Página 524 do Diário de Justiça do Estado do Paraná (DJPR) de 25 de Agosto de 2016

ORGIS, EVERSON LUIZ DA SILVA, JULIO CESAR ZEM CARDOZO, KARINA LOCKS PASSOS e ROSI MARY MARTELLI

080. DECLARAT. CUM. C/ REST. INDEB - 000XXXX-10.2004.8.16.0004 - JOEL NEPONUCENO e Outros X PARANAPREVIDÊNCIA e Outro- DA EXCLUSÃO DA PARANAPREVIDÊNCIA dO POLO PASSIVO DA EXECUÇÃO Há de se promover a regularização do polo passivo da demanda, ante a assunção do débito ora executado pelo Estado do Paraná, por força do art. 8º, § 1º, da Lei Estadual nº 17.435/2012, o que demanda a exclusão do PARANAPREVIDÊNCIA do polo passivo da execução. DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 8º, § 1º, da LEI ESTADUAL Nº 17.435/2012 O art. 8º, § 1º, da Lei Estadual nº 17.435/2012, publicada no dia 21 de dezembro de 2012, previu a responsabilidade pelos débitos pretéritos de titularidade da PARANAPREVIDÊNCIA ao ESTADO DO PARANÁ, como se infere da leitura do dispositivo, in verbis: Art. 8º Os Fundos Públicos de Natureza Previdenciária, constituídos por esta Lei, atenderão exclusivamente ao pagamento dos respectivos benefícios previdenciários. § 1º Cabe aos Poderes ou Órgãos do Estado que administram orçamento próprio a responsabilidade pelo pagamento das respectivas dívidas pretéritas ou diferenças que decorram de decisões administrativas ou judiciais. Por fundamentos diversos daqueles adotados no julgamento dos incidentes de inconstitucionalidade, registrados sob nº 990.709-3/02 e 1.039.460-2/01, impõe-se o reconhecimento da constitucionalidade da norma em questão. Da natureza jurídica da PARANAPREVIDÊNCIA A análise da constitucionalidade deste dispositivo passa, em um primeiro momento, pela definição da natureza jurídica da PARANAPREVIDÊNCIA. A PARANAPREVIDÊNCIA foi criada pela Lei Estadual nº 12.398/98 criou, a partir da transformação do IPE (entidade autárquica). De acordo com o disposto no art. 2º de referido Diploma Legislativo, a PARANAPREVIDÊNCIA tem personalidade jurídica de direito privado, natureza de serviço social autônomo paradministrativo (art. 2º). Da impropriedade legislativa De pronto, observa-se uma impropriedade do legislador ao denominála como serviço social autônomo. Uma pessoa jurídica criada e mantida com recursos públicos jamais poderia ser denominada como serviço social autônomo, nomenclatura utilizada para designar as entidades do chamado "Sistema S". Estas, vinculam-se à iniciativa privada, que promove o seu custeio e desempenha a sua administração sem qualquer interferência estatal . Dito isso, sendo a PARANAPREVIDÊNCIA vinculada ao Estado do Paraná e custeada com recursos públicos, certamente não pode ser ela enquadrada na noção clássica de serviço social autônomo. Fato é que outras legislações também autorizaram a criação de entidades designadas como "serviços sociais autônomos", que não se confundem com aquelas integrantes do "Sistema S". Objeto de severas críticas por parte da doutrina, em verdade, elas têm natureza de fundação. E - a par da designação ofertada pelo legislador - a natureza jurídica de autarquia (entidade de natureza fundacional, regida por normas de direito público), ou de fundação pública (entidade de natureza fundacional, regida por normas de direito privado), depende da atividade exercida por essas entidades dotadas de personalidade jurídica própria, como se infere dos ensinamentos de MARÇAL JUSTEN FILHO: A fundação pública diferencia-se das pessoas de direito público por desempenhar atividades de interesse coletivo que não exigem a atuação de uma entidade estatal que se valha de prerrogativas próprias de direito público. É a disciplina jurídica adotada para a entidade que determina a configuração de uma fundação de direito público ou de uma fundação de direito privado. Tal como acima já apontado, se a fundação for um instrumento para a realização de funções privativas e próprias de uma pessoa de direito público, submeter-se-á ao regime de direito público. Mas, muitas vezes, utilizase a expressão "fundação pública" para indicar as entidades subordinadas ao regime de direito público. Nesses casos, existiria uma questão semântica que, todavia, não seria capaz de afetar a natureza jurídica da entidade. A fundação de direito público não deixa de se submeter ao regime de direito público por ter sido denominada "fundação pública" . As atividades desenvolvidas pela PARANAPREVIDÊNCIA Conforme se infere da legislação que rege a PARANAPREVIDÊNCIA, cabe a este ente gerir