciou o ex-servidor público Gilmar Antônio Camargo de Oliveira e os advogados gaúchos Rose Nunes da Silva Susin, Lairton José da Luz Venson, Maristela Brancher Venson e Frederic Cesa Dias (este, na época dos fatos, estudante de Direito e estagiário), que teve declarada a extinção de sua punibilidade.

    Gilmar Antônio era auxiliar de juiz do Juizado Especial Cível de Caxias do Sul. No primeiro fato criminoso, segundo a denúncia, o servidor criou um alvará falso, acrescentando o nome da advogada Rose Susin como a procuradora autorizada a sacar R$ 20.585,38. Este era o valor que estava depositado em uma conta judicial vinculada a uma ação consumerista.

    Foi o autor dessa ação - que deveria ser o beneficiado pela decisão - quem deu origem a toda investigação. Certo dia, o credor foi ao JEC para se informar sobre o dinheiro a receber e quem o atendeu foi o servidor Gilmar de Oliveira. Este entregou pessoalmente R$ 1 mil ao autor do processo e o fez acreditar que era apenas esse o valor a que tinha direito.

    Na divisão de tarefas e funções do cartório, Gilmar não era o encarregado da expedição de alvarás – mesmo assim ele repetiu o crime outras 13 vezes, favorecido pela falta de fiscalização. Na maioria das vezes, Gilmar atuou em conjunto com a mesma advogada Rose Susin - que fez a maioria dos saques na agência bancária que fica dentro do fórum caxiense. A divisão dos valores era feita ainda dentro do prédio, no mesmo dia segundo o MP.

    Algumas vezes o procedimento foi repetido com a co-participação dos advogados Maristela Brancher Venson e Lairton José da Luz Venson (entre si casados).. O então estudante de Direito Frederic Cesa Dias também participou de uma dessas operações de saque e transferência de dinheiro.

    Na investigação foi constatado que os alvarás falsos eram feitos no computador que ficava na mesa de Gilmar. Depois das falsificações – segundo o MP-RS – o servidor do Judiciário também retirava os autos dos processos das dependências do JEC e lhes dava sumiço. Nunca mais os volumes processuais foram encontrados.

    Os dados de alguns processos, inclusive já baixados e com indicação de “caixa-arquivo”, foram localizados na estação de trabalho do ex-servidor. Os alvarás fraudulentos, depois de confeccionados por Gilmar, recebiam as assinaturas de dois juízes (Sérgio Fusquine Gonçalves, titular do JEC à época; ou Maria Aline Vieira da Fonseca, substituta do mesmo juizado). Alegadamente diante do volume de movimentação processual no Juizado, os documentos liberatórios do dinheiro eram assinados desacompanhados dos processos respectivos, sem controle.

    A defesa de Gilmar

    A defesa de Gilmar Antonio Camargo de Oliveira, servidor do Judiciário à época dos fatos suscitou a prática de crime culposo, apontando diversas irregularidades e negligência que contribuíram diretamente para os fatos. Exonerado do Judiciário, em 2014 ele requereu sua inscrição como advogado na OAB-RS. O pedido foi indeferido. Em 2015 ele requereu sua inscrição na OAB de Santa Catarina, indicando como domicílio profissional a cidade de Camboriú.

    Gilmar sustentou ainda, “a prática de crime impossível, pois se os demais funcionários e magistrados que atuaram no Juizado Especial Cível seguissem todas as determinações da Corregedoria-Geral de Justiça e comandos normativos de segurança e conferência dos documentos, jamais teria sido possível confeccionar alvarás e tampouco sacar os valores”.

    Quanto ao mérito, Gilmar admitiu a confecção dos alvarás, postulando o reconhecimento da atenuante da confissão. Ainda, sobre a supressão de documentos, negou tenha retirado processos e documentos da esfera judicial, apontando a falta de provas de tais imputações. Postulou pela averiguação da conduta culposa dos demais servidores e magistrados, ante a falta de controle destes.

    As demais defesas

    Os advogados réus Lairton José da Luz Venson e Maristela Brancher Venson alegaram ausência de dolo, e não terem ciência dos ilícitos praticados por Gilmar. Afirmaram não ter tido participação dolosa, agindo de boa-fé, na confiança depositada no então servidor público, de longa data lotado no Poder Judiciário local – e a quem teriam apenas prestado favores.

    A advogada Rose Nunes da Silva Susin argumentou a violação do processo legal por ausência de oitiva de parte das testemunhas arroladas. No mérito, apontou o princípio da confiança, a afastar o seu dolo, e ausência de demonstração do concurso de agentes e ausência de relevância causal na suposta participação nos fatos.

    A defesa do então estagiário Frederic Cesa Dias negou a participação nos crimes, visto que não praticou qualquer ato processual e sequer foi seu nome mencionado em algum dos documentos referidos nos autos. Também alegou colaboração em estrita boa-fé.

