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2 de Junho de 2024
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    TERRAMÉRICA - Estrada submersa

    Um trecho do Corredor Viário Interoceânico Sul na Amazônia peruana será inundado por uma represa hidrelétrica.

    Puno, Peru, 18 de outubro (Terramérica).- Alguns operários trabalham contra o relógio no último trecho do Corredor Viário Interoceânico Sul, no sudeste do Peru, sem saber que cerca de cem quilômetros dessa estrada que faz ligação com o Brasil serão cobertos pela represa hidrelétrica de Inambari. Os moradores duvidam que possa haver uma rota alternativa a esta estrada pela qual lutaram durante anos. O maquinário pesado vai dar lugar a outro com toneladas de terra removida. Alguns jovens de capacete e macacão controlam o trânsito com letreiros de mão que dizem Pare, Siga.

    O projeto, que faz parte da Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana (IIRSA), avança a todo vapor para que seja cumprida a promessa governamental de concluí-lo em abril de 2011. O Corredor Viário é uma rede de várias estradas para unir três portos peruanos no Pacífico com a localidade de Iñapari, no departamento de Madre de Dios, fronteiriça com o Brasil. Os trechos quatro e três ligam uma até agora isolada região do sul, de Anzágaro, no departamento de Puno, até Iñapari.

    O projeto de Inambari, a cargo da Empresa de Geração Elétrica Amazonas Sul (Egasur), incluirá uma central e uma represa de 37.800 hectares no coração da selva, que inundará 43,5 quilômetros do trecho dois da estrada, em Cusco, 61,5 quilômetros do trecho quatro, em Puno, e um quilômetro do trecho três, em Madre de Dios. O Terramérica comprovou que grande parte da estrada já está terminada. Os moradores e técnicos duvidam que os cem quilômetros que ficariam sob a água possam ser recuperados, pois o traçado alternativo proposto incluiria uma área muito acidentada e também implicaria em cortar florestas primárias.

    A Egasur, de capital brasileiro, apresentou em janeiro de 2010 ao Ministério de Transporte e Comunicações um projeto para modificar os trechos dois e quatro da estrada, tal como aparece em uma carta da empresa à qual o Terramérica teve acesso. Segundo a proposta, o traçado alternativo, de 98 quilômetros, exigirá investimento de US$ 377 milhões da empresa, segundo uma versão preliminar do estudo de viabilidade de Inambari.

    Quem nos garante a nova estrada? Há montanhas e árvores onde dizem que vão construir. E se não puderem?, disse ao Terramérica a presidente da Frente de Organizações do Rio Inambari, Olga Cutipa, uma dos muitos moradores que lutaram pela construção dessa via por 40 anos. De forma simultânea, a Egasur apresentou ao Ministério de Minas e Energia, na primeira semana deste mês, uma versão final do estudo de viabilidade da hidrelétrica, que se mantém em sigilo, segundo soube o Terramérica. Dirigentes sociais de Puno, que chegaram a Lima no dia 12 para protestar contra Inambari, exigiram que as autoridades o tornem público.

    Os capitais das empresas que executam estas obras que se superpõem têm algo em comum: são brasileiros. A Egasur é formada pela construtora OAS e pela Eletrobrás Furnas, ambas do Brasil. Os trechos dois e três da estrada foram entregues ao Consórcio Concessionário Interoceânico, encabeçado pela construtora Norberto Odebrecht S.A., do Brasil, que realiza as principais obras de infraestrutura no Peru. O trecho quatro é executado pelo consórcio Intersur Concessões S.A., da Andrade Gutiérrez, Camargo Corrêa e Queiroz Galvão. Estas empresas, junto com a Odebrecht, formam um oligopólio da construção de grandes obras na América Latina e na África, normalmente financiadas pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

    Inambari é uma das cinco hidrelétricas que se pretende construir na Amazônia peruana como parte do acordo assinado entre Peru e Brasil em junho, para geração de seis mil megawatts. Organizações não governamentais garantem que o acordo beneficiará principalmente o Brasil, pois o Peru deverá entregar ao país vizinho uma porcentagem permanente de energia sem poder elevar sua participação para uso interno durante 30 anos.

    A engenheira Rosario Linares, da Sociedade Civil pela Construção da Estrada Transoceânica de Puno, disse ao Terramérica que o projeto da estrada alternativa é inviável por ficar uma área de deslizamentos. Também questionou que a proposta da Egasur apresentada em janeiro não incluiu um estudo ambiental e social. Não foi possível conseguir a posição do Ministério de Transportes para este artigo, apesar de duas semanas de gestões.

    A via alternativa contempla sete pontes em Cusco e outras seis em Puno. Uma delas, sobre o Rio Inambari, preocupa Rosario por sua dimensão: 640 metros de comprimento e 220 metros de altura. Em uma resposta por e-mail, uma fonte da Egasur disse ao Terramérica que o importante é que os novos traçados serão estradas de nível 1 e manterão os eixos conectados. A Intersur, que trabalha no trecho de Puno, respondeu que a Egasur não a informou sobre seus planos de inundação e que a empresa continuará trabalhando para terminar o asfalto.

    A situação revela falta de planejamento da infraestrutura em um ecossistema frágil como a Amazônia, disse o advogado Mariano Castro, da não governamental Sociedade Peruana de Direito Ambiental. Estes projetos têm impactos sociais e ambientais que devem ser considerados com rigor, porque não são executados em territórios vazios, ressaltou Mariano ao Terramérica.

    * A autora é correspondente da IPS.

    Crédito da imagem: Milagros Salazar/IPS

    Legenda: Trecho da estrada bioceânica em uma área que será inundada pela represa de Inambari, em Puno, no Peru

    LINKS

    Uma porção de selva peruana sob a água

    http://www.tierramerica.info/nota.php?lang=port&idnews=3583

    O que está em jogo no acordo energético Brasil-Peru?

    http://envolverde.com.br/materia.php?cod=76356&edt=

    Sede de energia multiplicará represas na Amazônia

    http://envolverde.com.br/materia.php?cod=75986&edt=

    Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana, em português, inglês e espanhol

    http://www.iirsa.org/index.asp?CodIdioma=ESP

    Grupo OAS, em português, inglês e espanhol

    http://www.oas.com.br/

    Eletrobras Furnas, em português

    http://www.furnas.com.br/default2.asp

    Ministério de Transportes e Comunicações, em espanhol

    http://www.mtc.gob.pe/portal/inicio.html

    Sociedade Peruana de Direito Ambiental, em espanhol

    http://www.spda.org.pe/portal/

    Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.

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    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/terramerica-estrada-submersa/2422622

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