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17 de Junho de 2024
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    Seminário em São Paulo discute conflitos fundiários e Resolução do CNDH

    há 6 anos

    São Paulo - A Defensoria Pública da União (DPU) em São Paulo foi sede, na quinta-feira (13), do seminário Democracia, conflitos fundiários e promoção dos Direitos Humanos. Em parceria com o Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico (IBDU), Defensoria Pública do Estado de São Paulo (DPE/SP), Fundação Ford e Instituto Gaspar Garcia, o evento contou com quatro mesas temáticas para discutir a questão dos conflitos fundiários à luz da Resolução 10/2018, do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), com uma série de medidas para prevenir conflitos e garantir direitos humanos nas disputas fundiárias.

    Direito à Cidade

    O evento se iniciou às 9h, com a primeira mesa sobre garantia dos Direitos Humanos em conflitos fundiários nas cidades. A defensora regional de direitos humanos da DPU em São Paulo, Fabiana Galera Severo, foi a primeira a falar sobre o tema, ressaltando a importância das ocupações na cidade de São Paulo. Ela apontou para a quantidade de prédios do governo desocupados na cidade, ferindo a ideia de que esses imóveis deveriam ser utilizados para sua função social: “O melhor, hoje, é que esses prédios sejam ocupados, exatamente para que não sejam utilizados para fins de violência ou criminalidade”, disse.

    A defensora pública federal aproveitou também para tecer críticas ao processo judicial, como no caso do edifício Wilton Paes de Almeida, que é acompanhado pela DPU em processo na Justiça Federal. “Fato é que o processo judicial das vítimas é muito longo para buscar as indenizações”. O defensor público estadual Rafael Negreiros, membro do Núcleo Especializado de Habitação e Urbanismo da DPE/SP, afirmou que uma mudança no poder Judiciário não é o que vai garantir a melhoria nos direitos dos ocupantes dos imóveis, mas sim a transformação nos costumes da população. A seu ver, o movimento de resistência é importante para auxiliar nisso.

    Casos emblemáticos

    Na segunda mesa, os palestrantes apresentaram importantes casos de conflito fundiário nos quais atuaram. Alexandre Mandi, da Rede Nacional de Advogados Populares, falou da ocupação Vila Soma, na cidade de Sumaré (SP), onde 10 mil moradores ocuparam espontaneamente terreno particular no decorrer dos anos. Concordando com a fala de Negreiros na mesa anterior, Mandi apresentou a luta de resistência e as mobilizações dos moradores para chamarem a atenção da população e do interesse público.

    “Tudo veio na ideia de mudar a questão do direito da propriedade privada, representado pelo Ministério Público e o proprietário, para a questão humana: para onde irão as crianças? Como elas irão estudar? O que irá acontecer com os moradores?”, afirmou. Mandi ainda salientou que o impasse no processo, que atualmente está parado no Supremo Tribunal Federal (STF), ocorre pois o poder público não deseja que a experiência legítima de ocupação seja exitosa, “para que as pessoas não saibam que se lutarem podem conseguir afrontar o poder vigente”.

    A defensora pública estadual Juliana Oliveira, da Defensoria Pública do Estado do Pará (DPE/PA), alertou os movimentos sociais presentes para a invasão de multinacionais e grandes empresas de mineração no Pará e para a desocupação em massa de populações tradicionais na região, especialmente para a construção da Ferrovia Paraense, projetada para escoar todo o minério do Sul e Sudeste do Brasil para o exterior: “atualmente, a não construção dessa ferrovia está travando 80 empreendimentos mineradores no Brasil, que necessitam de sua construção”.

    Como exemplo do que já ocorre e dos resultados desses conflitos fundiários, Oliveira apontou os grandes passivos de danos ocorridos na região de Altamira (PA) pela construção da Usina de Belo Monte, e dos conflitos fundiários ocorridos na cidade de Santarém (PA): “são centenas e centenas de ribeirinhos, pessoas acostumadas a viver nos rios, sendo alocados em apartamentos. Eles pretendem fazer uma cidade em Barcarena para a construção da Ferrovia Paraense”.

