Supremo avança ao não permitir prisão civil do depositário infiel
Obteve grande repercussão a decisao do Supremo Tribunal Federal, de 3 de dezembro de 2008, à respeito do Recurso Extraordinário 466.343-SP, que discutiu acerca da impossibilidade da aplicação da prisão civil do depositário infiel face o disposto no artigo 7º, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, que estabelece o que segue:
Ninguém deve ser detido por dívidas. Este princípio não limita os mandados de autoridade judiciária competente expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar
Percebe-se que a tese da supralegalidade dos tratados internacionais que versam sobre direitos humanos concilia algumas ideias da corrente que prevê a hierarquia constitucional dos tratados de direitos humanos, pois rechaça a paridade em relação à lei ordinária, destacando nesse âmbito a superioridade do direito internacional, porém ao mesmo tempo, assinala a necessidade de respeitar-se a Constituição da República, não contrariando seus dispositivos. Depreende-se desse modo, que a norma internacional que versar sobre os direitos humanos posicionar-se-á hierarquicamente abaixo da Carta Magna, contudo apresenta status superior ao das leis ordinárias.
No julgamento do Recurso Extraordinário 466.343-SP, em que pese o voto do ministro Celso de Mello, ter sido no sentido de que os tratados de direitos humanos devem ter hierarquia materialmente constitucional, o voto-vista do Ministro Gilmar Mendes, seguido pelos demais ministros, conferiu status supralegal aos referidos tratados. Acerca do assunto, assevera Mazzuoli:
Assim, no julgamento (histórico) do dia 3 de dezembro de 2008 prevaleceu no Supremo Tribunal Federal o voto do ministro Gilmar Mendes (por cinco votos a quatro), ficando afastado (pelo menos por enquanto) o posicionamento do ministro Celso de Mello, que reconhecia valor constitucional a tais tratados. Como se percebe (e, sob esse aspecto, só temos o que comemorar), o STF não mais adota a equiparação dos tratados de direitos humanos às leis ordinárias. Porém, ainda que os tratados de direitos humanos tenham minimamente (voto do ministro Gilmar Mendes) nível supralegal no Brasil, a nova dúvida que deve assaltar o jurista (notadamente o internacionalista) diz respeito ao acerto desta tese. (1)
Para os que coadunam com a tese ora analisada, formou-se uma nova configuração da pirâmide jurídica em nosso ordenamento jurídico, nos seguintes termos:
Temos que admitir, por conseguinte, uma nova pirâmide jurídica no nosso País, segundo o STF: no patamar inferior está a lei, na posição intermediária estão os tratados de direitos humanos (aprovados sem o quorum qualificado do 3º do art. 5º da CF) e no topo está a Constituição. (2)
Outrossim, na mesma obra citada, Valério de Oliveira Mazzuoli e Luiz Flávio Gomes, elencaram a fundamentação utilizada pelo ministro Gilmar Mendes, a fim de justificar a supralegalidade dos tratados de direitos humanos, quais sejam: a impossibilidade de uma norma infraconstitucional derrogar o conteúdo de uma Convenção internacional, bem como a aplicação do princípio da proporcionalidade, nesse passo:
O ministro Gilmar Mendes, no mesmo julgamento, agregou outros dois fundamentos: considerando-se que a Convenção Americana só prevê a prisão civil por alimentos (artigo 7º, 7), é certo que nossa legislação ordinária relacionada com o depositário infiel conflita com o teor normativo desse texto humanitário internacional. O conflito de uma norma ordinária (que está em posição inferior) com a Convenção Americana resolve-se pela invalidade da primeira. É o que ficou espelhado no voto do ministro Gilmar Mendes, que ainda mencionou o princípio da proporcionalidade como ulterior fundamento para não permitir a prisão de depositário infiel (3)
Por conseguinte, foi extinta a possibilidade de prisão civil do depositário infiel no Brasil, posto que estabelecido o conflito entre uma norma constitucional e o disposto em um tratado internacional de direitos humanos, prevaleceu o segundo, em virtude de o fato beneficiar de maneira mais ampla o ser humano, trata-se da aplicação do princípio da primazia da norma mais benéfica ao ser humano, denominado de princípio pro homine . Coadunando com este raciocínio, asseveram Valério de Oliveira Mazzuoli e Luiz Flávio Gomes:
De qualquer modo, em matéria de direitos humanos, quando os tratados internacionais conflitam com a Constituição brasileira (esse é o caso da prisão de depositário infiel) a solução não pode ser buscada no princípio da hierarquia. Não funciona (no conflito entre os tratados e a Constituição) a hierarquia e sim o princípio pro homine, que significa o seguinte: sempre prepondera a norma mais favorável ao ser humano. Não importa a hierarquia da norma, mas sim o seu conteúdo. (...) No caso da prisão civil a norma mais favorável é sem dúvida , o artigo 7º, 7, da Convenção Americana (que combina com o artigo 11 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos). (4)
Cumpre ainda, tratar a respeito da distinção no que tange a conseqüência jurídica em relação à norma não aplicada, em virtude da observância do princípio pro homine. Nesse ínterim, deve-se atentar para o fato de a norma interna ser const...
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