o regime próprio de previdência dos servidores civil e militares do Estado do Paraná. Sua atividade, dessarte, é prestar serviço de previdência social. A previdência social é um direito social (art. , CF). Constitui-se em um direito fundamental de cunho prestacional (2ª geração). E, em vista também do disposto nos arts. 194 e 201 da Constituição da República, o regime de previdência social -seja dos trabalhadores em geral (regime geral de previdência) seja dos servidores públicos (regime próprio de previdência) - é um serviço que deve ser prestado pelo Estado. É, assim, um serviço público (art. 194 e art. 201 da CF), que subsiste paralelamente ao serviço de previdência complementar, que poderá ser prestado também pelos particulares. Esse serviço público não pode ser objeto de delegação, seja através de concessão ou permissão, por ausência de previsão constitucional. É, assim, uma atividade típica da administração pública. Dessa forma, cabe ao Estado prestá-lo diretamente, observada a possibilidade de desconcentração (criando órgão dentro da própria estrutura central) ou descentralização (criando pessoa jurídica com personalidade jurídica própria, distinta da estrutura central). Da natureza autárquica da PARANAPREVIDÊNCIA Como já consignado, no Estado do Paraná, a opção legislativa foi pela prestação do serviço através de ente descentralizado: a PARANAPREVIDÊNCIA. O legislador teria consignado que ela teria personalidade jurídica de direito privado. No entanto, em que pese os termos empregados pelo legislador, referida entidade tem, em verdade, natureza autárquica. A prestação de serviço de previdência social, segundo o regime próprio dos servidores públicos, é uma atividade típica da administração pública. Não se pode prestar por um ente dotado de personalidade jurídica de direito privado serviço público que demanda uma entidade que detenha as prerrogativas próprias de direito público. A necessidade de emprego dessas prerrogativas, aliás, se revelou de maneira bastante concreta no caso da PARANAPREVIDÊNCIA. Em virtude da adoção do rito da execução típico das obrigações havidas entre pessoas físicas e pessoas jurídicas de direito privado (art. 475-J, CPC), gerou-se um concreto risco de se prejudicar o equilíbrio atuarial do sistema. Diante desse fundamento, está vedado, por uma visão sistemática do ordenamento jurídico, atribuir a competência para prestar o serviço de previdência geral dos servidores públicos a pessoa jurídica de direito privado, ainda que integrante da Administração Pública indireta, no caso, um serviço social "impróprio", que, em verdade, tem natureza jurídica de autarquia. Esse argumento é ainda reforçado pelo fato de ser imperioso que nem mesmo o regime de previdência complementar dos servidores públicos pode ser prestado por ente com personalidade jurídica de direito privado. E isso decorre de vedação expressa, trazida pelo próprio texto da Constituição Federal, com a redação dada Emenda Constitucional 41/2003, que estabelece: Art. 40. (...). (...); § 15. O regime de previdência complementar de que trata o § 14 será instituído por lei de iniciativa do respectivo Poder Executivo, observado o disposto no art. 202 e seus parágrafos, no que couber, por intermédio de entidades fechadas de previdência complementar, de natureza pública, que oferecerão aos respectivos participantes planos de benefícios somente na modalidade de contribuição definida. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003) (sem destaques no original). Diante de tudo que se expos, a atividade desempenhada pela PARANAPREVIDÊNCIA só pode ser desempenhada por pessoa jurídica de direito público, com todas as suas prerrogativas típicas e, também, pelos instrumentos de controle que lhe são ínsitos. E, em se tratando de serviço autônomo, criado por lei (Lei Estadual nº 12.398/2012), com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios, para executar atividades típicas da Administração Pública, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizada (art. do Decreto-lei 200/1967), deve ser desconsiderada a denominação ofertada pelo legislador e, diante disso, qualificá-la verdadeiramente como autarquia e lhe conferir tratamento típico dispensado às pessoas jurídicas de direito público. Da natureza da relação havida entre os particulares e a PARANAPREVIDÊNCIA Em se tratando de a PARANAPREVIDÊNCIA propriamente de uma autarquia, certo é que as relações travadas com os titulares de benefícios