    Relatório Internacional de Despejos

    As pesquisadoras Karla Moroso, do Centro de Direitos Econômicos e Sociais (CDES), Maria Eugênia Trombini, do Terra de Direitos, e Charlene Egidío, liderança da Ocupação Izidora/MG, apresentaram durante a terceira mesa o Relatório Internacional de Despejos, documento relativo aos casos submetidos ao Tribunal Internacional de Despejos, evento ocorrido no Fórum Social Mundial em março deste ano na cidade de Salvador (BA), com uma série de recomendações relativas aos casos de ocupações no país para a garantia dos direitos humanos.

    Charlene Egídio, que também foi jurada no Tribunal, deu depoimento acerca do que é morar em uma ocupação. Ela disse que os juízes e membros do governo deveriam ir até os locais e ouvir a população antes de tomarem decisões sobre despejos. Para Charlene Egidío, o auxílio moradia, ou bolsa aluguel, não são resolução para o problema, pois além do valor baixo, não respondem sobre as situações específicas dos ocupantes. “Eles têm que perguntar os motivos pelos quais as pessoas vivem nas ocupações, para entenderem melhor a situação delas”.

    Maria Eugênia Trombini também abordou o mesmo tema, dizendo que os estudiosos e especialistas devem ouvir mais os moradores das comunidades: “A Resolução 10 tem garantias de direitos humanos, não é uma mediadora de conflitos. O objetivo nosso então deve ser levar as ocupações para os gabinetes dos juízes, para os governantes, para aproximar eles das pessoas da ponta, que sofrem os despejos”, observou.

    A mesa também apresentou o mapeamento de remoções realizado pelo Observatório de Remoções da Universidade Federal do ABC (UFABC). Talita Gonsales, pesquisadora do Observatório, afirma que o centro de pesquisa mapeou um total de 23 mil remoções na Grande São Paulo, e acompanha outras 155 mil famílias ameaçadas de remoção. “Buscamos onde elas ocorrem, os riscos e os motivos dessas remoções”, afirmando que as reintegrações de posse e as disputas por áreas de mananciais motivam atualmente a maioria das tentativas de despejo na região.

    Mediação de conflitos

    Fechando o evento, a última mesa tratou de tentativas de mediação e formas de garantias dos direitos humanos nas ocupações. O defensor público federal Pedro Rennó Marinho, coordenador do Grupo de Trabalho Moradia e Conflitos Fundiários da DPU, foi o primeiro a falar. Pedro Rennó Marinho denunciou a excessiva judicialização do tema, fato que não resolve o problema dos moradores. “Não são os processos judiciais, mas sim a atuação em rede, com a comunidade e os movimentos sociais, que pode resolver os conflitos”. Para ele, a moradia é uma demanda permanente, e deve ser entendida como tal. “O direito de moradia não deve ser entendido como direito de propriedade, pois mesmo aqueles que não têm a propriedade, moram em algum lugar, não existe uma espera para morar”.

    O defensor afirmou que a população ocupante tem direito de exigir que o Estado regularize sua situação. “O conflito é induzido pela falta de atuação do Estado na vida dessas pessoas”, completou ele. Por fim, propôs a criação de canais para incorporar na sociedade e nas ocupações as informações contidas na Resolução 10: com articulação de redes, formação de representantes e defensores de direitos por meio de cursos populares e também levar as ocupações para dentro dos órgãos públicos, em uma troca de informações.

    Benedito Barbosa, do Centro Gaspar Garcia e coordenador da Central de Movimentos Populares, denunciou e pediu apoio aos presentes para barrar as mudanças na Lei Antiterrorismo, voltadas à criminalização de movimentos sociais. Propôs também que sejam criadas missões pelos estados ou regiões do Brasil, a fim de que se constatem violações de direitos humanos em ocupações por todo o Brasil, fortalecendo o processo de luta e dividindo o conhecimento.

    No final do evento, os representantes das instituições presentes concordaram em assinar moção de apoio à Resolução 10/2018 do CNDH, reafirmando o compromisso das instituições com a defesa e a promoção de soluções garantidoras de direitos humanos em situação de conflitos fundiários coletivos, rurais e urbanos, além de repudiar as remoções e despejos forçados, em especial a tentativa de caracterizar como terroristas os movimentos sociais de moradia.

    DCC/MGM
    Assessoria de Comunicação Social
    Defensoria Pública da União

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    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/seminario-em-sao-paulo-discute-conflitos-fundiarios-e-resolucao-do-cndh/659976683

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