Página 1253 da Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte I do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 29 de Julho de 2016

que possuía consigo um pino de tal substância. Logo que pegou o pino que continha droga surgiram guardas municipais, que os abordaram e apreenderam a droga que trazia consigo. Por fim, disse que não era proprietário das demais drogas apreendidas num relógio de luz existente nas proximidades de onde estava. Sua negativa não pode ser descartada. Isto porque as palavras dos guardas municipais, que inicialmente apoiaram a denúncia, não demonstraram a rigidez e confiança necessária para embasar um édito condenatório em relação ao tráfico de drogas. Os guardas ouvidos relataram que depois de terem recebido denúncias anônimas que não foram materializadas nos autos dirigiram-se até o local indicado. Anote-se que não existem os registros das supostas denúncias. Ao depois, disseram que assim que chegaram ao local visualizaram o motorista de um veículo pálio chamando o acusado e, em seguida, presenciaram o acusado entregando-lhe algo, razão pela qual resolveram aborda-lo. Durante a revista apreenderam no veículo um pino de cocaína. Realizada vistoria nas proximidades encontraram escondidos num poste de luz mais 4 pinos de cocaína. Anote-se que os guardas municipais não indicaram as características físicas apontadas pelo delator, limitando-se a mencionar que a delação apontava apenas o local em que o acusado estava. Explicaram que suspeitaram do acusado porque presenciaram o motorista do veículo dialogando com ele, além da admissão da testemunha de que estava no local para comprar drogas. Ora, então qualquer pessoa poderia ser suspeita, desde que estivesse ali no momento em que os guardas chegassem. Por fim, os guardas disseram que além da droga encontrada no veículo (1 pino de cocaína), encontraram mais alguns pinos contendo cocaína num poste de luz, próximo de onde estava o acusado. Todavia, o entorpecente não estava em poder dele e os agentes públicos não visualizaram nenhuma conduta do acusado que o relacionasse ao entorpecente ou que pudesse levar a crer que seria o proprietário do material. Ressalte-se que Alexandre, quando ouvido em Juízo, apoiou a versão do acusado em idêntica narrativa. Disse que trafegava com seu veículo quando avistou Adailton, pessoa que já conhecia. Notou que ele o chamou, momento em que parou o carro e iniciaram uma conversa. Em seguida combinaram de usar cocaína, quando então foram abordados pelos guardas municipais que localizaram em seu veículo apenas uma porção dessa substância, de propriedade do acusado. Finalizou afirmando que em nenhum momento informou aos guardas ou aos policiais que estaria naquele local para comprar drogas, em especial, do acusado. Logo, muito frágil a prova testemunhal e cai por terra o argumento no sentido de que o acusado estaria comercializando drogas naquele local, especificamente tendo como comprador Alexandre. Resta analisar, ainda, a outra circunstância que poderia ligar o acusado às drogas apreendidas, posto que incontroversa nos autos a apreensão dos entorpecentes num poste próximo donde ele se encontrava. É a suposta denúncia anônima que indicou o acusado como sendo o responsável pelas drogas. Pois bem, diante do contexto apresentado, cremos ser insuficiente uma única denúncia, ainda que amparada pelas palavras dos guardas. Muito embora este Juízo tenha entendimento de que as denúncias anônimas se traduzem em fortes elementos de convicção para o julgador, elas devem vir cercadas de outros elementos que lhe deem credibilidade, o que não aconteceu na espécie. Por simples e únicas denúncias, antes dos fatos, os guardas entenderam que o delatado seria o acusado e o apontou como proprietário das drogas. Não existe qualquer vestígio no sentido de que poderia ser ele o dono da droga escondida. Atrelado a isto, com o acusado não foi apreendido qualquer outro objeto capaz de ensejar a traficância, bem como, não foi surpreendido em situação que assim pudesse levar a crer conforme se depreende dos testemunhos expostos. Portanto, não há nenhuma prova ou elemento que indique que seria o acusado que estaria guardando a droga para comercialização ou entrega a terceiros. Na dúvida, deve se aceitar a versão do acusado. Uma condenação baseada unicamente em informação apócrifa seria contrária à ordem jurídica constitucional, que veda expressamente o anonimato. O acolhimento de delação anônima sem outra prova que a ampare permitiria a prática do denuncismo inescrupuloso, voltado a prejudicar desafetos, o que violaria o inciso IV do artigo da CF (“IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”). Sobre a questão já decidiu o Superior Tribunal de Justiça: A delação apócrifa não constitui elemento de prova sobre a autoria delitiva, ainda que indiciária; é mera notícia vinda de pessoa sem nenhum compromisso com a veracidade do conteúdo de suas informações, haja vista que a falta de identificação inviabiliza, inclusive, a sua responsabilização pela prática de denunciação caluniosa (artigo 339 do CP). (STJ - HC nº 64.096 - PR - Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima - J. 27.05.2008). A palavra dos guardas, embora seja aceita cotidianamente pelo Juízo como prova apta a sustentar uma condenação, deve vir cercada de elementos que a assegurem, o que não ocorreu na espécie. Tal entendimento, porém, não afasta a necessidade de exame do restante da prova, cotejando a versão dos guardas com o restante do contexto probatório. Assim, apenas quando coerente com o restante da prova dos autos é que poderão os depoimentos dos policiais embasar uma decisão condenatória. Daí a imprescindibilidade de serem, sempre que possível, identificadas e inquiridas testemunhas presenciais do fato ou da abordagem policial, de modo a permitir o esclarecimento das circunstâncias do caso concreto de forma mais segura e detalhada. O esclarecimento do fato, aliás, é a finalidade propriamente dita da atividade policial. Segundo dispõe o artigo do Código de Processo Penal, a autoridade policial deve, assim que tiver conhecimento da prática da infração, “colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias”. Não obstante isto, tem se observado em inúmeros processos, notadamente aqueles envolvendo imputações por tráfico de drogas e porte de armas, a absoluta ausência de testemunhas da abordagem policial ou do flagrante, mesmo quando os próprios policiais referem à presença de pessoas no local da abordagem ou do fato. Sendo possível o acompanhamento da diligência por uma pessoa fora dos quadros, como aconteceu na espécie, não se pode aceitar como absoluta as palavras dos guardas. Havia várias pessoas no local, inclusive, aquela que supostamente teria indicado o local onde estaria o entorpecente escondido, que seria de propriedade do acusado. Repise-se que havia possibilidade de que outros presenciassem a diligência uma vez que no local existiam outras pessoas. Porém, o momento do encontro da droga não foi presenciado. A restrição que se faz à prova testemunhal haurida tão somente de policiais tem sido quando, havendo testemunhas presenciais do acontecimento e estranhas aos quadros da polícia, não são requisitadas para a apreensão e nem ouvidas. Porém, se isso não for possível, o testemunho dos policiais se constitui prova como outra qualquer, pois, do contrário, muitos crimes praticados em locais isolados restariam sem punição. Estes elementos retiram o crédito da prova acusatória. Neste sentido: Policiais não estão impedidos de depor, mas o que torna manifestamente suspeitos seus depoimentos é a sistemática e constante exclusividade destes em casos relacionados com a posse e tráfico de entorpecentes quando facilmente, muitas vezes, seria possível a convocação de elementos estranhos ao funcionalismo policial militar (TJSP AC 42.208-3 Rel. Silva Leme RT 612/316). TÓXICO - Tráfico - Prova limitada ao depoimento dos policiais que realizaram a prisão - Depoimentos que deveriam estar alicerçados em outros elementos de convicção - Quadro probatório precário -Absolvição como melhor solução - Explicação de Alvará de soltura clausulado - Recurso provido. (Apelação Criminal n.º 235.970-3 - Itanhaém - 2ª Câmara Criminal de Férias Janeiro/98 - Relator: Renato Talli - 22.01.98 - V.U.). TÓXICO - Tráfico -Absolvição - Admissibilidade - Prova que resume-se no depoimento dos policiais - Ausência de demais elementos - Diligência revestida de arbitrariedade - Recurso provido. (Apelação Criminal n.º 217.995-3 - Limeira - 4ª Câmara Criminal - Relator: Sinésio de Souza - 07.10.97 - M.V.). Ressalte-se, todavia, que além das drogas encontradas próximas ao acusado, foi apreendido em poder do acusado um pino de cocaína. Resta apreciar este fato, admitido pelo próprio acusado, e que deve levar à desclassificada da imputação inicial, visto que não existem elementos seguros a indicar que aquela droga seria destinada ao comércio, haja vista a pouca credibilidade dos relatos dos guardas. Certo da autoria e da materialidade de crime contra a saúde pública, não ficou absoluta, patente o suficiente para ensejar a condenação, a prova a respeito do tráfico imputado. Não existe nos autos

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