previdenciários, bem como com os sujeitos passivos das contribuições previdenciárias que compõe os fundos por ela geridos, não são regidas pelas normas incidentes sobre as relações entre particulares. Trata-se de relação entre particular e administração pública, sendo reguladas, portanto, pelos princípios e regras próprios a elas. Fixada essa premissa, de pronto deve ser reconhecida a possibilidade de se alterar unilateralmente aspectos das relações havidas, desde que preservados os interesses legítimos dos particulares. Da ausência de violação dos interesses legítimos dos particulares. Como se infere do texto normativo, houve alteração do sujeito passivo das obrigações que eram de titularidade da PARANAPREVIDÊNCIA, passando-as ao Estado do Paraná. A questão que se impõe, a fim de se aferir a constitucionalidade dessa norma, é se essa alteração viola o princípio da segurança jurídica, em especial o princípio da confiança legítima e o instituto da coisa julgada. A análise do caso está, portanto, intimamente ligada ao exame do princípio da segurança jurídica. O princípio da segurança jurídica e da proteção da confiança possuem entre si estreita ligação. Em razão disso, alguns autores consideram a proteção à confiança legítima como um subprincípio ou como uma dimensão específica da segurança jurídica . Discorrendo sobre o tema, CANOTILHO observa que, em regra: ...considera-se que a segurança jurídica está conexionada com elementos objetivos da ordem jurídica - garantia de estabilidade jurídica, segurança de orientações e realização do direito - enquanto a protecção da confiança se prende mais com as componentes subjectivas da segurança, designadamente a calculabilidade e previsibilidade dos indivíduos em relação aos efeitos jurídicos dos atos dos poderes públicos . Segundo o constitucionalista português, tratando da segurança jurídica em sentido amplo, considerando, portanto, o subprincípio da proteção da confiança legítima, relaciona como as principais refrações desse princípio, as seguintes: (1) relativamente a actos normativos - proibição de normas retroactivas restritivas de direitos ou interesses juridicamente protegidos; (2) relativamente a actos jurisdicionais - inalterabilidade do caso julgado; (3) em relação a actos da administração - tendencial estabilidade dos casos decididos através de actos administrativos constitutivos de direitos . Do caráter retroativo da norma O art. 8º, § 1º, da Lei Estadual nº 17.435/2012 estatuiu verdadeira cessão de débito, alterando a titularidade dos débitos, ainda que reconhecidas em sentença, da PARANAPREVIDÊNCIA para o Estado do Paraná. Ao fazê-lo, o dispositivo em questão alterou situação jurídica havida no pretérito. Logo, se trata de uma norma de caráter retroativo, já que incidente sobre relações jurídicas ocorridas no passado, até mesmo aquelas cujos elementos foram reconhecidos por sentença judicial transitada em julgado. O princípio da segurança jurídica, em que pese o seu conteúdo que visa a dar estabilidade e, com isso, fiabilidade, nas relações intersubjetivas, não veda em termos absolutos a possibilidade de uma norma que tenha reflexos pretéritos. Como bem pontua CANOTILHO, uma absoluta proibição de retroactividade de normas jurídicas impediria as instâncias legiferantes de realizar novas exigências de justiça e de concretizar as ideias de ordenação social positivamente plasmadas na Constituição . Diante disso, como propõe o autor português, é necessário que se façam um estudo mais detalhado do tema, a partir do qual se pode verificar duas espécies, por assim dizer, de retroatividade: uma denominada de autêntica e outra de inautêntica. E essa definição é fundamental para que se possa compreender a questão que ora se enfrenta. Conforme leciona CANOTILHO, os casos de retroactividade autêntica em que uma norma pretende ter efeitos sobre o passado (eficácia ex tunc) devem distinguir-se dos casos em que uma lei, pretendendo vigorar para o futuro (eficácia ex nunc), acaba por <> em situações, direitos ou relações jurídicas desenvolvidos no passado mas ainda existentes. (...). Nestes casos, a nova regulação não pretende substituir ex tunc a disciplina normativa existente, mas ela acaba por atingir situações, posições jurídicas e garantias <> no passado e relativamente às quais os cidadãos têm a legítima expectativa de não serem perturbados pelos novos preceitos jurídicos. Quer dizer: há

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