    A sentença

    O julgado monocrático – proferido em 27 de fevereiro de 2018 pela juíza Gabriela Irigon Pereira, da 2ª Vara Criminal de Caxias do Sul - afastou todas as preliminares.

    Na sentença, a magistrada concluiu que todos os corréus estavam cientes e voluntariamente participaram do esquema criminoso arquitetado e idealizado por Gilmar de Oliveira. Para a juíza, os advogados e o estagiário “ingressaram na cadeia de execução dos crimes, com total ciência dos ilícitos perpetrados”.

    Conforme a magistrada sentenciante, o ex-servidor se aproveitou da relação de confiança conquistada ao longo de vários anos de serviços prestados, para – com o conhecimento do sistema e o elevado volume de alvarás judiciais expedidos - locupletar-se ilicitamente.

    As penas fixadas pela sentença(Proc. nº 010/21200099394, de Caxias do Sul)

    O ex-servidor Gilmar de Oliveira foi condenado por peculato. A pena foi fixada em 21 anos, 1 mês e 10 dias de reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente fechado, condicionando a progressão de regime à restituição da totalidade dos valores subtraídos. Deve devolver ao Poder Judiciário R$ 232.771,47 (valor nominal a ser atualizado) em solidariedade com os demais condenados. A juíza deixou de aplicar a pena de demissão, visto que ele já havia sido exonerado em procedimento anterior da Corregedoria-Geral da Justiça. Gilmar está inscrito, atualmente, como advogado na OAB de Santa Catarina. Ali consta como seu domicílio profissional a cidade de Balneário Camboriú.

    A advogada Rose Susin foi condenada a 7 anos e 6 meses de reclusão, inicialmente em regime semiaberto.

    A advogada Maristela Brancher Venson recebeu uma pena de 5 anos e 4 meses, também em regime semiaberto.

    O advogado Lairton José da Luz Venson recebeu condenação de 5 anos, 1 mês e 26 dias, em regime semiaberto.

    A progressão de regime dos advogados foi condicionada à restituição dos valores subtraídos.

    O estagiário (à época dos fatos) Frederic Cesa Dias e atualmente advogado foi condenado a 2 anos em regime aberto. A pena foi substituída por uma pena restritiva de direitos, consistente em prestação pecuniária no valor de R$ 10 mil, já servindo como início de ressarcimento ao erário, a ser depositado no FECON. Mais: a prestação de serviços à comunidade em uma hora por dia de condenação em local a ser definido pela Vara de Execuções Criminais. Também foi condenado ao ressarcimento dos valores constantes nos alvarás por ele sacados.

    Três condenações atenuadas e uma mantida

    As apelações criminais dos cinco réus chegaram à 4ª Câmara Criminal do TJRS em 6 de agosto de 2018. Houve uma nova demora (1 ano e 4 meses) até o julgamento ocorrido na semana passada.

    O acórdão foi publicado ontem (9) à tarde e está sendo divulgado nesta mesma edição do Espaço Vital. O julgado colegiado – de que foi relator o desembargador Aristides Pedroso de Albuquerque Neto - teve os seguintes dispositivos unânimes:

    1) Rejeitadas todas as preliminares;

    2) Não conheceram do recurso de Frederic Cesa Dias;por já ter sido antes declarada a extinção de sua punibilidade, face à prescrição da pretensão punitiva.

    3) Deram provimento ao apelo de Gilmar Antônio Camargo de Oliveira, para reduzir a pena para oito anos, sete meses e dez dias de reclusão e 66 dias-multa, à razão mínima.

    4) Deram parcial provimento ao apelo de Rose Nunes da Silva Susin, para reduzir a pena a quatro anos e três meses de reclusão, e 30 dias-multa.

    5) Deram parcial provimento ao apelo de Maristela Brancher Venson para reduzir a pena a três anos, quatro meses e 24 dias de reclusão, em regime aberto, e 24 dias-multa, à razão mínima. Substituição da pena restritiva de liberdade por duas restritivas de direitos;

    6) Parcial provimento ao apelo de Lairton José da Luz Venson para reduzir a pena a três anos, três meses e 20 dias de reclusão em regime aberto, e 23-dias multa à razão mínima. Substituição da pena restritiva de liberdade por duas restritivas de direito. (Proc. nº 70078658648).

    Outra tartaruga processual

    Também na comarca de Caxias do Sul tramita, desde 30 de outubro de 2013, uma ação de improbidade administrativa ajuizada pelo MP-RS contra os mesmos cinco réus da ação penal. Nesta segunda ação é buscado o ressarcimento civil dos prejuízos que a ação criminosa causou. Decorridos seis anos e um mês desde o ajuizamento, não há sentença e a fase de instrução ainda não terminou.

    A ação se arrasta na 2ª Vara Cível de Caxias do Sul, sem qualquer prioridade. Nada leva a crer que seja sentenciada nos próximos meses. Em 2019, claro, nem pensar. (Proc. nº 1.13.0033111-9).

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